16 Julho 2015
Morreu o frei Arturo Paoli, sacerdote nascido em Lucca, Itália, em 1912. "Pequeno Irmão do Evangelho", ele tinha sido nomeado "Justo entre as Nações" por ter salvo a vida de muitos judeus perseguidos pelo nazifascismo. Em 1954, ele foi afastado pela primeira vez da Itália e encarregado de ser capelão em um navio de emigrantes italianos na Argentina. Em 1960, deixou a Itália de forma quase definitiva (voltou apenas em 2005) e se estabeleceu na América do Sul: na Argentina, na Venezuela (onde participou dos movimentos nascidos da teologia da libertação) e no Brasil. Pôde-se se encontrar com Jorge Bergoglio, com quem estreitou uma sincera amizade. Em 2013, pela editora Chiarelettere, escreveu Cent’anni di fraternità [Cem anos de fraternidade], do qual publicamos um trecho.
O texto foi publicado no jornal Il Fatto Quotidiano, 14-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Que tristeza a sociedade humana do nosso tempo! Verdadeiramente, a terra do pôr do sol é a Europa, terra dominada pelo capital, isto é, pela morte. Tento me defender dessa época política tão triste, em nada motivada pela paixão da nossa afetividade, mas dedicada unicamente aos movimentos da economia.
Eu pertenço por nascimento a uma pequena cidade, tornada mais restrita por um círculo de muros que a envolve totalmente. O poeta Ungaretti a denominou de cidade do cerco arborizado. Isso dava a impressão de que os seus habitantes se sentissem uma comunidade, mas não era totalmente verdade. De fato, depois da última guerra, a comunidade da cidade se dispersou. Tendo retornado depois de mais de 40 anos de ausência, a comunidade se apresenta como uma unidade caída aos pedaços.
O calor das antigas amizades desapareceu, os partidos que constituíam a defesa de interesses comuns, assim como as estruturas políticas parecem derreter como neve ao sol. Vivemos em uma sociedade sem projetos, que muitas vezes parece muito confusa. Aqueles que se dizem cristãos parecem dar a prioridade somente para o valor do dinheiro.
Esqueceram-se da alternativa evangélica, ou Deus ou mamom. É impossível a conciliação. O individualismo se apresenta hoje como uma grande ameaça. Parece que a técnica e as suas criações têm um único objetivo: libertar a pessoa da necessidade dos outros. Parece afirmar-se o famoso lema de Sartre: les autres sont l'enfer, o inferno são os outros. Existe uma mais expressão mais anticristã do que esse objetivo tão aparentemente libertador do "faça você mesmo"? Eu sou defensor e seguidor do lema "ai do homem sozinho".
Em uma espécie de entrevista amigável, um jovem me perguntou: na sua longa vida, o que hoje mais atrai a sua atenção? A minha resposta vem muito rapidamente, porque está muito perto da porta do coração: a queda muito rápida da afetividade. O homem não tem o poder de cancelar a lei eterna da existência que é a lei do amor. O homem é um ser relacional. O ser humano verdadeiro é o homem para os outros. A relação autêntica é a voltada para o futuro.
Uma professora me contou ter pego um menino de seis anos em atos de violência. Por trás dessas coisas, há o medo da relação, que eu vejo como um dos males fundamentais do nosso tempo. O princípio fundamental que guia o progresso da tecnologia parece ser o de distanciar as relações pessoais. A amizade precisa de proximidade.
Não me convence a ideia de que essa busca de instrumentos e de progresso no individualismo favorece o crescimento do amor, que eu continuo pensando como a qualidade humana fundamental. Tudo o que acontece ao nosso redor parece não precisar do amor.
Um amigo me mostra um último produto da técnica, sabendo muito bem do meu antifetichismo. Chama-se iPad: basta o toque delicado de um dedo para ter sob os olhos a primeira página do seu jornal. Parece que, em breve, os jovens poderão realizar o seu sonho de ficar debaixo das cobertas, porque o professor de matemática poderá questioná-los na cama.
Quando eu penso nos métodos violentos da publicidade de hoje, eu acredito que possam levar à máxima alienação. As autoridades políticas não pensar minimamente nesse poder destrutivo. Pecunia non olet, dizia Vespasiano, o imperador que tinha decretado um imposto sobre as latrinas.
Hoje, trata-se da saúde psicofísica da juventude, do sexo traduzido em imagem, mas a condição psíquica dos jovens não interessa à classe dominante. Hoje, a necessidade mais urgente é a capacidade de estar juntos.
Vou conseguir persuadir os meus amigos jovens de que esse é o verdadeiro sentido da sua existência? Existir pode ser um peso inútil e vazio ou uma fonte de alegria, uma alegria desconhecida. Mas é preciso coragem, muita coragem.
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"Ai do homem sozinho." Artigo de Arturo Paoli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU