12 Janeiro 2021
O cinema do italiano Pier Paolo Pasolini e o do brasileiro Glauber Rocha são marcos, revelando duras críticas sociais sem nenhum anestésico hollywoodiano. É por isso que muitos têm se detido a análises das produções dos cineastas para compreender os dramas da sociedade em que estavam inseridos. No entanto, para o pesquisador Vladimir Santafé, a imagem que ambos constituem do pobre e da pobreza pode não só servir para compreender a crítica feita à época, como também pode servir de chave para que entendamos como o capitalismo se transforma e reconfigura a pobreza no século XXI. “Estudar a imagem da pobreza produzida pelo cinema de Glauber Rocha e Pier Paolo Pasolini é estudar as potencialidades da produção imaterial e, consequentemente, a maneira como essa produtividade é capturada pelo capitalismo e vivenciada pelos indivíduos e coletivos que a produzem”, detalha.
Segundo Santafé, “o novo capitalismo ampliou o tempo produtivo do indivíduo conectando os seus espaços através da temporalidade do virtual”. Assim, se o pobre foi sempre entendido como aquele à margem e o que não tem, agora também pode ser interpretado como aquele expropriado pelas novas formas de exploração. “O trabalho social abstrato nos serve para entender o conceito capitalista de valor; quando a fonte da riqueza encontra-se no trabalho capitalista, seu valor encontra-se, por conseguinte, no trabalho social”, acrescenta.
É nesse sentido que chega à concepção de que o trabalho extrapola as temporalidades e espaços e, hoje, se constitui como “contínuo e total”. “Os pobres, uma atualização da figura do proletário, são, por conseguinte, a figura paradigmática dessa produção imaterial de valor, pois mesmo excluídos ou distribuídos de forma desigual na repartição das riquezas, eles estão incluídos em todas as etapas dos circuitos econômicos e não precisam de nada mais que suas mentes para gerá-las”, acrescenta. Assim, vê nos cineastas caminhos para entender essas transformações, pois “onde Pasolini enxerga o genocídio cultural, Glauber enxerga conexões possíveis, da precariedade das relações uma nova arte emerge e reinventa o mundo”.
A entrevista foi concedida ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU no dia 16 de outubro de 2020. Então foi publicada uma síntese da entrevista. A íntegra é publicada agora na edição dos Cadernos IHU Ideias, número 310.
Imagem: Capa dos Cadernos IHU Ideias número 310, de Vladimir Lacerda Santafé.
Acesse aqui a entrevista completa.
Leia mais
- A imagem do pobre nos filmes de Pasolini e Glauber como chave para compreender a ação do capitalismo. Entrevista especial com Vladimir Santafé
- Capitalismo, stakeholders, fagocitose
- Cinco pontos para compreender o capitalismo digital chinês. Uma abordagem a partir do olhar de Jack Qiu
- Poderia o blockchain servir ao Pós-Capitalismo?
- Battaglia e a atenção aos últimos. "A estátua de ouro é o capitalismo selvagem"
- Outro mundo é possível? O anticapitalismo no século XXI
- Liberalismo e crise do capitalismo
- “O líquido amniótico do filantrocapitalismo é a desigualdade.” Entrevista com Nicoletta Dentico
- “O capitalismo cria necessidades artificiais para vender suas mercadorias”. Entrevista com Razmig Keucheyan
- Angela Davis flerta com o pós-capitalismo
- Capitalismo de vigilância. Artigo de Antônio Sales Rios Neto
- “Descobrimos, de alguma forma, o limite mais radical do capitalismo: a morte”. Entrevista com Santiago Alba Rico
- Fim do Auxílio Emergencial trará pobreza, desemprego e retorno do Brasil ao Mapa da Fome
- A pobreza é um mal quando não é um estilo de vida. Entrevista com Erio Castellucci
- Vacinas: os pobres serão excluídos em 2021
- IBGE: Brasil tem quase 52 milhões de pessoas na pobreza e 13 milhões na extrema pobreza
- O enigma? Os pobres. Artigo de Raniero La Valle
- Trabalhadores Pobres e Cidadania
- A alma da pobreza é política
- “A economia atual não salva ninguém, nem os próprios economistas e, menos ainda, os pobres”. Entrevista com Adolfo Zon
- Abdelaziz Hammaoui, Imam e o teólogo muçulmano: “Não é o pobre quem deve sentir vergonha”
- Oxfam: os pobres do mundo sofrem com as emissões de carbono geradas pelos ricos
- Mudança climática: outra luta entre ricos e pobres
- Ricos emitem o dobro de CO2 que a metade mais pobre da população, aponta estudo
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Pasolini e Glauber: a imagem do pobre e a ação do capitalismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU