28 Mai 2014
Acompanhada pela comunidade monástica de Bose, a histórica visita de Francisco à Terra Santa, tão repleta de gestos concretos e simbólicos, despertou esperança e alegria. O prior, Enzo Bianchi, nos fala sobre os momentos a seu ver mais significativos.
A reportagem é de Paolo Lambruschi, publicada no jornal Avvenire, 27-05-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
O papa convidou israelenses e palestinos a Roma para finalmente fazer as pazes. O que o senhor acha?
Isso mostra bem quais são o pensamento e o coração do Papa Francisco. Ele quer a paz, mas não se coloca como um líder político. Ao contrário, chama Israel e os palestinos para rezar com ele no Vaticano, reconhecendo que todos somos filhos de Abraão, mas que, em um caso como o que está em curso na Terra Santa – em que só se pode proceder a uma reconciliação e a um perdão recíproco – o único caminho é começar a invocar o Senhor e a rezar juntos. A paz não passa apenas pelas negociações. Pareceu-me o gesto mais criativo mostrado nessa viagem pelo papa, um gesto profético altíssimo.
Falando aos muçulmanos na Esplanada das Mesquitas, o papa disse que não devemos mais usar o nome de Deus para combater...
Ele lembrou que todas as imagens dadas a Deus através da violência são perversas e idolátricas. Ele disse isso na Esplanada do Templo justamente movido pela convicção – sem entrar em questões políticas – de que a violência de todas as partes deve cessar. Porque, em nome de Deus, se combate em todas as partes. Não podemos culpar apenas o terrorismo islâmico, por exemplo, quando há violência até mesmo por parte de alguns judeus ortodoxos. Dizendo "chega" à violência e à instrumentalização do nome de Deus para justificá-la, Francisco reiterou que a única via a ser percorrida é a do perdão.
A seu ver, o apelo aos israelenses para proteger os lugares santos é um passo rumo à reconciliação?
Sim, é importante porque envolve a custódia de um patrimônio que, em medidas diferentes, pertence a todas as três religiões dos filhos de Abraão. Todos temos um dever de proteção em relação àquela terra e ao outro. E, no fim, também protegemos a nós mesmos.
Que significado têm as palavras sobre a Shoá proferidas no Yad Vashem?
Foi um momento extraordinário. Com aquele estilo que já aprendemos a conhecer, o papa deu uma lição a todos, dizendo para deixar de se perguntar onde Deus estava durante o Holocausto. Ao contrário, devemos nos perguntar com clareza onde estava o homem. Nessa meditação-oração, Francisco pergunta: onde estás, homem, onde acabaste? E, para responder àqueles que perguntam onde Deus estava naqueles momentos terríveis, ele usou as palavras do profeta Baruc: "A nós, humanidade, a vergonha, a Deus, a justiça". Ele se referia a todas as tragédias do homem contemporâneo.
Que outras coisas farão com que essa viagem passe para a história?
O encontro, também esse muito importante, com o patriarca Bartolomeu, em que Francisco não só confirmou o passado, mas retomou de maneira pública – e é a primeira vez que isso acontece – aquilo que João Paulo II dissera em 1994 na encíclica Ut unum sint. Ou seja, a disponibilidade de de rediscutir a forma de exercício do papado. E retomou como compromisso verdadeiro diante dos ortodoxos. Eu acredito que vem da Terra Santa um novo sopro para o ecumenismo.
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Francisco na Terra Santa: ''Gesto profético, para além das negociações''. Entrevista com Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU