08 Agosto 2016
Não há dúvida de que, desde que Francisco é bispo de Roma, o pensamento teológico sofreu, ao mesmo tempo, uma aceleração e uma paralisia. Tornou-se terreno de uma reflexão acurada e audaz, mas também sofreu uma paralisia, uma parada, um bloqueio, uma queimadura.
A opinião é do teólogo italiano Andrea Grillo, leigo casado, professor do Pontifício Ateneu S. Anselmo, de Roma, do Instituto Teológico Marchigiano, de Ancona, e do Instituto de Liturgia Pastoral da Abadia de Santa Giustina, de Pádua.
O artigo foi publicado no seu blog Come Se Non, 05-08-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Como escrevia, muitos anos atrás, o grande Karl Barth:
"Dentro todas as ciências, a teologia é a mais bela, a que toca mais profundamente a inteligência e o coração, a que mais se aproxima da realidade humana e oferece a visão mais clara da verdade (...) Mas, dentre todas as ciências, a teologia também é a mais difícil e a mais perigosa, aquela em que, quando nela nos envolvemos, mais facilmente podemos cair no desespero ou – e é quase ainda pior – no orgulho, a ciência que (...) pode se tornar a pior coisa que se possa imaginar: uma caricatura de si mesma."
Um dos efeitos mais surpreendentes do magistério do Papa Francisco – lido à luz dessa citação – continua quase escondido; muitas vezes é até ignorado ou até invertido: mas não há dúvida de que, desde que Francisco é bispo de Roma, o pensamento teológico sofreu, ao mesmo tempo, uma aceleração e uma paralisia. Tornou-se terreno de uma reflexão acurada e audaz, mas também sofreu uma paralisia, uma parada, um bloqueio, uma queimadura. Tentemos entender os motivos.
A aceleração de uma "profecia do alto"
Vimos isso com grande clareza durante o recente itinerário sinodal: o teólogo mais solto, mais rico e mais profundo foi Francisco. Comparados com ele, muitos dos discursos de contorno, mesmo quando bem fundamentados, eram como que hesitantes, hipercalibrados, prudentíssimos, quase se desculpando pelas pequenas aberturas que consideravam possíveis.
Essa é, em grande parte, uma condição que, na Igreja Católica, não se realizou senão raramente. Dois exemplos do último século são: a iniciativa de Pio X de "fazer o código", no início do século XX, e as posições "contra a guerra" de João Paulo II, nos anos 1990. Mas mesmo esses exemplos parecem ser muito mais limitados e menos centrais.
No nosso caso, em vez disso, Francisco assume uma iniciativa de "saída da autorreferencialidade" que exibe, imediatamente, uma "mens nova". Ou seja, precisa predispor argumentações, demonstrações, exemplos, princípios e "lugares-comuns" que transformam o "saber tradicional": e ele não faz isso para se despedir dele, mas para revitalizá-lo, relançá-lo, repensá-lo a fundo.
Em tudo isso, a herança do "estilo conciliar", a origem geográfica e histórica da América, o pertencimento a uma "nova geração" e o frescor da relação com a linguagem oferecem a Francisco o "pressuposto" para uma operação teológica, ao mesmo tempo, eficaz e refinada.
A paralisia da "teologia curial"
Paralelamente a esse fenômeno, que renovou profundamente a linguagem e o estilo, além dos conteúdos do magistério papal, assistimos a uma grave paralisia, que tem afetado muitos "centros" de produção teológica, acostumados a "repetir o mesmo", ao menos há 40 anos, e que, agora, de repente, encontram-se desorientados, sentem-se desacreditados, percebem-se periféricos.
A reação desses "centros" – ao mesmo tempo acadêmicos e institucionais – é de natureza diversa. Há aqueles que "colocaram o disco" e continuam repetindo o refrão que aprenderam de cor. Há aqueles que se esforçam para "manter o ritmo", mas com tal dificuldade e com tão pouca convicção que criam "híbridos sem forma". Há aqueles que expõem com hostilidade todos os "erros" do novo curso. Há, por fim, aqueles que se exercitam ainda melhor do que de costume na arte da "murmuração sem respeito".
Ora, em certa medida, isso é inevitável. Mas eu só trago no coração simplesmente o perfil teológico da reação. A Igreja precisa de uma teologia capaz de "pensar as questões". E de pensá-las em 360 graus, sem medo e sem autocensuras.
Nesse sentido, considero muito importante que, no início da Amoris laetitia, no número 2, o Papa Francisco pede que se pense "com liberdade" nas questões que permanecem em aberto em torno do amor, do matrimônio e da família.
O que já chamava a atenção durante o Sínodo e, depois, nesses meses de recepção da Amoris laetitia é a pobreza de pensamento e de audácia que brota de muitas tomadas de posição, não só de pastores, mas também de teólogos.
Precisamos de "boa teologia", de um lado e do outro
Se um bom jornalista começa o seu artigo com a frase: "Os nossos bispos têm todas as razões para temer o novo", isso depende de uma "má teologia" que continua paralisando as mentes e os corpos. Isso certamente não é culpa dos jornalistas. Nós construímos – para nos defender do Concílio Vaticano II – uma "linha Maginot", baseada na ideia de que podíamos apenas "repetir coisas antigas", que o "novo" estava totalmente conservado nos museus.
Baseamos nisso muitas posições magisteriais a partir do fim dos anos 1980. Também criamos gerações de pastores e de teólogos pensando-os e projetando-os somente como "repetidores". E, agora, estamos em apuros. Desde que o Papa Francisco, sem fazer qualquer revolução, mas voltando ao "bom senso conciliar", reatribuiu a cada um a própria autoridade, o sistema entrou em crise. Nós o tínhamos "tratado" para que o magistério romano fizesse tudo a partir do centro e para que os outros "executassem a partitura"... Desse modo, tudo podia ser bloqueado e controlado a partir do centro. Agora, não é mais assim. Nem os pastores podem apenas "executar circulares", nem os teólogos podem apenas "repetir argumentações ou normativas".
Isso deve valer para todos. Tanto para aqueles que apoiam de modo convencido o novo estilo desejado por Francisco; quanto para aqueles que permanecem perplexos, têm reservas, levantam objeções. Para todos, é necessário "pensar grande".
Talvez, entre todos, os mais em dificuldade são os juristas e os canonistas, acostumados há muitas décadas a simplesmente administrar o real e não a meditar cuidadosamente sobre o possível. Hoje, precisaríamos urgentemente da sua arte de "distinguir". Mas, muitas vezes, escutamo-los apenas enrijecidos em posições drásticas e maximalistas, justamente sem qualquer distinção, em ambos os sentidos do termo.
Falta de debate e efeito cômico
Julgando o debate sinodal e o pós-sinodal em curso, tem-se a impressão de que ele faltou, justamente por carência de recursos teológicos. Aqueles que "levantam reservas", muitas vezes, são forçados ou simplesmente a repetir aquela teologia que, há 30 anos, tornou-se incapaz de responder às questões ou a rasgar as suas vestes diante de todas as "carências" da nova configuração. Até denunciar uma "irreparável ruptura" de uma tradição que eles gostariam de poder identificar com a teologia matrimonial antimodernista elaborada a partir de meados de 1800.
A "res" do matrimônio não é mais nem a de Pio IX, nem a de Pio XI e nem a de Paulo VI. Para honrar uma "res" em que Deus e ser humano colaboram ombro a ombro, não se pode usar categorias que opõem ser humano a Deus. Nesse sentido, Francisco teve o mérito de desbloquear noções jurídicas, eclesiais e pastorais que giravam sobre si mesmas ao menos há 40 anos. E que muitos gostariam de manter assim como estão, contando a costumeira fabulazinha de acordo com a qual eles não teriam nenhum poder para mudá-la... sem trair a tradição.
Quando faz isso, a teologia facilmente se torna ridícula. Francisco, com o seu sorriso, fez a coisa mais séria: obrigou-nos a encontrar novos argumentos, novos caminhos, novas respostas, novas linguagens. Francisco tem confiança de que a tradição pode ser traduzida. Quem pensa, em vez disso, que pode viver da renda do trabalho feito por teólogos de 150 anos atrás – na época, com as suas justificativas – torna-se hoje a "caricatura" de um teólogo: mesmo sem querer, muda de atividade e se torna um palhaço (dito com todo o respeito pelo circo).
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Papa Francisco e a "paralisia" da teologia de corte. Artigo de Andrea Grillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU