O direito humano de migrar deve ser um direito, não uma concessão que o Estado dá ao sujeito, defende a pesquisadora
A temática da inclusão, especialmente quando se trata de pessoas em condições de refúgio ou migração, ainda "é um dos maiores desafios de direitos humanos na atualidade", disse Giuliana Redin, coordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, na conferência virtual intitulada "À Deriva: O sujeito migrante internacional à luz da psicologia social", ministrada no Instituto Humanitas Unisinos - IHU na última quinta-feira, 02-12-2021. Segundo ela, entre os desafios para tratar do tema, "está o de pensar respostas jurídicas e políticas e entender a questão da subjetividade nesse processo de mobilidade internacional".
Na conferência que reproduzimos a seguir no formato de entrevista, Giuliana chama a atenção para a xenofobia, a desconfiança e o temor que estão envolvidos tanto nas relações entre migrantes e o Estado quanto entre os migrantes e a população dos países que os acolhem. "A legislação brasileira de cotas, da época de [Getúlio] Vargas, restringia o ingresso de imigrantes para promover certas raças como privilegiadas dentro do nacionalismo brasileiro. Hoje, temos outros mecanismos na legislação brasileira que, mais ou menos explicitamente, também selecionam a migração. Alguns migrantes têm um trânsito muito mais facilitado do que outros a partir da estrangeiridade que carregam", informa.
Mais avançada, a legislação brasileira sobre migrações, de 2017, compreende o migrante como um sujeito portador de direitos, mas ainda não foi suficiente para romper as barreiras psicossociais que fazem muitos olharem para os estrangeiros com medo e desconfiança. "No Brasil, avançamos nessa questão por causa da luta da sociedade civil. Em 2017, conseguimos estabelecer um grande marco, que foi a lei de migração, sancionada naquele ano, a qual em seguida entrou em vigor. Ela reconhece claramente o migrante como sujeito de direitos. (...) Mas a ideia de exclusão do estrangeiro e do migrante é tão presente na engrenagem psicossocial que alguns pontos da legislação ainda não foram superados. O visto e a residência do migrante, que é a possiblidade de ingressar e permanecer no país, ainda são condicionados a uma mera expectativa, porque esses pontos foram remetidos a uma política de governo, que vai gerir a migração; isso está diretamente ligado à securitização. Se avançamos na discussão do direito humano de migrar como um direito, temos que entender que a mobilidade também deve ser assegurada como tal", afirma.
Giuliana Redin (Foto: Reprodução | Youtube)
Giuliana Redin é doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR, mestre em Desenvolvimento, Gestão e Cidadania pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e em Direito pela Universidade Luterana do Brasil. Leciona no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito e no Departamento de Direito da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM.
IHU – Quais são os principais desafios para enfrentar o problema da migração a partir dos direitos humanos?
Giuliana Redin - A temática da inclusão é um dos maiores desafios de direitos humanos na atualidade, especialmente quando se trata da situação dos migrantes e dos refugiados. Entre os desafios está o de pensar respostas jurídicas e políticas e entender a questão da subjetividade nesse processo de mobilidade internacional.
A migração internacional e a ideia de xenofobia são constitutivas do Estado-nação a partir da ideia de ordem, lugar, proteção e amparo. Quando falamos de Estado-nação, nos remetemos a uma concepção ligada à ideia da xenofobia. Por isso é tão desafiador pensar o lugar do migrante e do refugiado dentro da ordem política e jurídica do Estado e, consequentemente, dentro da sociedade de acolhida.
A xenofobia é constitutiva de nós mesmos enquanto sujeitos e nos permite a possibilidade de refletir sobre as relações de exclusão e negação do outro. Quando o tema é o estrangeiro, o imigrante, o que não está aqui, isso se torna mais visível, porque a presença dele mostra aquilo que é abjeto em nós, aquilo que não queremos sentir: o medo, a falta, o sentimento do que se desconhece, do que não se sabe. Nesse sentido, a migração nos mostra muito de nós mesmos como sujeitos e nos ajuda a pensar a questão do migrante em uma engrenagem psicossocial em duas dimensões de entendimento sobre o lugar do sujeito. Primeiro, o sujeito a partir de uma ordem, ou seja, a relação dele com o Estado de acolhida. Segundo, o sujeito que passa por um processo de mobilidade, alguém que é 'descolocado', desenraizado e, portanto, precisa constituir-se, identificar-se, sentir-se em outro lugar. A questão da migração também convida a pensar o delicado e perigoso território do não pertencer.
IHU – Como os Estados-nação têm enfrentado e abordado o problema das migrações?
Giuliana Redin - Abdelmalek Sayad é um grande clássico e pensador das migrações. Ele introduz a temática do lugar do sujeito a partir de outra ordem do Estado. Ele questiona, primeiramente, o que é o migrante. Ele não pergunta quem é o migrante, mas o que ele é, ou seja, ressalta a permanente provisoriedade reservada a ele na ordem e o quanto é duro pensá-la a partir de um Estado de direito que cria artifícios e esquemas de exclusão do migrante ou o sustenta sempre nesse lugar provisório. Nessa ordem e organização social e política de entendimento sobre a relação com o outro, o estrangeiro é convidado a chegar [em um território], mas também é convidado a se retirar. Ou seja, o migrante é alguém que, para o Estado, está sempre em uma relação de hospitalidade condicionada.
[Jacques] Derrida desenvolve essas ideias e nos convida a pensar por que a ordem é tão incompatível com uma noção de hospitalidade absoluta. O estrangeiro é alguém que não reconhece a ordem por identificação, ou seja, ele está fora dela. Quando ele está fora do pacto e não é alguém nominável na própria ordem, ele é considerado um anti-Estado, ou seja, alguém que ameaça a organização das instituições em um plano psicossocial de estruturação da ideia de ordem, de direito. A migração traz consigo esse trauma constitutivo e a exclusão originária.
Sayad diz que o migrante faz pensar o impensável, o arbítrio do Estado-nação, a capacidade de uma ordem instituir a exclusão. A migração mostra exatamente isto: a exclusão do estrangeiro é tão constitutiva da identidade nacional como é da própria subjetividade humana. Nesse campo de percepção, [Costas] Douzinas aborda a relação de exclusão do imigrante a partir da ideia de identicidade nacional. O migrante, para suportar essa permanente provisoriedade, também se convence de que a sua situação é provisória. Trata-se de uma relação paradoxal de alguém que está e ao mesmo tempo não está em algum lugar e precisa se convencer dessa realidade de provisoriedade. Esses temas estão imbricados na agenda da migração.
A noção de estrangeiridade nos faz perceber o que se constitui por identidade e identidade nacional. Quando pensamos em estruturas nacionais como a brasileira – que é uma sociedade estruturada pelo racismo e pela divisão de classes –, percebemos que esses dois pontos [racismo e divisão de classes] estão muito presentes na identificação nacional e nas concepções de Estado e de ordem, mas também estão presentes no tema das migrações. Essas questões [racismo e divisão de classe] são introduzidas dentro do escopo normativo quando pensamos as migrações desejáveis e as indesejáveis. A agenda histórica das migrações é atravessada por questões de raça, de classe e pelo entendimento de que a condição de nacionalidade é o atributo para um lugar de acesso a direitos fundamentais, por exemplo.
IHU – Como a migração é tratada no Brasil a partir da legislação?
Giuliana Redin - A legislação brasileira de cotas, da época de [Getúlio] Vargas, restringia o ingresso de migrantes para promover certas raças como privilegiadas dentro do nacionalismo brasileiro. Hoje, temos outros mecanismos na legislação brasileira que, mais ou menos explicitamente, também selecionam a migração. Alguns migrantes têm um trânsito muito mais facilitado do que outros a partir da estrangeiridade que carregam.
Antes da legislação brasileira de 2017, o estatuto do estrangeiro, que é da década de 1980, sequer reconhecia o migrante como um sujeito de direitos. Ele era altamente xenófobo: dizia que a nossa política migratória estava associada à reciprocidade, aos interesses nacionais e à segurança nacional. Ou seja, o conteúdo da lei e a condição do migrante ou do estrangeiro eram reduzidos à agenda de securitização. A legislação brasileira de migração baseada em direitos humanos é de 2017, e inverte a lógica do lugar do estrangeiro na ordem. Ela trata o migrante como sujeito de direitos.
À Deriva: O sujeito migrante internacional à luz da psicologia social:
IHU – Quais são os discursos que dificultam a migração? Como essa realidade se manifesta no país?
Giuliana Redin – O migrante carrega a estrangeiridade, é classificado dentro de uma ordem social e estereotipado por tudo que carrega. Vemos isso no discurso de que o migrante vai tomar o emprego [das pessoas que residem no país]. Aí tem o elemento de classe, o discurso do imigrante que é uma ameaça à segurança do Estado. Esses discursos também estão vinculados à questão racial, ao migrante que vem do Sul global e que representa muito mais uma ameaça do que aquele que vem do Norte, para contribuir com o país. Esses estereótipos estão alicerçados na constituição psicossocial das subjetividades, ou seja, aquela referência ao que se quer ser.
Por isso é tão difícil avançar na agenda de reconhecimento dos migrantes como sujeitos de direitos, apesar de termos avançado muito no diálogo internacional. Evidentemente, a Segunda Guerra Mundial trouxe a dimensão do refúgio internacional em 1951, com a Convenção Internacional dos Refugiados, ou seja, o compromisso de o Estado-nação receber pessoas vítimas da violência ou da violação forçada. Todo caso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que é a grande referência do regime internacional de um consenso mínimo civilizatório, nega o direito humano de migrar internacionalmente à medida que diz, claramente, que a migração é um direito humano dentro da fronteira. A fronteira é algo que não se transpõe dentro da ideia de ordem. A fronteira física também é simbólica: é a fronteira que autoriza a exclusão, a negação do outro. Nesse ponto, é muito difícil avançar. Toda a agenda relativa às migrações tende a ser colocada dentro das políticas de Estado dos países. Então, a depender do avanço de cada sociedade, temos também o avanço no reconhecimento ou na negação do migrante, a partir da sua condição humana. Além disso, a ordem demanda a possibilidade de reconhecimento condicionada a outras instâncias condicionantes. A ideia do imigrante como ameaça é algo tão estrutural no entendimento do nacional com o não nacional, que cria uma fronteira demarcada. Para que o imigrante possa migrar para além da fronteira, ele tem que ter a sua presença justificada. Isso é o que está dentro da ordem jurídica hoje.
No Brasil, avançamos nessa questão por causa da luta da sociedade civil. Em 2017, conseguimos estabelecer um grande marco, que foi a lei de migração, sancionada naquele ano, a qual em seguida entrou em vigor. Ela reconhece claramente o migrante como sujeito de direitos. A lei apresenta uma série de princípios fundamentais ligada à questão migratória, dirigida ao migrante como sujeito de direito e direitos fundamentais, que enaltece a igualdade entre a população nacional e os migrantes.
Mas a ideia de exclusão do estrangeiro e do migrante é tão presente na engrenagem psicossocial que alguns pontos da legislação ainda não foram superados. O visto e a residência do migrante, que é a possibilidade de ingressar e permanecer no país, ainda são condicionados a uma mera expectativa, porque esses pontos foram remetidos a uma política de governo, que vai gerir a migração; isso está diretamente ligado à securitização. Se avançamos na discussão do direito humano de migrar como um direito, temos que entender que a mobilidade também deve ser assegurada como tal.
Ao mesmo tempo em que temos princípios ligados à migração, como o princípio de regularização documental, não criminalização das migrações e igualdade de oportunidades, foram mantidos os institutos de deportação. Isso significa que ainda se mantém a possibilidade de o hóspede condicionado ser convidado a se retirar do território nacional. Ou seja, não estamos falando de um direito humano de migrar, mas de uma concessão que o Estado dá ao sujeito, a qual pode transitar muito ao sabor do momento histórico.
Em momentos de retrocesso no entendimento civilizatório dos consensos mínimos, como o que vivemos hoje, essa legislação se aproxima muito mais de um modelo securitizador. O que quero dizer com isso? Vou usar um exemplo prático para mostrar o momento delicado em que estamos. As crises econômicas e o medo do desamparo geram discursos que elegem inimigos: aqueles que vão ameaçar o lugar são facilmente constituídos, assim como são eleitos os bodes expiatórios, aqueles que serão responsabilizados pela ameaça do lugar ou do amparo.
IHU – Como as migrações foram tratadas no país durante a pandemia de Covid-19?
Giuliana Redin – A política de Estado brasileira para migrações foi negada com o fechamento das fronteiras aos mais vulneráveis no último ano e meio. Sobretudo o fechamento da fronteira em Pacaraima, em Roraima, de onde migram venezuelanos para o Brasil de forma massiva e generalizada. Eles tiveram sua entrada barrada no território nacional por portarias interministeriais que foram sendo reeditadas sucessivamente ao longo de mais de um ano desde o início da pandemia. Foi dito que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa orientou o fechamento da fronteira, mas não havia indicativo de que aquela fronteira estivesse diretamente ligada à questão da segurança no momento da pandemia. De qualquer forma, a escolha de determinados grupos a serem excluídos dos processos migratórios nos remete muito à gestão necropolítica, ou seja, a política de deixar alguns grupos perecerem. Grupos já reconhecidos pelo Estado brasileiro ou na situação de refúgio ou na situação da acolhida humanitária – que são classificações que o Estado e a ordem colocam para receber o imigrante –, altamente vulneráveis pela condição migratória e cultural socioeconômica, especialmente crianças, mulheres e idosos, foram barrados.
Todo temos, como direito fundamental, o direito de solicitar refúgio. As portarias interministeriais inseriram a inabilitação para a solicitação de refúgio na política de Estado brasileira. Nesse período, também foi estabelecida a deportação sumária, que é um ponto no qual já avançamos – ainda temos o instituto da deportação atuante, mas com o devido processo legal. Também foi estabelecida a impossibilidade de regularização documental. Esses três itens, incluídos na política de fronteira aos mais vulneráveis, de forma alguma contiveram a migração, porque ela continuou por rotas inseguras e irregulares: migrantes transitavam a pé pela selva amazônica. Nesse sentido, o Brasil proporcionou esse flagelo através de uma política de governo.
Passamos a receber migrantes que não conseguiam se documentar, que precisavam se inserir no mercado de trabalho. Muitas empresas exigiram o registro migratório e começou a se estabelecer um clima de migração irregular, de criminalização da migração, um clima de deportabilidade. Tudo isso voltou novamente para o imaginário social e passamos a ver a sociedade civil recebendo migrantes a partir de uma relação de suspeita. Por parte do governo, não se conseguiu deixar claro que uma situação era a crise e a emergência sanitária e outra situação era a de que não se podia implementar um Estado de exceção que nega a política pública e o outro pela sua condição humana baseada em uma crise sanitária. Muito pelo contrário, o Estado deveria ter muito mais responsabilidade perante esses grupos em um momento pandêmico, mas a resposta foi exatamente outra.
Houve dificuldade de inserir as pessoas no mercado de trabalho, de os migrantes poderem acessar o sistema de saúde e escolas para seus filhos. Isso tudo mostra claramente a condição da hospitalidade condicional. Esse tema ficou muito presente na pandemia. Alguns movimentos e ações em instâncias iniciais conseguiram suspender os efeitos de atos governamentais violadores de direitos já assegurados em um contexto de pandemia, mas nos tribunais as ações foram revertidas. Então, houve uma dificuldade inclusive de criar consensos mais estabelecidos sobre direito e reconhecimento do outro na questão migratória.
É interessante fazer uma associação entre essa situação e a dos povos indígenas: os autóctones foram os primeiros estrangeiros nas suas próprias terras. O processo de colonização, de dominação, e de exclusão é muito presente no país desde o início da nossa história. Nesse sentido, algumas questões precisam ser descontruídas, como a ideia de o Brasil ser um país acolhedor, das migrações, especialmente quando entendemos os processos históricos de imposição de uma cultura, de uma identidade e de um entendimento único sobre o sujeito, aquele a ser espelhado, aquele a se desejar ser, em que o diferente deve ser exterminado ou assimilado.
No final do século XIX e início do XX, as migrações foram estimuladas e eram voltadas ao trabalho, migrações europeias voltadas ao acesso à terra, ligadas à noção de interesse nacional. A relação com o migrante é sempre uma relação que tem que ser justificada pela ideia de ordem e Estado. A questão é o quanto isso implica em vulnerabilização do sujeito: um sujeito que é provisório e só deixa de sê-lo se entrar dentro da ordem. Portanto, trata-se da negação da estrangeiridade.
IHU – Quais são os desafios para avançar em termos de uma legislação que considere o migrante um portador de direitos?
Giuliana Redin – Primeiro, é preciso entender as dificuldades que temos desde o ponto de vista de receber o migrante como um direito de ele cá estar. Nós não reconhecemos isso na política de Estado. Avançamos muito no reconhecimento de sujeitos de direitos, mas ainda temos uma legislação bastante atravessada por questões securitárias. Também não temos diretrizes nacionais de políticas públicas para migrantes, refugiados, apátridas, embora essa fosse uma previsão da lei de 2017. Sobre isso, temos construções locais da própria sociedade civil.
Temos que pensar que o migrante também tem protagonizado a sua própria agência de se colocar em um lugar de reconhecimento como sujeito. Isto é muito importante: pensar a agência, o quanto a organização entre os próprios migrantes e relações de identificação também potencializam a busca e a luta por um lugar permanente, de estabilização. É preciso considerar e analisar a migração, de outro lado, no campo da própria subjetividade, isto é, as implicações psíquicas de lidar com o deslocamento. Esse é outro lado de quem se sente estrangeiro, de quem se sente estranho em um lugar que busca como lugar de acolhida. Este é um desafio enorme: pensar as relações de pertencimento a partir de uma consciência de si, em que o migrante possa desenvolver a sua autonomia, se sentir acolhido, se sentir em um lugar de amparo – esse é o termo. O termo “deriva”, que está no título da conferência, simboliza essa fragilidade.
É claro que estar no novo e conhecer o novo pode ser algo fantástico do ponto de vista da consciência de si. Isso também traz a possibilidade de pensar sobre si mesmo. Essas são as questões que a migração traz. Quando pensamos na potência da organização dos migrantes, na agência deles e no trabalho social desenvolvido por eles na sociedade de acolhida, percebemos que tudo isso é muito potente na engrenagem psicossocial da exclusão. O migrante está nesse campo da relação frágil com o Estado, que lhe nega a possibilidade de ali estar, a menos que a sua presença seja justificada a partir da ordem, como uma presença condicionada a uma justificativa para ali estar. De outro lado, isso gera implicações na possibilidade de ele desenvolver sua autonomia, inserção e de se colocar dentro do espaço produtivo. Poderíamos citar inúmeras situações, desde o migrante que tem qualificação e, ao chegar no Brasil como país de acolhida, encontra dificuldades para revalidar um diploma, para reconhecer um título, para ter sua qualificação presente.
Podemos dizer que, para a sociedade de acolhida, a presença do migrante diz muito sobre si mesma. Nesse sentido, precisamos reduzir a vulnerabilidade e as desigualdades ligadas à questão migratória, que vão desde o atendimento mais simples de um migrante em um posto de saúde, até situações mais complexas. A migração desafia e convida à relação com o outro, ao encontro com a diferença. Podemos dizer que as sociedades avançadas na agenda de direitos humanos têm feito esforços nessa abertura ao diferente e à inclusão do outro.