01 Dezembro 2014
Elif Shafak, escritora mais vendida na Turquia, autora de cerca de 15 livros, incluindo La bastarda di Istanbul e La città ai confini del cielo, afirma que o maior desafio, hoje, é encontrar um caminho e misturar o humanismo, a espiritualidade e o pluralismo, a democracia secular, lendo a viagem do papa à Turquia.
A reportagem é de Marco Ansaldo, publicada no jornal La Repubblica, 29-11-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Que impressão você teve ao ver o Papa Francisco no opulento palácio do presidente Erdogan?
Recentemente, eu li muito sobre o papa e sobre o que ele pensa. Pessoalmente, sempre olhei com admiração para São Francisco de Assis. E acho que há semelhanças filosóficas interessantes entre franciscanismo e sufismo. Os sufis também dizem: "Quem sou eu para julgar?". Mas, infelizmente, a modéstia e a humildade da filosofia sufi foram esquecidas pela elite política e pelos atuais governantes na Turquia.
Bergoglio falou de diálogo entre as diferentes fés.
Eu não sou uma pessoa religiosa, mas, sim, é verdade, aprecio muito a espiritualidade e a mística. Gosto das pessoas que cultivam ambas as coisas, a fé e a dúvida, porque não pode haver fé sem dúvida, e nem dúvida sem fé, como disse o poeta Khalil Gibran. Acredito que hoje nós, escritores e intelectuais, não podemos menosprezar a espiritualidade. Mas também devemos criticar abertamente a intolerância religiosa.
Para chegar a quê?
Para encontrar um caminho e misturar o humanismo, a espiritualidade e o pluralismo, a democracia secular. Esse é o nosso maior desafio. E acho que o papa está totalmente consciente dessa necessidade. É bom que ele seja um homem aberto ao diálogo intercultural. Espero que ele também seja ainda mais audaz nas suas declarações sobre os direitos dos gays e das mulheres. No mundo islâmico, há muitas vozes progressistas, mas não são ouvidas. Devemos falar mais forte. Caso contrário, o silêncio será preenchido pelas vozes dos extremistas.
Outro tema caro ao papa é a defesa das minorias. Por exemplo, o cristianismo nasceu e se desenvolveu justamente na Ásia Menor. Mas hoje, na Turquia, a minoria cristã quase desapareceu. Sacerdotes católicos como o padre Andrea Santoro e Dom Luigi Padovese foram mortos. Como está a situação agora?
Não é fácil viver como minoria na Turquia. Nunca foi, mas hoje é ainda mais difícil. Ainda há muita discriminação. E também problemas sobre a legislação. Erdogan fez um discurso, ao vivo na TV, e disse: "Chamaram-me de georgiano. Mas podem me dizer até coisas piores. Podem me chamar de armênio!".
E o que aconteceu?
Ele nem sequer se desculpou. O governo turco está focado nas pessoas que votam. Mas a marca de fábrica da democracia não é como a maioria é tratada, mas sim a minoria! E, na Turquia, as minorias não foram tratadas bem.
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''Este papa sabe que precisamos misturar espiritualidade e democracia'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU