19 Agosto 2011
O Vaticano publicou online mais de 70 páginas de documentos que, afirma-se, provam que o Vaticano não tinha conhecimento das más condutas sexuais de um padre dos EUA, até que ele e sua ordem religiosa pediram a sua laicização.
A reportagem é de Cindy Wooden, publicada no sítio Catholic News Service, 18-08-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O caso envolve o falecido Andrew Ronan, ex-padre servita laicizado em 1966. Um homem que diz ter sido abusado por Ronan. no Oregon, em 1965, levou o Vaticano ao tribunal, alegando que Ronan era um empregado do Vaticano.
Em um comunicado do dia 17 de agosto, o padre jesuíta Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, disse: "Enquanto a maioria dos casos foi indeferida, duas acusações feitas pelos advogados reclamantes persistiram e foram repetidamente relatados à imprensa: que a Santa Sé sabia que Ronan era um abusador e que a Santa Sé transferiu Ronan de um lugar para outro com esse conhecimento".
"Essas seriam, naturalmente, acusações muito sérias – se fossem verdade", disse o Pe. Lombardi. "Mas, como estamos tomando conhecimento com o desdobramento do caso, as acusações são decididamente não verdadeiras".
O porta-voz do Vaticano disse que, "para ajudar aquelas pessoas públicas que desejam estudar o assunto com cuidado e para ajudar o tribunal dos Estados Unidos a resolver as questões remanescentes nesse caso, a Santa Sé está liberando hoje documentos relacionados com Ronan, principalmente no que diz respeito à demissão de Ronan do estado clerical".
Os documentos incluem um pedido formal feito pela ordem Servita em 1953, pedindo para que o Vaticano deixasse de lado o requisito de idade para que Ronan, então com apenas 27 anos, pudesse ser nomeado como mestre de noviços no convento servita de Benburb, na Irlanda.
A carta descrevia Ronan como "um jovem com qualidades ideais", e, em seguida, a Congregação dos Religiosos do Vaticano concedeu a permissão.
Mas os documentos – postados no link http://www.radiovaticana.va/pdf/documents_Doe_v_Holy_See.pdf – também dizem que Ronan foi removido dessa posição "por causa da homossexualidade com os estudantes", segundo uma carta do provincial dos EUA, que transferiu Ronan para o St. Philip`s High School, em Chicago.
O provincial estava escrevendo ao superior-geral da ordem em 1963, depois que o superior perguntou a Ronan se ele queria servir como mestre do seminário internacional da ordem, em Roma.
Escrita no papel timbrado do superior da província de Nossa Senhora das Dores, com sede em Chicago, a carta dizia: "Eu sinto muito em ter que lhe dizer que ele não deve ser eleito mestre".
O provincial, cuja assinatura é ilegível, disse que Ronan lhe pediu para não contar a ninguém, mas "eu sinto e sei que devo fazê-lo".
Ele disse: "Eu o afastei de Benburb por causa da homossexualidade com os alunos, que ele admitiu e confessou livremente, quando o fato foi levado ao prior por um dos estudantes".
"Perdemos vocações como um resultado disso na Irlanda e somos muito afortunados pelo fato de mais escândalos não terem surgido", disse o provincial, acrescentando que colocar Ronan de volta em um seminário seria "contrário a todas as prescrições da Igreja e do senso comum".
"Embora não tenha havido recorrência desse problema, todos os especialistas nessa perversão concordam que não existe uma cura permanente. Estou esperando o pior a qualquer dia aqui em St. Philip`s, mas foi muito melhor que isso tenha acontecido aqui do que em um seminário", escreveu o provincial em 1963.
A carta de 1963 fazia parte da documentação que os servitas submeteram ao Vaticano em 1966 para apoiar o pedido de laicizar Ronan rapidamente.
"Claramente, o Vaticano não detinha essa carta no momento" das denúncias iniciais sobre a atividade abusiva de Ronan, disse o padre Lombardi ao Catholic News Service.
Uma carta manuscrita, sem data e sem assinatura dizia que o então arcebispo Edward D. Howard, de Portland, havia estabelecido um tribunal para averiguar as ações de Ronan em Portland, onde ele foi transferido para uma paróquia depois da sua nomeação a Chicago.
A carta afirmava que a investigação estava "necessariamente agitando as águas turvas" e que "Andy (Ronan) preferiria muito mais uma dispensa voluntariamente solicitada (do sacerdócio) do que ser jogado fora. Não seria isso o melhor para todos?".
Os documentos incluem uma carta de fevereiro de 1966, em latim, do arcebispo Howard ao superior servita em Roma, informando-o que o arcebispo havia encorajado o superior provincial a pedir à Santa Sé a laicização de Ronan.
Os documentos publicados também incluem um pedido de Ronan pela laicização, "com base em minhas tendências homossexuais repetidas, admitidas e documentadas e meus atos contra o voto de castidade e celibato do sacerdócio".
Jeffrey Lena, advogado norte-americano da Santa Sé no caso John V. Doe versus Santa Sé, disse que a documentação provava que "a Santa Sé não estava envolvida nas transferências de Ronan, incluindo a sua transferência a Portland, e não tinha conhecimento prévio de que Ronan representava um perigo para os menores".
"Em vez disso, os documentos confirmam que a ordem Servita informou pela primeira vez a Santa Sé sobre a má conduta de Ronan quando este pediu a sua laicização em fevereiro de 1966 – depois do abuso do demandante – e que a Santa Sé concedeu o pedido de laicização poucas semanas depois".
Em junho de 2010, a Suprema Corte dos EUA deixou em suspenso uma decisão de primeira instância que afirmava que Doe poderia tentar responsabilizar financeiramente o Vaticano pelo seu abuso sexual por parte Ronan, se ele pudesse convencer o tribunal de que o padre era um empregado da Santa Sé.
Lena disse que os advogados de Doe "nunca tiveram apoio para as acusações caluniosas" de que a Santa Sé sabia que Ronan era um abusador e de que ela estava envolvida na sua transferência quando o seu abuso foi descoberto.
Embora Lena tenha dito que a conduta dos advogados foi lamentável, "é importante lembrar que qualquer abuso sofrido por esse demandante, ou por qualquer outra vítima de abuso sexual, é deplorável".
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Vaticano publica documentos relacionados aos casos de abuso sexual no Oregon - Instituto Humanitas Unisinos - IHU