17 Março 2013
“Apesar de não haver racionamento nas cidades, as unidades centrais de abastecimento d’água da região estão secas e sem possibilidade de sustentabilidade para o abastecimento futuro das populações do semiárido”, informa o integrante da Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA.
Confira a entrevista.
“A guerra pela água no sertão quase não existe mais, pois programas estruturantes resolveram consideravelmente essa questão, disseminando unidade de captação d’água”, diz Valber Matos à IHU On-Line em entrevista concedida por e-mail. Apesar de apontar medidas que descentralizaram o acesso à água na Paraíba, com o uso de cisternas, o integrante da Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA reitera que “é necessário entender que boa parte dessas unidades secaram e estão sujeitas a reabastecimento pelos caminhões-pipa e, em especial, pelo programa do governo federal chamado ‘Pipas’, que está sendo administrado pelo exército brasileiro”. Segundo ele, as políticas públicas “amenizaram a fome e a sede do povo”, mas ainda é necessário investir em “cisternas de placas, cisternas-calçadão, bombas populares, barragem subterrâneas, barragem de pedra sucessivas, tanques de pedra, barreiros, barramento trincheiras (implementações de pequeno porte que atendam às unidades familiares)”.
Na entrevista a seguir, Valber Matos também comenta a transposição do Rio São Francisco e é enfático: “Esse tipo de empreendimento atende apenas às demandas dos latifundiários (a margem dos rios) e às multinacionais que se instalam de forma a massacrar os pequenos que vivem à margem. Por sua vez, não atende à demanda hídrica difusa em nossos municípios, instalando a verdadeira indústria da seca, com direito aos desvios e descasos com os recursos públicos, como está sendo visto nos noticiários”.
Valber Matos é membro da Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais são os maiores problemas em relação à seca na Paraíba?
Valber Matos – Hoje, o maior problema é a falta de acesso à água potável em várias comunidades rurais e na zona urbana. Apesar de não haver racionamento nas cidades, as unidades centrais de abastecimento d’água da região estão secas e sem possibilidade de sustentabilidade para o abastecimento futuro das populações do semiárido. Há perda considerável das criações de animais, que chega a 75%, e perda das sementes da paixão, semeadas na tentativa de multiplicação e subsídio alimentar.
IHU On-Line – Ainda fala-se muito em “guerra pela água no Sertão”. Esse continua sendo um problema atual?
Valber Matos – A guerra pela água no sertão quase não existe mais, pois programas estruturantes resolveram consideravelmente essa questão disseminando unidades de captação d’água, a exemplo das cisternas de placas, das barragens sucessivas, entre outras implementações nas unidades familiares rurais. Essas medidas descentralizaram o acesso à água, diferenciando a prática de outrora, que priorizava a concentração de água em propriedades particulares dos oligárquicos e dos latifundiários. Porém, é necessário entender que boa parte dessas unidades secaram e estão sujeitas a reabastecimento pelos caminhões-pipa e, em especial, pelo programa do governo federal chamado “Pipas”, que está sendo administrado pelo exército.
IHU On-Line – Em que consistem as obras do Perímetro Irrigado das Várzeas de Sousa – Pivas? Os agricultores reclamam de falta de água por conta dessa obra. Qual a atual situação?
Valber Matos – O Pivas é uma unidade irrigada de 6.000 ha de terras agricultáveis administrada pelo governo estadual, distribuída da seguinte forma: 3 empresas; 146 famílias agricultoras (reordenação fundiária); 100 famílias assentadas (Incra); e parte da área é reserva legal (40%). As empresas praticam o agronegócio e das 146 famílias arrendadas pela reordenação fundiária, apenas quatro praticam agroecologia. A área da Reserva Legal foi invadida pelos coronéis da região (coronelismo existente ainda em nosso sertão), que a utilizam indevidamente com os animais de suas propriedades.
IHU On-Line – Há denúncias de irrigação irregular em Sousa, na Paraíba. Fala-se de 122 irregularidades. Pode nos explicar do que se trata especificamente essas irregularidades?
Valber Matos – As empresas adotam sistemas de irrigação autopropulsores que têm uma grande necessidade de carga potencial que succiona o sistema, deixando boa parte dele comprometido, haja vista que foi projetado para atender à demanda de desvio de utilidade da água, manejo inadequado, disperdícios d’água, entre outros problemas. Não podendo esquecer que o projeto original do Pivas foi atender à Fruticultura Orgânica ou Agroecológica.
IHU On-Line – Quais as implicações da transposição do rio São Francisco para a situação de seca do semiárido? Como a transposição atinge, especificamente, o estado da Paraíba?
Valber Matos – A transposição do rio São Francisco busca, segundo propaganda do Estado, manter abastecidas as principais bacias hidrográficas do semiárido, em especial as áreas que compõem o Polígono das Secas, com perspectiva de atender à demanda de perímetros irrigados. Em nossa concepção, esse tipo de empreendimento atende apenas às demandas dos latifundiários (a margem dos rios) e às multinacionais que se instalam de forma a massacrar os pequenos que vivem à margem. Por sua vez, não atende à demanda hídrica difusa em nossos municípios, instalando a verdadeira indústria da seca, com direito aos desvios e descasos com os recursos públicos, como está sendo visto nos noticiários.
IHU On-Line – Quais são as questões fundamentais que não estão sendo discutidas no que se refere ao combate da seca e à vida na região do semiárido brasileiro?
Valber Matos – A mudança de vida dos agricultores e agricultoras das regiões secas no tocante aos projetos de estruturação e programas de governo, que amenizaram a fome e a sede desses povo.
IHU On-Line – Que tecnologias de fornecimento hídrico para o consumo humano e produção agropecuária poderia ser pensada para a região?
Valber Matos – É preciso investir em cisternas de placas, cisternas-calçadão, bombas populares, barragem subterrâneas, barragem de pedra sucessiva, tanques de pedra, barreiros, barramento trincheiras (implementações de pequeno porte que atendam às unidades familiares).
IHU On-Line – Qual tem sido a postura do governo federal em relação à situação do semiárido brasileiro? Quais são as políticas públicas para o semiárido e suas implicações?
Valber Matos – Muito se avançou nas conquistas de luta, porém sempre travando as ações já conquistadas, a exemplo da criminalização das ONGs, que tanto têm colaborado com as ações sustentáveis em parceria com as políticas públicas.
Nota:
Foto 1: Portal Uol
Foto 2: Portal Arte Blog
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Semiárido: o desafio de atender às unidades familiares. Entrevista especial com Valber Matos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU