29 Abril 2015
O papel e a plena igualdade das mulheres na vida da Igreja bem como a sua governança foram os dois principais assuntos discutidos no encontro internacional de associações sacerdotais e grupos reformistas de leigos entre os dias 13 e 17 de abril, em Limerick, na Irlanda.
A reportagem é de Sarah McDonald, publicada pelo National Catholic Reporter, 27-04-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Em um comunicado divulgado no final do encontro de quatro dias, os 38 delegados de 10 países, que buscam estabelecer uma “rede de redes” internacional para desenvolver estratégias visando a reforma da Igreja, disseram: “A eleição do Papa Francisco deu início a uma nova era no catolicismo”.
Falando em nome dos participantes, o padre redentorista irlandês censurado Tony Flannery, da Associação Irlandesa de Sacerdotes Católicos, declarou: “Com a renúncia do Papa Bento, estamos no fim de uma era, e esta é a nossa melhor oportunidade para renovarmos a Igreja”.
Segundo Deborah Rose-Milavec, diretora-executiva do grupo reformista norte-americano FutureChurch, ficou claro, durante uma discussão muito aberta e honesta entre os participantes dos EUA, da Irlanda, do Reino Unido, da Austrália, Índia, Alemanha, Eslováquia, Áustria, Suíça e outros, que há muita dor por causa da exclusão das mulheres na governança da Igreja, nos postos de liderança e no ministério ordenado.
Apesar disso, a mãe de seis e avó de 11 disse que o grupo focou a atenção em como apresentar o papel das mulheres na Igreja. “Pensamos que existem muitas maneiras de como o papel feminino pode ser melhorado dentro da Igreja sem considerar a questão da ordenação”, disse Rose-Milavec ao delinear uma ideia que, segundo o grupo, é “viável”.
“O papa disse que precisamos de uma presença feminina mais incisiva na Igreja bem como de uma nova teologia das mulheres”, declarou. “Uma sugestão que estamos apresentando é a criação de um conselho para as mulheres, como a Comissão para a Tutela dos Menores e o Conselho dos Cardeais, que iria assessorá-lo e se tornar um mecanismo para o lançamento de algo como uma política de gênero dentro do Vaticano e na Igreja”.
Esta política de gênero poderá se basear na política adotada pela Igreja na Índia, a qual, segundo a participante leiga na conferência Astrid Lobo Gajiwala, foi fundamental para os bispos indianos no desenvolvimento de suas próprias linhas de ação.
Rose-Milavec está mais esperançosa agora, sob a liderança do Papa Francisco.
“Há um novo espaço aberto. Até certo ponto, este sistema de silenciamento está sendo desfeito”, disse. “O papa está chamando as pessoas para o diálogo. Se tivermos este tipo de abertura, poderemos trazer novos elementos”.
No entanto, o tema candente no encontro era a proibição da Igreja da ordenação feminina ao sacerdócio. No terceiro dia de encontro, um grupo de participantes mulheres, incluindo Kate McElwee (da Conferência de Ordenação das Mulheres), abordou o Pe. Flannery com a ideia de que uma delas poderia copresidir, ao lado de um dos padres, a Eucaristia conjunta.
“Nós pensamos: A Eucaristia, sinal e símbolo de nossa unidade na Igreja, deveria refletir o nosso trabalho comum aqui, em Limerick, como iguais que trabalham pela mudança”, disse Rose-Milavec.
Ao escrever em seu blog após o encontro, Flannery afirmou: “Criou-se uma grande quantidade de dilemas para a maioria de nós... Houve muitas mágoas, tristeza e lágrimas, com muitas pessoas claramente lutando contra a própria consciência”.
No final, o grupo decidiu não celebrar a Eucaristia em conjunto, mas realizar uma oração apenas.
Um outro assunto importante em pauta no encontro na Irlanda era a governança da Igreja e de como descentralizar a autoridade vaticana, fortalecendo a autoridade das conferências episcopais e das paróquias.
O Pe. Helmut Schüller, fundador da Iniciativa dos Párocos Austríacos, disse que a Igreja deve se decentralizar mais porque a “sabedoria e a experiência dos fiéis, na base da Igreja, não está chegando à parte de cima”.
Lembrando a disposição do Papa Francisco em adotar uma nova cultura de consultas e responsabilidades compartilhadas através do Conselho dos Cardeais, a abertura que ele construiu no último Sínodo dos Bispos sobre a família, Schüller disse que a Igreja deveria estar buscando incorporar esta nova cultura de maneira mais profunda, para que a “termine marginalização das pessoas” e que as comunidades, na base da Igreja, tenham mais possibilidades.
O sacerdote austríaco, que coordenou a iniciativa “Call to Desobedience” [chamado à desobediência], reconheceu que alguns bispos podem ficar intimidados com a oposição expressa ao Papa Francisco por parte de alguns outros, tais como o Cardeal Raymond Burke, americano que vem sendo um crítico feroz de alguns elementos levantados antes e durante o Sínodo de 2014, especialmente aqueles sobre a admissão à Comunhão dos católicos divorciados e recasados.
Perguntado se esta oposição conservadora poderia intimidar Francisco a ponto de minimizar esta sua agenda, Schüller: “Isto pode acontecer, mas aqueles que tentam agir assim devem ter em mente que a grande maioria dos católicos, em todo o mundo, ficará decepcionada e frustrada. Isso iria produzir uma atmosfera que a Igreja não quer ter”.
Schüller disse esperar que o apoio de outros bispos ao Papa Francisco possa se tornar mais forte e claro de forma que este “grupo neoconservador” veja que eles não são fortes o bastante para deter o processo de reforma.
O Pe. Brendan Hoban, da Associação de Sacerdotes Católicos da Irlanda, disse que está havendo uma mudança na Igreja, e que há chances, agora, que não existiam desde o Concílio Vaticano II.
“As reformas imaginadas pelo Vaticano II estão agora na pauta da Igreja novamente”, disse ele. “Há grandes possibilidades, hoje, em termos de futuro. Mas os padres, as pessoas e, em particular, os bispos têm de seguir os passos do Papa Francisco, levando estas reformas adiante. Perdemos meio século”.
Os delegados também pediram a participação, no próximo Sínodo dos Bispos sobre a família, em outubro, de católicos que se divorciaram e casaram novamente, de membros de famílias inter-religiosas, pessoas LGBTs e marginalizadas da vida da Igreja.
“A maioria dos católicos acredita que o próprio processo sinodal é um tanto falho – ele está tomando decisões sobre as famílias sem elas estarem sendo ouvidas ou tendo direito ao voto”, falou Rose-Milavec.
Rose-Milavec disse que os movimentos reformistas querem ver mais mulheres e outros fiéis católicos convidados para o Sínodo.
“Como é possível ter um Sínodo e falar sobre criar uma forma mais pastoral de ser Igreja sem as pessoas que passaram pela experiência de se divorciar e casar novamente, ou sem as pessoas da comunidade LGBT, ou mesmo das comunidades de mulheres empobrecidas?”, perguntou-se Rose-Milavec.
Num fórum público, no último dia do encontro, o escritor e ex-reitor de seminário o Pe. Donald Cozzens disse que o motivo pelo qual renovar e reformar é tão importante para a Igreja é que há muitíssimas pessoas sofrendo e que estão, ao mesmo tempo, “famintas espiritualmente”. Cozzens disse acreditar que a Igreja precisa “falar uma linguagem de esperança e luz à nossa época secular”.
A chave para a evangelização, disse ele, é “uma Igreja mais sadia, moral e pastoral”, na qual todos somos chamados a serem missionários e reformadores, trabalhando para uma Igreja mais aberta, transparente e cheia de vida, que estende a mão aos “católicos sem rumo, desanimados, confusos, feridos e famintos”.
Paul Collins, da organização Catholics for Ministry, da Austrália, disse que, embora Francisco tenha melhorado o ambiente na Igreja, o problema é que esta se tornou demais “papacêntrica”.
“Perdemos o sentido de que somos a Igreja”, disse. “A verdadeira tarefa reside no nível local, na base. O nosso foco precisa mudar em direção ao local. Devemos nos tornar uma [Igreja] local, que olha para fora e que se envolve no mundo, cuidando dos problemas – e que não fique olhando para si própria”.
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Leigos e leigas discutem igualdade de gênero, governança da Igreja em encontro internacional - Instituto Humanitas Unisinos - IHU