11 Março 2013
Um documento dos anos 1980 de João Paulo II, uma exortação apostólica sobre a família, tem o mesmo nome do movimento de católicos da Emilia Romagna: Familiaris Consortio (www.familiarisconsortio.org). Para descobri-lo, basta falar como um teólogo como Vito Mancuso, escritor e professor de história das doutrinas teológicas da Universidade de Pádua.
A reportagem é de Silvia Truzzi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 11-03-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Professor, que ideia o senhor tem desse movimento?
Nunca é bom julgar o que não se conhece a fundo. Mas, lendo materiais impressos e o seu próprio site, parece-me um movimento tendencialmente integralista e fechado em si mesmo, que afirma uma modalidade de viver a religião em contraste com o mundo.
A necessidade de se fechar fora do mundo responde a que necessidade?
Desde sempre, a experiência espiritual conhece duas modalidades diferentes e contrapostas, assim como originais. A primeira nasce da maravilha; a segunda, do temor. A espiritualidade é uma tensão de fundo da alma humana a partir do qual não brota apenas religião, mas também a arte, a filosofia, a música. Portanto, as religiões que nascem da maravilha diante do mundo, do mistério da vida, das relações com o outro têm uma abordagem positiva com relação à existência. As religiões que nascem do temor têm um olhar contrário que leva as pessoas a procurar abrigo e proteção. E a praticar ideias, costumes, tradições de total fechamento. São as duas categorias a partir das quais brota a aventura espiritual da humanidade: já o dizia Rudolf Otto em O sagrado. É um livro fundamental, de 100 anos, mas atualíssimo.
Esses dois impulsos se encontram em todas as religiões?
Absolutamente sim, não é algo que só diga respeito ao cristianismo. O judaísmo conhece movimentos de abertura. Penso em Martin Buber, por exemplo. Mas também uma religiosidade de fechamento e de defesa, como os ortodoxos. O Islã tem os sufis e os integralistas, que não só se defendem dos outros, mas também o fazem a ponto de atacar. O hinduísmo tem figuras como o Mahatma Gandhi e movimentos como o Hindutva, que tem como base o sangue do ser hindu e persegue – como acontece na Índia – os fiéis de outras confissões. A própria Bíblia tem grandes impulsos de abertura – penso nos livros sapienciais – e páginas de fechamento assustador.
Os integralismos estão destinados a crescer?
Eu me inclino para o otimismo, a teologia deve infundir esperança. Mas se eu raciocino sobre o futuro, eu penso que esses movimentos integralistas são o rosto da religiosidade vencedora. Tornam-se um refúgio da psique diante de uma realidade esmagadora.
Por que o mundo contemporâneo é mais assustador?
Bem, o quadro é turvo: há grandes problemas econômicos, sociais, ambientais. Muda a qualidade da vida, as nossas cidades mudam e se tornam irreconhecíveis. Não estou dizendo nem que isso é bom, nem que é ruim. Acredito, porém, que essas transformações radicais geram desorientação. Tudo o que tem a ver com a agregação das pessoas está em crise: a escola, a instrução, a religião, a política. Hoje, o mundo desperta cada vez menos maravilha e provoca mais medo: isso vale também em nível social: o mundo nos dá medo, seja como natureza, seja como história. Eu acredito que os movimentos políticos, como o Cinque Stelle, também são gerados por sentimentos de medo e de desconforto social. O político é um epifenômeno, mais profundamente há um grande desconforto interior. Mas não se desmonta o mecanismo do temor com o fechamento. Esses movimentos confessionais são levados a aumentar a sensação de mal-estar: em certo sentido, vivem disso.
Eles tentam reproduzir cada vez mais modelos comunitários exclusivos. Como a escola, que ao invés deveria ser o primeiro lugar do confronto com a diversidade.
De fato, eu não sou contrário às escolas privadas. Mas a esse modelo sim. Porque aqui se diz que há uma "paternidade" da escola: da família, descende aquela perspectiva que a escola transmite depois. É evidente que se cria na mente das crianças uma visão do mundo assustadoramente restrita. A escola, além de ser informativa, deve ser formativa: medo e rejeição vão em direções opostas.
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''Eles se fecham entre si por medo''. Entrevista com Vito Mancuso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU