Por: MpvM | 26 Abril 2019
"Em tempos sombrios, de tormentas, polarizações e ódios explícitos, que se transmutam em violências reais, precisamos muito desta paz oferecida pelo Cristo ressuscitado. O círculo vicioso da violência só pode ser interrompido por pessoas que acolham no coração o projeto de Jesus, aquele que vence sem fazer vencidos. Somente assim poderemos ajudar a afastar o medo e construir a paz, com gestos proféticos de solidariedade, cuidado e misericórdia para com todos."
A reflexão é de Maria Inês de Castro Millen, leiga. Ela é graduada em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1971), em Teologia pela Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio (1992), mestre em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1997) e possui doutorado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio (2003). Atualmente é ouvidora e assessora pedagógica do Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora e professora titular no curso de Teologia do Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Ginecologia e Obstetrícia, atuando principalmente nos seguintes temas: moral fundamental, moral social, moral sexual conjugal e familiar, bioética e antropologia teológica.
Referências bíblicas:
1ª leitura: At 5,12-16
Salmo: Sl 117(118),2-4.22-27a (R/. 1)
2ª leitura: Ap 1,9-11a.12-13.17-19
Evangelho: Jo 20,19-31
O tempo pascal, que estamos vivendo, quer nos lembrar que Jesus venceu a morte e se encontra vivo no meio de nós, cumprindo a sua promessa: “Eis que estarei convosco até o final dos tempos”. Este então é o pano de fundo da nossa reflexão: “Ele está vivo”.
As leituras propostas para este segundo domingo da páscoa nos convidam, a meu ver, a refletir a partir de três indicações:
A primeira indicação: Os discípulos se encontravam unidos pelos mesmos sentimentos
O texto dos Atos dos Apóstolos (At 5,12-16 ) afirma: “Todos os fieis se reuniam, com muita união, no Pórtico de Salomão”. O Evangelho (Jo 20,19-31) relata: “Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam...” E, mas adiante: “Oito dias depois, encontravam-se os discípulos novamente reunidos em casa”. Estes textos querem nos falar da união da comunidade que se formou em torno de Jesus e do seu projeto do Reino.
A leitura dos Atos nos diz que os apóstolos, unidos pelos mesmos sentimentos, realizavam muitos milagres e prodígios entre o povo. Assim juntos, com os corações voltados para o projeto do Reino anunciado, podiam realizar aquilo que Jesus mesmo havia feito durante a sua vida e pedido que também nós o fizéssemos: cuidar das pessoas necessitadas, curar os doentes, acolher os pobres e consolar os corações aflitos, anunciando assim que a graça de Deus é um dom oferecido a todos. Podemos afirmar que há uma continuidade entre a missão de Jesus e a missão da comunidade cristã, a mesma atividade salvadora e libertadora de Jesus em favor dos pobres e dos oprimidos persiste agora no mundo pela comunidade Igreja que se une na mesma fé, na mesma esperança e no mesmo amor.
O Evangelho também nos conta que a comunidade dos discípulos se encontrava reunida, em casa, no primeiro dia de um novo tempo, o tempo da nova criação. E, porque os discípulos estavam lá reunidos, por conta de um acontecimento relacionado aos seus sonhos, Jesus ressuscitado se coloca entre eles, se faz um com eles e os capacita para a missão.
É este Jesus ressuscitado que alarga os horizontes de seus discípulos, entre os quais nos incluímos, trazendo à tona os seus melhores sonhos, os nossos melhores sonhos. Sonhos que se tornam realidade na concretização do Reino de Deus, já no hoje da história. Os textos nos mostram que estes sonhos são viáveis e que podem acontecer através de ações muito concretas, realizadas por aqueles que se unem em torno a um projeto comum revelado por Deus a cada um de nós.
Segunda indicação: Jesus se coloca no meio
Nas leituras propostas, que estão no livro do apocalipse e no evangelho narrado por João, esta é a posição ocupada por Jesus, uma posição de referência: Jesus se coloca no centro das nossas vidas.
Ouçamos no Apocalipse: “Voltei-me para ver quem era a voz que me falava; ao voltar-me, vi sete candelabros de ouro e, no meio dos candelabros, alguém semelhante a um filho do homem”.
Esse “Filho do Homem” é o Cristo ressuscitado. Ele está no meio dos sete candelabros. O número sete na Sagrada Escritura representa a totalidade, a plenitude. Assim, os sete candelabros simbolizam toda a humanidade reunida em torno do Cristo.
Ouçamos no Evangelho: “Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, colocou-Se no meio deles...”
A comunidade dos discípulos se encontrava reunida e estes discípulos estavam com medo dos judeus. A comunidade estava desamparada e insegura, atingida pela morte, cercada por um ambiente hostil. Jesus veio, colocou-Se no meio deles e disse-lhes: “A paz esteja convosco”
Só quando estamos certos que Jesus está no meio de nós, que está no centro de nossas vidas é que podemos ser felizes de novo.
Isto porque, agora, o medo dá lugar à alegria: O texto afirma: “os discípulos se alegraram por verem o Senhor”.
Terceira indicação: O dom da paz
No evangelho, Jesus, colocando-se no meio dos discípulos reunidos, lhes oferece por três vezes a paz. Esta paz, o “shalom” hebraico, quer falar de harmonia, de serenidade, de tranquilidade, de confiança, mesmo em meio aos conflitos existentes. Fica claro, assim, para os discípulos, que Jesus venceu aquilo que os assustava: a morte, a opressão, a hostilidade.
Em tempos sombrios, de tormentas, polarizações e ódios explícitos, que se transmutam em violências reais, precisamos muito desta paz oferecida pelo Cristo ressuscitado. O círculo vicioso da violência só pode ser interrompido por pessoas que acolham no coração o projeto de Jesus, aquele que vence sem fazer vencidos. Somente assim poderemos ajudar a afastar o medo e construir a paz, com gestos proféticos de solidariedade, cuidado e misericórdia para com todos.
Este amor manifesto por Jesus, que está no meio de nós, nos livrará do medo que nos oprime e angustia, e a paz, mesmo em meio a tantas dificuldades poderá voltar a reinar.
Uma última palavra sobre Tomé, aquele que, no primeiro momento, não estando reunido com os discípulos não pode perceber Jesus no meio e nem receber o dom da paz. O texto nos diz: “Tomé, um dos doze, não estava com eles”. Por que será? Nunca saberemos. Muitas especulações já foram feitas: Nestas, Tomé representa aqueles que vivem fechados em si próprios; não faz caso do testemunho da comunidade, não percebe os sinais de vida nova que nela se manifestam, pretende obter uma demonstração particular de Deus... São apenas especulações. O texto não nos diz isto. Diz somente que ele não estava daquela vez e quando os discípulos dizem: Vimos o Senhor, ele não acreditou; o que é muito humano e fácil de entender. É como se pensasse: Como assim? Ele está morto, nós todos sabemos disto, como vocês podem tê-lo visto?.
Mas, oito dias depois, estando os discípulos novamente reunidos, Tomé estava lá, e Jesus se apresenta de novo no meio deles e torna a dizer: “A paz esteja convosco”. De modo especial fala com Tomé. “Veja, sou eu mesmo”. Tomé então responde, fazendo uma grande confissão de fé: “Meu Senhor e meu Deus!”.
A experiência de Tomé não é exclusiva dele. Todos os cristãos, de todos os tempos, podem passar por isto. Sozinhos, em algum momento, por alguma razão, fora da comunidade de fé, que nos anima e nos confirma, nos sentimos fracos, descrentes, desencorajados e temerosos. É por isto que precisamos uns dos outros, que precisamos estar unidos, de mãos e corações entrelaçados, para que Jesus, colocando-se no meio de nós, nos oferecendo a sua paz, nos capacite para o testemunho profético em um mundo triste, solitário e desesperançado. Só assim estaremos felizes porque poderemos crer apesar de não termos visto e cremos porque temos uma comunidade de irmãos e irmãs que nos acolhe e nos sustenta na fé, na esperança e no amor.
Permaneçamos unidos!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Segundo Domingo da Páscoa – Ano C - Ele está Vivo! - Instituto Humanitas Unisinos - IHU