Por: Caroline | 21 Fevereiro 2014
O grupo dos oito bispos teve importante participação nas ações realizadas por Francisco para garantir a paz na Síria, assim como na sugestão de diretrizes para o encontro que o Papa terá, no dia 27 de março, com Obama.
A reportagem é de Washington Uranga, publicada por Página/12, 19-02-2014. A tradução é do Cepat.
Fonte: http://goo.gl/m3yXNw |
Conhecido como C8, o grupo dos oito cardeais trata de uma comissão criada pelo papa Francisco para fazer seu assessoramento em todos os temas do governo da Igreja Católica. O grupo está reunido durante estes dias no Vaticano e, ainda que tenham sido realizados apenas os estudos das reformas a serem introduzidas no banco vaticano (IOR) e nas estruturas financeiras da Igreja Católica, sabe-se que a agenda dos cardeais é extensa e inclui temas relacionados a inovações do governo geral da instituição eclesiástica, assim como com as diretrizes pastorais que começaram a ser debatidas no consistório extraordinário de cardeais, que terá inicio no dia 20 de fevereiro, pela ocasião da ordenação de novos cardeais para a Igreja.
O C8 não é um órgão do governo formal estabelecido pela lei eclesiástica, mas é sabido que além do Código de Direito Canônico na Igreja, o Papa conta com todas as atribuições para tomar as iniciativas que considere necessárias, seja para remover ou criar novas instâncias. Há apenas um mês após sua eleição como papa, Bergoglio decidiu instituir essa comissão extraordinária em uma clara mensagem que destinava-se a assinalar que não governaria isoladamente. Decisão complementar ao gesto de sua primeira aparição na sacada da Praça de São Pedro, quando foi apresentado como “bispo de Roma”: primeiro entre iguais (primus inter pares), com autoridade reconhecida, mas dentro do marco de uma ação episcopal colegiada. Também trata-se de uma hábil jogada para não ficar atado as estruturas, burocráticas e de poder, da cúria vaticana controlada pelos italianos.
Quando criou o C8, o Papa não determinou precisamente suas funções, mas tornou o grupo seu assessor para temas gerais de sua gestão. Todavia, tratou de garantir uma integração que refletisse uma perspectiva internacional e representativa da Igreja em todo o mundo. O C8 está composto por Francisco Javier Errázuriz Ossa (Chile), Sean Patrick O’Malley (Estados Unidos), Reinhard Marx (Alemanha), Oswald Gracias (Índia), George Pell (Austrália), Laurent Monsengwo Pasinya (Congo) y Giuseppe Bertello (Itália). De maneira que, também mandou uma mensagem ao poderoso grupo dos italianos que agiam de acordo com sua vontade na cúria, ao nomear o cardeal hondurenho Oscar Rodríguez Maradiaga.
O centro americano, além de coincidir em muito com a visão que Francisco tem sobre a Igreja, também é um intelectual e um homem de grande manejo e habilidade política. Nestes aspectos entende-se muito bem com Bergoglio. Pouco a pouco, Francisco foi delegando responsabilidades para Rodríguez Maradiaga e, o hondurenho, também teve o crescimento de seu poder. De tal modo que, em uma entrevista concedida no mês anterior ao jornal alemão Koelner Stadt-Anzelger, atreveu-se a contradizer em público o prefeito (equivalente ao ministro do Papa e máxima autoridade do organismo) da Congregação para a Doutrina da Fé (ex Santo Ofício), o alemão Gerhard Ludwig Müller, designado por Francisco para esse cargo e cardeal nos próximos dias. Müller havia enclausurado a discussão sobre um eventual acesso aos sacramentos para os católicos divorciados e em segunda união. Rodríguez Maradiaga disse: “Creio que o entendo. É um alemão e, devo pontuar, é sobretudo um professor de teologia alemã, em sua mentalidade existe apenas o verdadeiro e o falso. Mas eu digo: meu irmão, o mundo não é assim; você deveria ser um pouco mais flexível quando escuta a outras vozes. E não apenas escutar e dizer não.”
Nestes três dias de reunião, que culminarão hoje em Roma, após quase um ano de trabalho e de diversos encontros, o C8 estabelecerá com o Papa uma agenda de trabalho que atenderá tanto a questões internas como a ação política internacional do Vaticano. Sabe-se que este grupo de bispos teve uma participação importante nas ações que Francisco realizou para garantir a paz na Síria, mas também sugeriu diretrizes para o encontro que o Papa terá em 27 de março com Barack Obama, presidente dos Estados Unidos. De acordo com informações de fontes norte-americanas, o diálogo será destinado a considerar estratégias comuns para “combater a pobreza e o aumento da desigualdade no mundo”.
Em outubro deste ano será celebrado, em Roma, um sínodo de bispos (um encontro que reúne bispos delegados das conferências episcopais de todo o mundo). O assunto central será a família e, para isso, Francisco enviou há alguns meses uma consulta ampla a todos os bispos, na qual não foi omitido nenhum tema: novas formas de família, matrimônio entre pessoas do mesmo sexo; divórcio e aborto, entre tantos outros. Rodríguez Maradiaga também falou sobre essa questão. Em seu momento, disse que “estou profundamente convencido de que estamos no começo de uma nova era na Igreja, como há cinquenta anos, quando João XXIII abriu a janela para que entrasse um novo ar”. E, ao ser interrogado sobre o próximo sínodo, o hondurenho referiu ao que ele mesmo perguntou a Bergoglio, ao questioná-lo sobre o por quê realizar novamente uma discussão sobre a família quando já houve um encontro similar em 1980 e, posteriormente, o documento Familiaris consortio, de João Paulo II. Segundo Rodríguez Maradiaga, o papa lhe respondeu: “Isso ocorreu há trinta anos. Hoje, para a maioria das pessoas, a família daquele tempo quase não existe. Temos separações, famílias entendidas, muitos filhos que crescem sozinhos, mãe de aluguel, casamentos sem filhos, sem esquecer das uniões entre pessoas do mesmo sexo. Em 1980 estas coisas nem sequer existiam”. Todos estes temas têm estado presentes também na agenda do C8, cuja influencia cresce no amparo a Francisco, o que os aproxima do Papa, sob as vistas de todo o mundo, para impulsionar “uma nova era” na Igreja Católica cujos alcances ainda permanecem imprecisos.
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O Papa debate a “nova era” da Igreja com os cardeais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU