Por: MpvM | 26 Junho 2020
No Evangelho desse domingo (Mt 16,13-19) "vemos Jesus ensinando mais uma vez aos seus discípulos, chamando-os ao discernimento. Quem dizem que sou? E vocês, quem acham que eu sou? São perguntas muito importantes que nos levam a pensar na imagem que fazemos nós de Jesus, cremos e recitamos na profissão de fé que ele é o Cristo Filho do Deus vivo, segunda pessoa da Santíssima trindade, mas é o Jesus Cristo dos dogmas e doutrinas que sigo cegamente acreditando estar fazendo o bem, cumprindo os preceitos?
A reflexão é de Lucíola Cruz Paiva Tisi, teóloga leiga, bacharel em teologia (2017) e mestre em Teologia sistemática pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Atua junto à Congregação dos Agostinianos da Assunção como leiga e na paróquia agostiniana da Santíssima Trindade no Rio/RJ, no catecumenato de adultos e como ministra extraordinária da eucaristia. Também integra um grupo de reflexão e estudos de leigos do qual faz parte.
Leituras do dia
1ª Leitura - At 12,1-11
Salmo - Sl 33(34),2-3.4-5.6-7.8-9 (R. 5)
2ª Leitura - 2Tm 4,6-8.17-18
Evangelho - Mt 16,13-19
A celebração desse domingo é privilegiada, pois celebramos a vida e o testemunho de duas pessoas fundamentais para a nossa igreja e para nossa fé: Pedro e Paulo. Pessoas que confiaram e que dedicaram a vida ao anúncio de Jesus Cristo e do Reino de Deus, pessoas que creram ao ponto do martírio, da entrega da vida à execução. Ambos possuem a fé e a confiança em seu Senhor diante do martírio.
Da leitura de Atos dos Apóstolos (At 12,1-11) gostaria de ressaltar alguns aspectos: A execução de Tiago, que foi logo seguida pela prisão de Pedro por Herodes Antipas I, para agradar aos judeus que perseguiam os seguidores de Jesus, A tranquilidade de Pedro que dormia nas possíveis últimas horas de sua vida e a Igreja nascente em oração.
Agradar aos judeus era ato político que agradava também ao sistema. Vemos aí, uma atitude de interesse, não de uma pessoa que se preocupa com a verdade e sim com seu status quo, com seu conforto e bem estar visando preservar sua situação.
O sono de Pedro nos mostra a sua tranquilidade e confiança, em sua entrega. Confia porque tem fé, porque sabe que não está só e que não será desamparado, viveu e testemunhou o Messias e confia que o Pai virá em seu encontro. Não creio que pensava que seria da forma como sucedeu, enviando um anjo para libertá-lo, mas na confiança da ressurreição e no seu encontro com o Ressuscitado. Pedro não teme a morte, porque sabe em seu coração que esta foi vencida.
Ainda na visita do anjo a Pedro, vemos os comandos: levanta-te, cinge-te, calça suas sandálias, envolve-te no manto e segue-me. É o envio missionário e a afirmação de que sua hora ainda não chegou, há muito a fazer, ainda precisa servir e liderar a comunidade.
Vemos então essa comunidade que ora por Pedro, povo que ora porque tem fé, clamando a Deus por sua vida. Deus atende o clamor de seu povo, liberta Pedro para que possa também ajudar a guiá-los à verdadeira liberdade.
Essa mesma tranquilidade e confiança vamos encontrar em Paulo (2Tm 4,6-8.17-18) que, acostumado ao trabalho manual, se sente impotente, sabe que seu destino também será a morte, mas como Pedro confia e se tranquiliza na certeza de ter feito o que estava ao seu alcance para servir a comunidade dos gentios anunciando e instruindo em como fazer o Reino de Deus germinar, mediante o seguimento de Jesus. Paulo trabalha com grande fervor e convicção, desempenho de um verdadeiro atleta, luta por aquilo que crê sem medir esforços, agiu assim na perseguição aos cristãos e age agora em defesa de sua missão.
A declaração de Paulo “Combati o bom combate, terminei minha corrida, conservei a fé” mostra sua confiança na misericórdia do Pai e sua humildade em reconhecer suas limitações: fiz o que consegui, espero que tenha sido o suficiente. Podemos imaginar também aí o sofrimento da comunidade paulina que continua firme na fé e oração.
Passando ao evangelho (Mt 16,13-19), vemos Jesus ensinando mais uma vez aos seus discípulos, chamando-os ao discernimento. Quem dizem que sou? E vocês, quem acham que eu sou? São perguntas muito importantes que nos levam a pensar na imagem que fazemos nós de Jesus: cremos e recitamos na profissão de fé que ele é o Cristo Filho do Deus vivo, segunda pessoa da Santíssima trindade? Cremos que é o Jesus Cristo dos dogmas e doutrinas que sigo cegamente acreditando estar fazendo o bem, cumprindo os preceitos ou o Jesus que é amor e por isso misericórdia, compassivo, que passou a vida a fazer o bem, que se faz pequeno para estar próximo, se faz alimento para estar em comunhão conosco, para fazer parte conosco nos convidando a também fazer parte com ele ?
São perguntas que precisamos responder, são respostas que exigem reflexão e atitude. Atitude que terá que tomar Pedro mediante sua resposta, atitude responsável de receber como missão o legado deixado por Jesus, à comunidade que o acolhe e nele crê e que precisa continuar unida sob uma liderança fiel.
A simbologia da chave, é essa confiança e responsabilidade dada a Pedro, Jesus entrega a ele seu tesouro, a primeira Igreja, ainda germinando, que precisa de muito zelo e cuidado para poder florescer e dar frutos. Precisa ser acompanhada. Cabe a Pedro a missão de continuar, e a seus sucessores em fazê-la germinar também pelos quatro cantos da Terra no decorrer da história.
E nós, onde ficamos? O que isso implica em 2020? Vivemos um ano singular, como afinal são todos os anos, mas esse se fez diferente por unir todo o planeta em uma dor, em um problema invisível que trouxe a morte de tantos. Somos então chamados com mais evidência a refletir em como estamos. Presos em nossas casas, agimos com a confiança de Pedro e de Paulo, na certeza de que ao sairmos dessa situação? Teremos mais do que nunca o compromisso missionário de colocar a mão na massa, e trabalhar por um mundo mais justo e mais humano? E os pobres, os vulneráveis os excluídos, que clamam por justiça social, por igualdade, por uma vida digna com ainda mais força nesse momento?
Assim como aconteceu com as comunidades Petrina e Paulina, é a oração da humanidade que suplica um mundo melhor, um mundo mais justo, em comunhão com toda a criação. Falo da criação porque sentimos nesse período o clamor também da natureza, que veio nos mostrar seu sofrimento por nossas ações, Vimos isso em seu alívio mesmo que em pequeno período de descanso: o ar mais limpo, as águas menos poluídas. Temos como Cristãos, como seres humanos, também as chaves, podem não ser as chaves dos céus, mas sim, para nos abrirmos as novidades do evangelho, de nos fecharmos aos perigos, a chave da confiança de Pedro e de Paulo, chaves para a ação, as chaves de nossas famílias, de grupos onde atuamos e com ela o dever de suscitar a união na luta pelas minorias, na luta pela justiça, por um mundo de mais amor e fraternidade.
A exemplo de Pedro e Paulo, nos quais vemos a vocação missionária da Igreja, precisamos assumir que somos Igreja, comunidade de fé, comunidade viva com o objetivo e a responsabilidade de anunciar o Reino, a boa nova, herança de Jesus Cristo a toda a humanidade, assumindo assim a necessidade do serviço do acolhimento e do cuidado. Vivendo a Igreja em saída que tanto nos fala Francisco, precisamos ser dinâmicos e provocar o movimento do encontro, do acolhimento e da comunhão.
Finalizando, deixo aqui uma pergunta para refletirmos: Nesta pandemia, permanecemos com a fé no Senhor que caminha conosco, ao nosso lado, que nos acompanha, na oração que fazemos uns pelos outros, nos abrindo para as novidades de um mundo novo?
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Solenidade de São Pedro e São Paulo - Ano A - A vida doada na fé e confiança em Jesus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU