02 Março 2015
Contra um contexto de controvérsias relativo à sua campanha de limpeza nas finanças vaticanas, o cardeal australiano George Pell deu continuidade aos trabalhos nesta semana publicando o primeiro conjunto de “procedimentos” do Vaticano para finalizar os relatórios financeiros de 2014.
Organizados pela Secretaria para a Economia, em colaboração com um auditor independente, os procedimentos exigem que todos os chefes dos dicastérios vaticanos se certifiquem, por escrito, de que estejam fornecendo informações completas e precisas.
A reportagem é de Inés San Martín, publicada por Crux, 27-02-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Os procedimentos foram publicados pela Secretaria para a Economia na segunda-feira passada e apareceram em um “Boletim Informativo” divulgado pela mesma secretaria na quarta-feira.
Projetados para “assegurar uma transição suave a partir das políticas contábeis anteriores”, estes procedimentos incluem a confirmação, por bancos externos e instituições financeiras, do dinheiro mantido pelos departamentos vaticanos individualmente.
Uma vez apresentados ao escritório do cardeal, os relatórios de cada um destes departamentos vão ser avaliados e revisados. Segundo o boletim, em seguida eles serão submetidos ao Conselho para a Economia para vistoria e, por fim, apresentados ao Papa Francisco.
A ideia é publicar uma declaração financeira consolidada de 2014 a qual, pela primeira vez, vai fornecer uma imagem abrangente da situação financeira do Vaticano no final do ano.
A novidade vem num momento em que Pell e o novo sistema de supervisão financeira que ele representa parecem estar gerando uma resistência cada vez maior dentro do Vaticano.
Em sua edição de sexta-feira, a revista italiana L’Espresso publicou recibos vazados de dentro da Secretaria para a Economia mostrando que ela gastou de mais de meio milhão de dólares em despesas durante os seus seis primeiros meses, incluindo uma conta de mais de 3 mil dólares firmada junto a um famoso alfaiate clerical romano.
Os críticos têm acusado Pell de acumular um poder excessivo e de replicar exatamente o mesmo favoritismo e sigilo que, em princípio, queria desfazer. O esforço em desacreditá-lo pode, hoje, estar relacionado com o fato de que o Papa Francisco está prestes a aprovar um novo quadro jurídico para os órgãos de supervisão financeira, o que os analistas veem como um teste decisivo sobre se o papa tem mais fé em Pell ou em seus críticos.
Na sexta-feira, o Vaticano publicou um comunicado chamando o vazamento de informações confidenciais de “ilegal” e também descrevendo os ataques contra Pell como “indignos e mesquinhos”. Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, disse que o trabalho de reforma sob o comando de Pell está procedendo com “continuidade e eficácia”.
A Secretaria para a Economia foi criada pelo Papa Francisco em fevereiro de 2014 e se reporta ao Conselho para a Economia, organismo composto por 15 membros estabelecido para supervisionar as atividades econômicas e administrativas dos vários departamentos vaticanos.
O Cardeal Daniel DiNardo, arcebispo de Galveston-Houston, no Texas, e membro do Conselho, é o único americano deste organismo.
As diretrizes divulgadas na segunda-feira vieram enquanto Pell, ex-arcebispo de Sydney e prelado nomeado por Francisco para liderar a reforma financeira como chefe da Secretaria, estava participando de um retiro quaresmal anual junto do pontífice e dos principais assessores papais, que terminou na sexta-feira.
Tais diretrizes baseiam-se num manual de gestão financeira publicado pela Secretaria para a Economia em novembro passado, em vigor desde 1 de janeiro. O manual foi aprovado in forma specifica pelo papa no dia 24 de outubro, o que quer dizer que tem a sua benção pessoal.
Esse manual foi concebido para ajudar a pôr o Vaticano em conformidade com padrões internacionais de contabilidade e gestão do dinheiro. Entre outras coisas, ele dita que cada departamento deve ter um orçamento anual, com um retrato confiável de seus ativos e despesas.
O manual também promete que a declaração financeira anual consolidada do Vaticano vai ser revisada por uma importante empresa de auditoria internacional.
Quando foi trazido de Sydney para o Vaticano no ano passado, Pell afirmou que o seu objetivo era economizar “milhões, se não dezenas de milhões” de dólares por ano, implementando medidas contábeis racionais, transformando o Vaticano, para usar suas palavras, “em um bom modelo” (e não “uma fonte de embaraços”).
As declarações financeiras finais devem incluir U$ 1.5 bilhão de ativos não contabilizados anteriormente e que foram informados à Secretaria durante os trabalhos no ano de 2014 e que foram revelados, pelo próprio Pell, aos cardeais de todo o mundo numa reunião em Roma, em meados de fevereiro deste ano, no encontro anual do Colégio Cardinalício.
Em entrevista ao Crux em 13 de fevereiro de 2014, o prelado australiano ressaltou que as discrepâncias não resultavam de atividades ilegais, mas sim de uma sistema excessivamente compartimentalizado e pesado que permitia que quantidades significativas de ativos passassem despercebidas.
“O que temos de fazer é pôr em prática estruturas de tal forma que o Vaticano se torne um modelo para os demais e não um escândalo”, disse Pell. “Devemos tornar extremamente difícil a volta ao desperdício e à ineficiência, bem como tomar medidas contra a corrupção”.
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Cardeal Pell pressiona por limpeza financeira do Vaticano apesar da resistência - Instituto Humanitas Unisinos - IHU