15 Junho 2012
É preciso mudar o paradigma do desenvolvimento e aprender a prosperar sem crescer. Essas são as ideias do matemático e filósofo Tim Jackson. Para ele, é necessário levar em conta os limites do planeta. Professor de sustentabilidade da Universidade de Surrey, Reino Unido, Jackson está na linha de frente das propostas que visam alternativas ao PIB para medir o desenvolvimento de uma sociedade.
A entrevista é de Guilherme Serodio e publicada pelo jornal Valor, 15-06-2012.
Eis a entrevista.
Quais as expectativas para a Rio+20?
Minha esperança e expectativa para a conferência é que se reconheça que desde a conferência de 1992 não houve tanto progresso quanto deveria em desenvolvimento sustentável. Uma das razões para isso é o sistema econômico que temos. E espero que o foco na economia verde na Rio+20 leve a algumas mudanças positivas no sistema econômico.
Que tipo de mudanças?
A economia verde deve reconhecer algumas coisas. Uma é que ainda há desigualdades entre os países ricos e pobres. Com isso, não é possível pensar simplesmente em crescimento econômico indefinidamente. Em algum ponto há limites ecológicos e parecemos já estar bem perto deles. A economia verde deve integrar essa ideia de limites na forma como organizamos a economia. É preciso pensar sobre ar limpo, acesso a recursos naturais, na qualidade de vida dos pobres e no sistema econômico que ainda conduz um crescimento insustentável, principalmente nas economias ricas.
Ao falar em cortar o consumo, o sr. fala nos países ricos?
Sim. Para mim, a responsabilidade é dos países ricos. Economia verde não é dizer para os países pobres que não há mais espaço para o desenvolvimento. Mas dizer aos países ricos que eles precisam de um novo modelo econômico porque em termos ecológicos e sociais não podemos deixar que continuem enriquecendo sem se importar com o que acontece ao planeta e aos mais pobres.
O que são padrões sustentáveis de consumo?
A ideia é nos concentrarmos no que importa para as pessoas para ter qualidade de vida. Então é preciso discutir o que é qualidade de vida, que, claro, consiste em habitação, alimentação e outras coisas básicas. Mas vai além disso, é também sobre questões sociais e psicológicas.
Quando falamos sobre a direção que o consumo sustentável deve tomar, falamos na mudança da ênfase em coisas materiais para a ênfase nos serviços que realmente importam para nós, como educação, assistência social e lazer. A ideia é construir a economia em torno desses serviços, não sobre bens materiais. Não é dizer que devemos estabelecer padrões de consumo ou ter mais regulação, é sobre investir no tipo de economia que oferece serviços e melhora a qualidade de vida das pessoas dentro dos limites da ecologia. Precisamos integrar esses limites dentro da atividade econômica. Em alguma hora isso vai significar um aumento nos preços dos recursos. Ou seja, o uso do mecanismo do preço para incorporar os danos causados ao planeta nos preços que as pessoas pagam pelos bens. Mas a ideia não é focar na estratégia punitiva, mas construir comunidades com mais oportunidades para educação, acesso a recriação e lazer.
E a classe média nos países em desenvolvimento? Estamos começando a consumir mais.
Há uma armadilha aí. Minha mensagem não é direcionada às classes médias no Brasil ou na Índia. Não é meu papel falar sobre isso. Meu papel como cidadão responsável de um país rico é dizer que as nações ricas precisam mudar o sistema. O debate que os países em desenvolvimento como Brasil, Índia e China têm que promover internamente é se essa busca por consumo material é sustentável para eles. Isso vai elevar a qualidade de vida dos pobres? Será viável no longo prazo, quando houver restrições ambientais?
Como prosperar sem crescer?
Existe uma diferença entre crescimento econômico e prosperidade. Existe uma diferença entre ter bens materiais e bem estar. Há várias respostas a essa questão, a primeira é filosófica, questionar o que é qualidade de vida. É sobre as necessidades básicas? Sobre minha habilidade de sentir bem em minha comunidade? Claro, mas também sobre ter segurança no futuro. O que a crise financeira fez foi vender uma falsa sensação de segurança, a esperança que ter mais bens faria nossa vida melhor. Agora sabemos que não é verdade. Então temos que criar essa sensação de esperança de outra forma. Mas além disso precisamos ter um senso de segurança financeira. A grande questão que fica é como as economias podem funcionar sem o paradigma do crescimento do consumo. A verdade é que ainda não sabemos. Há cerca de 100 anos as séries econômicas se baseiam na ideia que estabilidade depende do aumento do crescimento. Agora é urgente desenvolver séries em que seja possível pensar em estabilidade econômica e financeira sem depender de crescimento.
E o que podemos medir ao invés do PIB?
Todo tipo de coisa. Alguns dizem que devemos medir a felicidade das pessoas ou a situação da saúde e educação. São aspectos importantes, mas ainda acredito que o PIB é algo importante, porque calcula o que produzimos e o que gastamos na economia. Mas o PIB não é apenas uma medida de progresso. Sabemos que quando o PIB cai coisas ruins acontecem, mas também sabemos que quando sobe coisas ruins também acontecem. Sabemos que eu um sistema onde a estabilidade depende do crescimento do PIB também se cria uma dinâmica negativa, a dinâmica da crise financeira. Então também devemos medir a qualidade das nossas vidas no sentido de progresso social, educacional e político. E há medidas sobre todas essas possibilidades. Mas não devemos descartar o PIB.
O Brasil começará a medir o PIB Verde, mas pelo consumo de água, não pelo saneamento básico, em que não temos bons números. Um índice como esse pode ser usado como propaganda pelos governos?
Claro que pode. A criação do PIB foi um consenso. O que for desenvolvido para fazer comparações internacionais precisa passar por esse mesmo processo de negociação, a definição do que é significativo para medir um PIB Verde ou outro índice de renda sustentável. O Butão conseguiu muita publicidade sobre o FIB [Felicidade Interna Bruta]. Mas criou uma ideia excitante que questiona o conceito convencional de desenvolvimento e o significado de prosperidade. E mostra não apenas aspectos materiais, mas sociais. Um pequeno país com uma grande ideia que convenceu até as Nações Unidas a pensar diferente.
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Países ricos devem prosperar sem crescer, diz britânico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU