"Sabemos que a espera está acontecendo e que temos razão de esperar, mas não sabemos o tempo... Então há que estar vigilante o tempo todo, contemplando a Maria, contemplando o povo de Israel, o resto fiel de Israel, da qual Maria é símbolo, para que possamos nesse advento, apesar de todas as coisas terríveis que acontecem no mundo, apesar da guerra que se instaurou em Gaza, apesar da guerra da Ucrânia e da Rússia e que continua, apesar de todos os sofrimentos... podemos esperar porque Deus ainda confia na humanidade. Ele enviou seu filho, ele vem a nosso encontro e os olhos não viram e jamais o coração humano imaginou o que Ele nos tem preparado na vinda e na encarnação de seu filho."
A reflexão é da teóloga Maria Clara Lucchetti Bingemer, a qual possui graduação Comunicação Social (1975) e mestrado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio (1985) e doutorado em Teologia Sistemática pela Pontifícia Universidade Gregoriana - PUG (1989). Tem experiência na área de Teologia, com ênfase em Teologia Sistemática, atuando principalmente nos seguintes temas: Deus, alteridade, mulher, violência e espiritualidade. Tem pesquisado e publicado nos últimos anos sobre o pensamento da filósofa francesa Simone Weil. Atualmente seus estudos e pesquisas vão primordialmente na direção do pensamento e escritos de místicos contemporâneos e da interface entre Teologia e Literatura.
Is 63,16b-17.19b;64,2b-7
Sl 79(80),2ac.3b.15-16.18-19 (R. 4)
1Cor 1,3-9
Mc 13,33-37
Saúdo a todos na grande alegria desse tempo litúrgico que vamos começar neste domingo: o Advento, o tempo da espera, da espera do novo que vai chegar; o tempo dos sinais da vinda de Deus no meio de nós, como um de nós. Deus vem ao nosso encontro e vem na nossa carne, na nossa condição humana.
E nós estamos nos preparando, assim como a mulher grávida, prepara-se com seu bebê. Na medida em que seu bebê cresce no seu ventre, ela se prepara para a chegada dessa nova criança, desse filho que vai nascer, dessa novidade maravilhosa que é a vida humana acontecendo no meio do mundo. No nosso caso, aquele que esperamos é o Salvador, o Messias, o Filho de Deus.
Vamos, então, na reflexão de hoje, entrar na expectativa do povo de Israel. O povo de Israel está no exílio e o profeta Isaías (primeira leitura: Is 63,16b-17.19b;64,2b-7) precisa levantar a sua esperança, fazê-lo ver que o melhor está por vir pesar de todo o sofrimento que ele está vivendo. Então o profeta Isaías diz: “Voz, senhor, sois nosso pai e nosso redentor; desde sempre é o vosso nome. Voltai por amor dos vossos servos e das tribos da vossa herança. Se rasgásseis os céus fez os céus e descêsseis, ante a vossa face tremeriam os montes. Mas voz descestes e perante a vossa face estremeceram os montes. Ou seja Deus, cumpre a sua promessa. Não abandonou o seu povo.
E aí o profeta então exclama, cheio de Alegria, de júbilo. “Nunca os ouvidos escutaram, nem os olhos viram que um Deus além de voz fizesse tanto em favor dos que nele esperam. Voz sais ao encontro dos que praticam a justiça e recordam os vossos caminhos. Éramos todos como um ser impuro. As nossas ações justas eram todas como veste imunda. Todas caímos como folhas secas. Nossas faltas nos levavam como vento. Ninguém invocava o vosso nome. Ninguém se levantava para se apoiar em voz, porque nos tinha se escondido o vosso rosto e nos deixava a mercê das nossas faltas. Voz, porém, senhor, sois nosso pai e nosso Barro de que sois o oleiro”.
Que beleza esta imagem: Deus é como um oleiro que vai moldando o barro, esse barro somos nós, o Barro de que é feito Adão, a primeira criatura humana que aparece sobre a face da Terra. “Somos todos obra das vossas mãos”.
Então, Deus, amassando esse barro do qual somos feitos, sopra em nós o seu espírito e nós passamos a ser obras de arte. E para saber quem somos, Ele manda o Filho, que é a obra de arte por excelência, que vai vir ao nosso meio como um de nós, vai se encarnar na nossa condição humana.
E profeta quer dizer para o povo: não fiquem tristes, mas convertam-se, saiam da vossa vida de pecado, da vossa vida de indiferença ao outro, dessa vida superficial que vocês levam, dessa vida de impureza, dessa vida de injustiça... E levantem-se para esperar no Senhor, porque o senhor não falha. Vocês pensam que ele escondeu o seu rosto, se esqueceu de nós e nos abandonou, mas ele não fez isso. Nós somos o Barro do qual ele é o oleiro. Ele não abandona a obra de suas mãos.
Então, a belíssima leitura profética do profeta Isaías nos dizendo que tenhamos ânimo, que não deixamos de esperar no Senhor, porque o senhor não abandona e não se esquece daqueles que ele criou, daqueles que ele chamou o seu serviço, daqueles que são sua herança.
O salmo, continua um pouco nessa linha. O refrão diz: "Senhor, nosso Deus, fazei nos voltar. Mostrai-nos o vosso rosto e seremos salvos. Escutai, pastor de Israel. Vinde de novo, Senhor olhai dos céus e vede. Visitai essa vinha..."
O salmista (Sl 79) está clamando Deus para que ele não deixe de vir ao encontro daqueles que esperam nele.
O Evangelho (Mc 13,33-37) vai sublinha ainda mais essa atitude que deve ser a nossa nesse tempo de advento: de conversão, de espera por aquele que vem.
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: acautelai-vos e vigiai, porque não sabeis quando chegará o momento. Será como um homem que partiu de viagem. Ao deixar a sua casa, deu plenos poderes aos seus servos, atribuindo a cada um a sua tarefa. E mandou ao porteiro que vigiasse. Vigiai, portanto, visto que não sabeis quando virá o dono da casa: se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se de manhãzinha... não se dê o caso que, vindo inesperadamente, vos encontre a dormir. O que vos digo a vós digo a todos: vigiai.
Então, peçamos a Deus nesse primeiro domingo do advento que ele nos dê essa graça do espírito de vigília, do espírito desperto, como sentinela no meio da noite. E Deus mesmo é este sentinela que não dorme, nem se afasta, nem silencia. É o Vigia de Israel.
Nós somos, então, chamados a sermos também vigilantes, porque não sabemos qual é o momento. Sabemos que o Messias vem, sabemos porque olhamos o corpo da mulher Maria, o corpo dessa que é mãe de Jesus e mãe nossa, e vemos que ele está cheio de uma outra vida, de uma nova vida.
Sabemos que a espera está acontecendo e que temos razão de esperar, mas não sabemos o tempo... Então há que estar vigilante o tempo todo, contemplando a Maria, contemplando o povo de Israel, o resto fiel de Israel, da qual Maria é símbolo, para que possamos nesse advento, apesar de todas as coisas terríveis que acontecem no mundo, apesar da guerra que se instaurou em Gaza, apesar da guerra da Ucrânia e da Rússia e que continua, apesar de todos os sofrimentos... podemos esperar porque Deus ainda confia na humanidade. Ele enviou seu filho, ele vem a nosso encontro e os olhos não viram e jamais o coração humano imaginou o que Ele nos tem preparado na vinda e na encarnação de seu filho.