13 Janeiro 2012
Na crise do capitalismo, estamos em um templo. As lágrimas não são ficção, a preocupação, mesmo que grave, não é uma encenação, a palavra deve ser ouvida não por submissão à autoridade, mas sim porque, nela, quem participa do novo rito reconhece a verdade. Dessa verdade, não há como escapar, porque é a única possibilidade de salvação. Ela não fornece todos os dados do "como" se chegará à salvação, mas uma coisa é certa: este é o único caminho.
A opinião é do deputado, jornalista e escritor italiano Furio Colombo, em artigo para o jornal Il Fatto Quotidiano, 08-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Desce e se deposita sobre artigos e discursos, sobre tomadas de posição e protestos uma auréola de magistério religioso. É o momento fundador de uma fé ou da rejeição de uma fé. Você o vê, você o constata: uma parte começa a acreditar com devoção. Outra parte é composta por não crentes ou ateus. Os dois grupos, no entanto, não são nada homogêneos agora, compostos por pessoas muito diferentes, entre imposição e confiança de um lado, entre o ceticismo e revolta (alguns temem revolta violenta), de outro.
Tanto os líderes das novas tábuas da lei, quanto aqueles que estão decididos (nem todos decididos do mesmo modo) a ficar de fora do templo, estão conscientes de que o evento é único, que o momento é decisivo. Vibra ao redor de todos (mesmo dos não crentes) a percepção de uma excepcionalidade que dá um peso enorme a toda frase, todo gesto, transforma tudo em símbolo.
Salvação e perdição são os dois modos para definir o espaço e os limites de espaço. "Agora, já" ou "antes, falemos a respeito" são as duas maneiras de qualificar a percepção do tempo. Como sempre, a graça não pode esperar. A rejeição da graça, entendida como salvação, é pecado. O pecado se anuncia com o arrastamento do tempo. "Discutamo-lo" é a típica saída de quem não tem fé.
Do que eu estou falando? O leitor entendeu que eu estou falando da Europa destes dias, que estou falando da Itália.
Eu falei sobre a contraposição entre salvação e perdição, mas a palavra certa é exclusão. Exclusão da comunidade dos salvados. É a verdadeira sanção do pecado: fora do bem-estar, fora do crescimento, fora do futuro, fora do euro, fora da Europa. O pecado é rejeitar o sacrifício. É verdade que o sacrifício não é igual para todos, mas isso ocorre em todas as religiões, onde alguns, pela própria fé, pagam preços imensos, e outros, não.
Nas religiões clássicas, diz-se que Alguém ou Algo providenciará, em uma outra ambientação de fatos e de tempos, para reembolsar quem teve que se exceder na oferta ("bem-aventurados os pobres"). Nesta que estamos vivenciando e discutindo, o reembolso é confiado a uma esperança que prudentemente permanece não expressa. No máximo, dizem-lhe que, se o sistema voltar a produzir riqueza, só poderá distribuí-la. Exceto em casos de guerra ou de extremos calamidade natural, nenhuma autoridade jamais pretendeu, nos sistemas democráticos, uma aceitação indiscutida tão rigorosa de regras tão duras que, no entanto, não asseguram nenhuma certeza, só uma chance. Exigem, mas não prometem.
"Talvez" já é um artigo de fé. Vou tentar ser mais preciso. Tudo sobre o que estou falando não é capitalismo. Do capitalismo, existem, e são repetidas, regras e comportamentos que constituíam boa parte daquele projeto de construção social baseada, como se gosta de dizer, sobre o mérito, e fundamentada, na vida real, em ocasiões, bem aproveitadas e bem usadas, de privilégio. Não estou falando – vocês o veem – de corrupção. Porque os corruptos nunca estão entre os incrédulos, não se contrapõem jamais a um sistema religioso. A corrupção – assim como Martinho Lutero tinha visto há muito tempo para o catolicismo – se esconde nas melhores práticas de fé. E, portanto, à espera de uma "reforma", suspendemos o discurso sobre corrupção.
Preciso dizer que a estranha e mística aventura que estamos vivendo não é um retorno ou uma vingança do capitalismo. O capitalismo é frio e pragmático, e não perde tempo com as suas vítimas. Aplaina onde deve construir e constrói, se deve, mesmo que tiver que murar a sua janela. Além disso, o capitalismo não tem preocupações que não sejam "de negócios", não se volta para atrás, dialoga só com sócios e parceiros.
Aqui, estamos em um templo. As lágrimas não são ficção, a preocupação, mesmo que grave, não é uma encenação, a palavra deve ser ouvida não por submissão à autoridade, mas sim porque, nela, quem participa do novo rito reconhece a verdade. Dessa verdade, não há como escapar, porque é a única possibilidade de salvação. Ela não fornece todos os dados do "como" se chegará à salvação, mas uma coisa é certa: este é o único caminho.
Uma religião prevalece quando até mesmo os incrédulos gravitam em torno dela, no sentido de que discutem, mesmo que ferozmente, mas voltados para o altar, ou seja, o ponto sagrado e ardente do templo, aquele em que deve ocorrer o milagre. A maioria não está dizendo que o caminho é outro. A maioria está invocando uma mudança, uma atenuação ou um deferimento de regras para mim, ou para você ou para eles. Em inglês, a palavra é advocacy. Significa que a nova fé é mais forte do que os incrédulos e os está levando, com todas as diferenças e as heresias, para um único ponto ardente? Certamente, ela demonstra que não estamos falando de vingança e de retorno do capitalismo puro, que jamais se propôs como salvação, mas sim como uma expressão técnica e econômica natural da democracia liberal. E não estamos falando de uma disputa entre direita e esquerda, entre conservadores e liberais.
Não, senhores, aqui há fé, e, portanto, vida, morte, salvação ou condenação (na forma da exclusão), saída ou precipício (o abismo é continuamente invocado, e o abismo também não é uma figura do capitalismo, senão como falência de uma empresa e dano grave para alguns, quase sempre em benefício de alguns outros). O caminho da salvação, ao contrário, você o toma por fé, não porque lhe fornecem provas.
Sendo sinceros, não estamos certos nem do pecado original que nos trouxe tão perto da perdição. Todo país tem o seu, na Europa. Mas a paixão religiosa se estende para a América, onde o candidato republicano (um deles, Romney, mas em nome de todos) declara: "Nem um dólar para salvar a Europa". O que quer dizer: jamais financiar o pecado.
Tudo isso leva a não perceber que – justamente nos Estados Unidos – uma sólida e perigosa congregação de ateus, liderada por prêmios Nobel de Economia – Krugman, Stiglitz e Amartya Sen – defende que a nova Igreja se baseia no erro. Às devidas condições e com as devidas regras, é preciso gastar para se salvar, não economizar. E começar salvando os pobres (muitos) e dar novamente esperança aos quase pobres (muitíssimos).
Tal heresia é tolerável? É tolerável se for isolada em um gueto universitário-jornalístico, distante dos governos. Os governos cortam, na Europa e na América, para não serem excluídos do templo. Portanto, a decisão é terrível e simples: abraçar ou não a fé. Ainda mais que se difunde a inquietante sensação de que, fora do templo, e acima, e longe, habita um deus poderoso que ainda não revelou o seu rosto.
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Teologia da crise - Instituto Humanitas Unisinos - IHU