18 Mai 2013
Tudo começou como um ato profundamente pessoal, de um pai oficializar o casamento de seu filho.
Mas logo foi condenado como uma demonstração pública de desobediência eclesiástica porque o pai, o reverendo Thomas W. Ogletree, é um ministro da Igreja Metodista Unida, que não permite que seus clérigos realizem casamentos entre pessoas de mesmo sexo.
A matéria é de Sharon Otterman, publicada no jornal The New York Times e reproduzida pelo Portal Uol, 12-05-2013.
Ogletree, 79, agora enfrenta um possível julgamento canônico por conta de sua ação, acusado por vários ministros da Metodista Unida de Nova York de violar as regras da igreja. Embora ele não seja o primeiro ministro da Igreja Metodista Unida a ser punido por realizar um casamento entre pessoas do mesmo sexo, pode ser o primeiro da alta hierarquia. Ele é um diretor aposentado da Yale Divinity School, um veterano das lutas pelos direitos civis do país e um estudioso das mesmas questões éticas que está enfrentando agora.
"Às vezes, quando a lei oficial está errada, você tenta mudá-la", disse Ogletree, nativo de Birmingham, Alabama, com um sotaque cortês do sul, durante um almoço recente na Universidade de Yale, onde continua como professor emérito de ética teológica. "Mas se você não consegue mudá-la, você a infringe."
Para Ogletree, as questões não são apenas acadêmicas. Ele diz que aceitou totalmente que dois de seus cinco filhos sejam gays. Sua filha se casou com sua parceira em Massachusetts, numa cerimônia não metodista. Assim, quando seu filho lhe pediu, no ano passado, para oficializar o casamento, ele disse sim.
"Eu estava inspirado", disse Ogletree. "Na verdade, eu não pensei nisso como um ato de desobediência civil ou desobediência da igreja. Eu pensei nisso como uma resposta ao meu filho."
O casamento de Thomas Rimbey Ogletree e Nicholas W. Haddad, realizado em 20 de outubro de 2012 no Yale Club em Nova York, incorporou leituras das Escrituras e da decisão do tribunal de Massachusetts de legalizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Um anúncio do casamento no jornal New York Times levou vários ministros metodistas conservadores a apresentarem uma queixa contra Ogletree ao bispo local.
"Essa cerimônia é uma ofensa" às regras da igreja, escreveram os ministros, liderados pelo reverendo Randall C. Paige, pastor da Igreja de Cristo em Port Jefferson Station, Nova York.
No final de janeiro, Paige e Ogletree, acusador e acusado, encontraram-se frente a frente num esforço para resolver a disputa sem um julgamento pela igreja. Paige, que se recusou a ser entrevistado para esta matéria alegando a confidencialidade do processo, pediu que Ogletree se desculpasse e prometesse nunca mais realizar uma cerimônia como aquela. Ele se recusou.
"Eu disse: 'essa é uma lei injusta'", contou Ogletree. "Dr. King infringiu a lei. Jesus de Nazaré infringiu a lei ao expulsar os vendilhões para fora do templo. Então você quer dizer que nunca se deve infringir nenhuma lei, não importa o quanto seja injusta?"
Mas ministros como Paige acreditam que infringir a lei da igreja não é o caminho certo para trazer a mudança, diz o reverendo Thomas A. Lambrecht, vice-presidente da Boa Nova, um grupo Metodista tradicionalista. "O reverendo Ogletree está agindo de uma forma que é prejudicial para a igreja porque fomenta uma confusão sobre o que nós defendemos", disse ele. "E isso mina todo o pacto de responsabilidade que partilhamos uns com os outros como pastores".
A Igreja Metodista Unida é a terceira maior denominação cristã no país. Seus clérigos se comprometem a seguir as leis da igreja contidas em seu livro de regras, o Livro de Disciplina. As regras só podem ser alteradas por votações de clérigos e leigos que ocorrem a cada quatro anos.
Como muitas denominações cristãs, a Igreja Metodista Unida tem lutado com as questões dos direitos dos homossexuais. Em 1972, a denominação acrescentou uma linha ao seu livro de regras, declarando a prática da homossexualidade "incompatível com a doutrina cristã". Ela proíbe a ordenação de homossexuais praticantes "autodeclarados" como clérigos e proíbe o clero de oficializar uniões entre pessoas do mesmo sexo. Mas ela também chama os homossexuais de "pessoas de valor sagrado" e os aceita como membros. "Tentamos ser ecléticos a esse respeito", disse Lambrecht. "Apesar de desaprovar a prática da homossexualidade, nós acreditamos que as pessoas que são gays ou lésbicas são amadas e valorizadas por Deus e dignas do ministério da igreja e convidadas a participar das igrejas."
O resultado é contraditório, diz Ogletree. "O lema oficial da igreja é mentes abertas, corações abertos, portas abertas, muito embora nossas regras sobre o casamento homossexual contradigam essa afirmação", disse ele.
Ogletree está trabalhando agora com metodistas no New Directions, um grupo de Nova York que faz parte de um movimento crescente para mudar as regras da igreja. Mais de 1.100 membros do clero da Metodista Unida --de cerca de 45 mil no país-- expressaram uma disposição para realizar cerimônias entre pessoas do mesmo sexo, mesmo que isso signifique que eles possam enfrentar suspensão ou censura. Mas a questão é criar uma fenda profunda com a ala evangélica e conservadora da igreja, que está sendo impulsionada pela disseminação da denominação de 12 milhões de membros na África e na Ásia.
Na conferência geral dos metodistas em maio passado, as tensões chegaram a um ponto de ebulição depois de uma tentativa de modificar a posição da igreja sobre a homossexualidade, que fracassou numa votação de 61% contra 39%.
"O tempo de falar acabou", declarou o bispo emérito aposentado Melvin Talbert, em protesto. "Chegou o momento de agirmos para desafiar as palavras injustas de discriminação imoral e depreciativa."
Cinco meses depois, Ogletree presidiu o casamento de seu filho.
"Ele faz a coisa certa porque acredita em fazer a coisa certa", disse o Ogletree mais novo sobre seu pai. "E então, se há alguma dúvida quanto a isso, ele está disposto a se levantar e fazer uma reivindicação pública."
Os metodistas de Nova York aprovaram resoluções apoiando o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas o bispo da região, Martin D. McLee, disse que não tinha outra escolha --uma vez que a mediação fracassou-- a não ser enviar a questão para o equivalente a um promotor da igreja, que decidirá se haverá um julgamento.
McLee observou que muitas congregações Metodistas Unidas têm ministérios voltados para acolher gays e lésbicas e disse que, "assim como acontece com as principais denominações protestantes, as questões referentes à sexualidade humana continuam a evoluir", disse ele.
No entanto, em uma entrevista ele afirmou que, "se todos puderem escolher as leis que particularmente não gostam, e decidirem violá-las, então haverá uma situação de pandemônio".
McLee disse que a denúncia contra Ogletree foi a primeira que ele recebeu desde que se tornou bispo regional, há quase um ano, muito embora haja indícios de que essas cerimônias ocorrem com certa regularidade.
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Ministro metodista pode ser julgado por realizar casamento gay - Instituto Humanitas Unisinos - IHU