18 Junho 2012
Marco do debate sobre desenvolvimento sustentável e um dos pontos mais importantes das negociações ambientais desde a Eco-92, o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas - basicamente, nações ricas doam e nações pobres recebem -, apareceu como forte entrave nas negociações da primeira semana da Rio+20.
A reportagem é de Fernando Dantas e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 17-06-2012.
Países em desenvolvimento, representados pelo G-77, não abrem mão do princípio como ponto de partida para qualquer definição de metas ou compromissos. Países desenvolvidos, como EUA e os da União Europeia, argumentam que o cenário não é o mesmo de 20 anos atrás e questionam o fato de muitos emergentes terem se tornado potências econômicas e geopolíticas, com condição de contribuir.
Indicadores econômicos confirmam o avanço dos emergentes. Em 1992, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), as economias avançadas detinham 84% do PIB mundial. Em 2012, a fatia já recua para 62%.
Além disso, apesar de historicamente os países desenvolvidos terem contribuído mais com a concentração de gases-estufa na atmosfera - principal motivo do aquecimento global -, hoje a China responde pela maior taxa de emissões. Ainda assim, EUA continuam tendo a maior contribuição per capita no problema.
Essa mudança aparece como pano de fundo nas diversas vezes em que o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, é citado. A queda de braço travou as discussões iniciais - parte dos países em desenvolvimento não admite recuos ao que foi acordado na Eco-92.
Irritação
Por trás da linguagem diplomática, há a irritação de países desenvolvidos com a insistência das nações emergentes mais poderosas em manter a polaridade entre ricos doadores e pobres receptores. Na delegação de um grande país europeu, por exemplo, a tentativa do G-77 de inclusão de um novo fundo de US$ 30 bilhões - a ser bancado pelos desenvolvidos - para financiamento da transição global para o desenvolvimento sustentável foi vista como um excesso de confiança por parte do Brasil, sem base em nenhum acordo.
O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, diz que, apesar do avanço, a pobreza continua concentrada no mundo em desenvolvimento. "Temos no País 16 milhões de pessoas na miséria. Na Índia são centenas de milhões. Na China, 200 milhões", cita, acrescentando que a renda per capita dos Brics é muito inferior à dos ricos.
De fato, enquanto os EUA têm renda per capita projetada pelo FMI para 2012 de quase US$ 50 mil, a dos Brics varia do máximo de US$ 14,3 mil (Rússia) ao mínimo de US$ 1,5 mil (Índia).
Na área de transferência de tecnologia dos ricos, considerada crucial pelos emergentes para viabilizar a economia verde, um diplomata brasileiro lotado na Europa observa que empresas alemães de tecnologia de proteção ambiental enxergam sua excelência como uma vantagem comercial e não um benefício a ser repartido gratuitamente com os mais pobres.
Para Patriota, o grande tema da Rio+20 é a erradicação da pobreza, o que justifica que não se admita retrocessos. "Não pode deixar de ter um pouco da dinâmica Norte-Sul nesse debate."
O embaixador brasileiro André Corrêa do Lago nota que apenas cinco países desenvolvidos cumprem a meta da Eco-92 de doar 0,7% do PIB às nações pobres. Potocnik, por sua vez, diz que a média da União Europeia é de 0,42% e que há um compromisso de chegar aos 0,7% do PIB em 2015. Apesar da declaração de boas intenções, a crise do euro está levando a fluxos de suporte financeiro muito maiores entre os países da zona monetária que na direção do mundo pobre.
Na área de transferência de tecnologia dos países ricos, considerada crucial pelos emergentes para viabilizar a economia verde, um diplomata brasileiro lotado na Europa observa que empresas alemães de tecnologia de proteção ambiental enxergam sua excelência como uma vantagem comercial e não como um benefício a ser repartido gratuitamente com os países pobres. Outro comentário frequente é que países emergentes como a China estão na ponta de algumas tecnologias ambientais, como turbinas eólicas, e que a transferência de tecnologia não pode mais ser vista apenas na direção "Norte-Sul", mas deve incluir também o eixo "Sul-Sul".
Corrêa do Lago concorda que o mundo se tornou bem mais complexo do que era em 1992. "Não estamos mais naquele tipo de negociação em que os países desenvolvidos mostravam o caminho a ser seguido e os países em desenvolvimento tinham de seguir aquela trilha."
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Principal avanço da Eco-92 trava debate em torno de acordo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU