15 Julho 2015
Vai embora o último grande "profeta" italiano, frei Arturo Paoli. Ele completaria 103 anos no dia 30 de novembro. Ele faleceu na noite entre domingo e segunda-feira, na sua casa em San Martino in Vignale, nas colinas de Lucca, onde, nos últimos anos, recebia dezenas de jovens em busca de um conselho ou do sentido da vida. Que ele tinha encontrado caminhando com os indefesos.
A reportagem é de Ilaria Lonigro, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 13-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Primeiro na Itália, onde, muito jovem, salvou centenas de judeus durante a Segunda Guerra Mundial (e, de fato, era Justo entre as Nações), depois, na Sardenha, ao lado dos mineiros nos anos 1950, em seguida – "exilado" pelo Vaticano – nas favelas argentinas, até a condenação à morte pelo regime militar, que o levou a girar pela América do Sul até 2005, ano do retorno à Itália.
O Schindler de Lucca, Justo para Israel
Em 1937, entrou no seminário de Lucca, sua cidade natal. Seis anos depois, tornou-se a principal referência de Lucca da rede Delasem, a Delegação para a Assistência dos Emigrantes Judeus, de Giorgio Nissim. Com a ajuda de outras pessoas, escondeu os perseguidos nos edifícios do velho seminário na Via del Giardino Botanico em Lucca.
"Quantos judeus eu salvei? Não sei, não fiquei contando...", responderia ele nos últimos anos da sua vida a quem lhe pedia os números da sua coragem. Que seria reconhecida apenas em 2006, com a medalha de ouro ao valor civil do presidente da República italiana. Em 1999, Israel lhe atribuiu a honra de Justo entre as Nações, que Paoli, mesmo que sem polêmica, não foi retirar.
Irmãozinho
Em 1949, se mudou para Roma, como vice-assistente nacional da Juventude Católica. As suas ideias, tão semelhantes às da esquerda, irritavam a cúpula da organização. Em 1954, foi mandado para o "exílio", para servir como capelão entre os migrantes italianos em um navio destinado à Argentina. Uma medida punitiva, que, no entanto, tornou-se a sua salvação. Durante a viagem, Arturo assistiu a um religioso da Congregação dos Irmãozinhos no seu leito de morte. O padre fica surpreso e decide querer entrar na congregação fundada por Charles de Foucauld, que ordena caminhar com os pobres.
Para fazer isso, a etapa obrigatória é o noviciado. Como eremita, no deserto argelino. Ele chegou a El-Abiodh em outubro de 1954, trazendo consigo a fama de intelectual que vem de Roma. Uma aura insuportável para o mestre dos noviços, frei Milad, que decide desafiá-lo.
A ele, e só a ele, proíbe de ler e escrever durante todo o tempo do noviciado, 13 meses. Uma medida para entender o quanto ele é capaz de renunciar a si mesmo. Depois do deserto, "morrera um Arturo e nascera outro", contaria Paoli. Só como eremita é que ele consegue se livrar daquela que ele definiria como "a terrível doença que se chama o não sentido da vida". "Passar pela paciência do nada é uma experiência que nos deixa alegres toda a vida: depois, não existem mais egoísmos nem cinismos", explicaria.
Como Irmãozinho, deve trabalhar. E não trabalhos quaisquer, mas duros, humildes. Em 1957, foi enviado para a Sardenha, para estar entre os mineiros. Foi contratado para a manutenção das estradas. Além disso, escreve as cartas para os habitantes, em sua maioria analfabetos, para serem entregues aos parentes que emigraram para a América. Ainda visto com maus olhos pelas hierarquias vaticanas, foi convidado a deixar a Itália.
Era 1960, ele tinha 48 anos. Não sem sofrimento, partiu para a Argentina. Colheita do algodão, corte de madeira: Arturo faz os trabalhos mais humildes e, enquanto isso, incita as mulheres das favelas a se emanciparem, a se tornarem independentes.
Em Buenos Aires, também conhece um jovem Bergoglio. Ele gostaria dele nas vestes de papa. "Ele não tem nada a ver com os ditadores, ainda não era bispo: era um sacerdote jesuíta, sempre foi às favelas", diria em sua defesa durante as polêmicas midiáticas sobre o passado do Papa Francisco.
Os dois se veriam novamente em 2014, no dia 18 de janeiro, em Santa Marta, em um longo encontro, rigorosamente privado, na forma das conversas ordenadas por Foucauld.
O preço da ditadura sobre a cabeça
Na Argentina, Arturo Paoli encontrou muitos amigos e uma nova pátria. Mas, em 1974, foi novamente forçado a partir: a ditadura militar colocou um preço sobre a sua cabeça. As suas fotos estavam penduradas pelas ruas. Estava no segundo lugar entre os procurados.
Protegeu-se na Venezuela, depois no Brasil, trabalhando com os últimos e contra os poderosos, sempre no espírito da Teologia da Libertação, tão longamente condenada pela Igreja.
Em 1984, Joseph Ratzinger, ainda cardeal, escreve que "as teologias da libertação passam a fazer um amálgama pernicioso entre o pobre da Escritura e o proletariado de Marx" (Libertatis Nuntius de 6 de Agosto 1984).
Em 2005, aos 93 anos, ele abandonou depois de meio século as favelas e retornou para a Itália. Viveria longe da cidade, em um local isolado, rodeado pelos bosques, na casa diocesana de San Martino in Vignale, nas colinas acima de Lucca, intitulada ao Bem-aventurado Charles de Foucauld.
Condigo, a confiável Silvia Pettiti, sua secretária pessoal desde 2001 e que, a partir de 2005, o acompanhou durante as viagens ao Brasil e que assinou, dentre outros, Arturo Paoli. Ne valeva la pena (Ed. San Paolo, 2010).
O testamento
Arturo Paoli nunca estivera um dia na cama por causa de doença. Além de seu exemplo, deixa como testamento muitos livros. Demonizava o conceito do "me viro sozinho" e, especialmente, convidava os jovens a redescobrir os valores da lentidão e da comunidade, a abandonar o mito do dinheiro e da solidão.
Sempre inserido na realidade, em La rinascita dell’Italia. Messaggio ai giovani (org. Maria Pacini Fazzi, 2011, com a contribuição da Fundação Banca del Monte di Lucca), Paoli escrevia: "Berlusconi foi o sinal mais convincente de que o povo italiano se afastou do ideal de manter no mundo a estima de um povo sério, trabalhador, capaz de solidariedade, sobretudo de povo maduro. O fato de que esse vazio tenha sido preenchido por um homem que tem o mérito de comprar lindas garotas para o consumo deveria nos humilhar profundamente como italianos".
Não poupava acusações contra a Europa, tão dedicada ao "capitalismo" e à "morte do próximo". Arturo Paoli buscou um único grande projeto: "amorizar o mundo". "Se refletirmos – escrevia ele em Cent’anni di fraternità (Ed. Chiarelettere) –, a grande e única riqueza da vida é o amor".
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Arturo Paoli, morreu o último profeta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU