11 Mai 2008
Quais são as mudanças que a comunicação homem-máquina proporcionarão às sociedades? Essa é uma das questões que o professor João Antônio Zuffo responde na entrevista que concedeu à IHU On-Line, por e-mail. “Hoje, já existem trabalhos de comunicação entre o cérebro e o meio externo, exemplo do implante coclear com conexão direta como o cérebro, ou então, experimentos com pastilhas (chips) de retinas artificiais, também conectadas diretamente ao cérebro”, relata Zuffo.
Aqui, ele analisa a convivência dos seres humanos e das máquinas de inteligência artificial proporcionada pelas nanotecnologias e avalia como essa importante evolução vai influenciar no futuro das sociedades. Ele acredita “que na década de 2010 a 2020 a convergência digital, associada à comunicação homem-máquina pela voz, permitirá que todos os brasileiros, mesmo os analfabetos, tenham acesso à Internet”.
O professor doutor em Engenharia Elétrica João Antônio Zuffo é coordenador Geral do Laboratório de Sistemas Integráveis da Universidade de São Paulo, onde é, também, professor titular da Escola Politécnica. Além disso, é autor da série de livros A sociedade e a economia no novo milênio (São Paulo: Manole, 2003) e de Flagrantes da vida no futuro (São Paulo: Saraiva, 2008).
Confira a entrevista.
IHU On-Line – A comunicação homem-máquina com o cérebro humano irá influenciar que tipo de mudanças em nosso cotidiano?
João Antônio Zuffo – A comunicação realizada cérebro-máquina mudará profundamente o cotidiano das pessoas. Por exemplo, fenômenos parapsicológicos como a telepatia e a telesinese serão corriqueiros, já que as pessoas poderão se comunicar cérebro a cérebro através da rede wireless ou, então, comandar a distância um robô.
Hoje, já existem trabalhos de comunicação entre o cérebro e o meio externo, exemplo do implante coclear com conexão direta como o cérebro, ou então, experimentos com pastilhas (chips) de retinas artificiais, também conectadas diretamente ao cérebro. Existem, também, experiências de conexão do cérebro com a medula espinhal, visando à habilitação de pessoas tetraplégicas, bem como alguns comandos diretos do cérebro para o computador.
Recentemente, foi realizada uma experiência em que um macaco aprendeu a controlar, na conexão cérebro-máquina, um braço mecânico a distância.
IHU On-Line – A construção de avatares para "trabalhar" por nós no mundo virtual diminui as distâncias e, por conseqüência, nos aproxima de pessoas nos mais diferentes lugares. Esses avatares podem nos isolar?
João Antônio Zuffo – A própria rede de comunicação cada vez mais densa está provocando, em nível planetário, uma distribuição maior da população mundial, a tal ponto que alguns autores, prevendo a deteriorização das cidades, descrevem um mundo chamado de “ex-urbia” [1].
Este afastamento do contato humano direto irá levar as pessoas a serem mais isolacionistas, egoístas e hedonistas. A existência de avatares, simplesmente, vai tornar essa situação um pouco mais aguda.
Num futuro não muito distante, as pessoas poderão dispor não de um avatar, mas de múltiplos avatares, com sua personalidade e agindo como se fosse a própria pessoa, participando de reuniões e conferências simultâneas.
Esses avatares, em determinada hora, apresentariam relatórios visuais dos acontecimentos.
IHU On-Line – Já podemos prever como as nanotecnologias vão influenciar no nosso futuro?
João Antônio Zuffo – Sim. Nanotecnologias já são utilizadas na elaboração de tintas, tecidos e em aplicações diversas.
Na área de microeletrônica, já se prevê dimensões de 25 bilionésimo de metro nos CIs (Circuitos Integrados) já em 2010. Nessa área tecnológica, é possível a construção de nanosensres, nanoatuadores, contendo nanomotores. Como exemplo, em nosso Laboratório já foram desenvolvidos sistemas de remédios inteligentes com nanotecnologia, que liberam doses de remédios de forma programada, até serem eliminados pelo organismo.
É possível a construção de microcâmeras de vídeo, microinstrumentos que podem ser utilizados onde quer que se queiram.
IHU On-Line – Por que, em sua opinião, as nanotecnologias ainda não estão sendo divulgadas e discutidas pela população ficando apenas restrita às discussões acadêmicas?
João Antônio Zuffo – O problema de divulgação das nanotecnologias é o mesmo problema de divulgação da ciência de modo geral. Na verdade, nosso país ainda é um país de bacharéis, onde as ciências e as tecnologias ocupam lugar secundário.
IHU On-Line – De que forma a indústria brasileira será afetada com a inserção de nanorrôbos em seu dia-a-dia?
João Antônio Zuffo – Tanto a indústria brasileira quanto a indústria planetária de modo geral serão profundamente modificadas pela presença generalizada de robôs e não apenas de nanorrobôs. Já se fala em linhas de produção flexíveis, onde nesse instante se produz uma coisa e no instante seguinte uma coisa completamente diferente.
Num futuro não muito distante, todos os produtos tenderão ser personalizados de acordo com a determinação do cliente.
Num futuro mais distante, nanorrobôs poderão dar acabamento mais preciso a todos os produtos e mais adiante, “através de compiladores de matéria” poderão sintetizar produtos nas próprias residências.
IHU On-Line – Como o senhor trata a questão da inclusão digital no livro Flagrantes da vida no futuro?
João Antônio Zuffo – Acredito que, na década de 2010 a 2020, a convergência digital, associada à comunicação homem-máquina pela voz, permitirá que todos os brasileiros, mesmo os analfabetos, tenham acesso à Internet.
Hoje, no Brasil, estamos atingindo 145 milhões de telefones celulares. Muito em breve todos os brasileiros terão o seu.
Na definição de protocolos da 4ª geração de telefonia celular prevê-se a comutação por pacotes, tal como ocorre na Internet, de modo que o telefone celular, em cinco anos, deverá se tornar indistinguível de um “laptop”, talvez distinguindo-se apenas pelo tamanho físico.
IHU On-Line – Quais serão as conseqüências socioeconômicas das novas descobertas nanotecnológicas num futuro próximo?
João Antônio Zuffo – As principais conseqüências socioeconômicas são as seguintes:
a) redução drástica do número de empregos permanente;
b) trabalho predominantemente no lar;
c) numa 1ª etapa, fuga para os subúrbios e numa 2ª etapa, fuga para locais aprazíveis, formando pequenas comunidades com todos os benefícios da sociedade moderna, sem os problemas de congestionamentos e poluição;
d) medicina prognosticativa. A decodificação de DNA permitirá o desenvolvimento de tratamentos preventivos muito antes da ocorrência das doenças propriamente ditas;
e) terapia genéticas, com a correção de defeitos como a Síndrome de Down;
f) turismo virtual;
e muitas outras mais.
IHU On-Line – Como a TV Digital deve ser influenciada pelo desenvolvimento das tecnologias nano, no Brasil e no mundo?
João Antônio Zuffo – A TV digital se tornará cada vem mais sofisticada, podendo ter mostradores tridimensionais com o uso de óculos, ou mesmo sem óculos em sistemas holográficos.
Já existem sistemas de síntese e ajuste de imagens em tempo real, de maneira que não está distante o uso de realidade virtual no lar e TV de 360 graus.
Num passo adiante, será possível a síntese de imagens, de maneira que o telespectador poderá assistir um espetáculo da posição que desejar, por exemplo, um torcedor poderá assistir um jogo de futebol a partir da posição do juiz.
Com o IPTV [2] será possível o telespectador dispor de acesso a todos os canais de televisão em nível planetário, de maneira que, em pouco tempo, as condições mercadológicas desse meio de comunicação serão radicalmente diferentes das atuais.
Notas:
[1] A “ex-urbia” ou as mutações urbanas são, segundo Gandelsonas, os processos (ou o conjunto de processos de transformações estruturais no sentido do crescimento urbano sobre seus limites) que vieram para soterrar, ou definitivamente enterrar, a cidade tradicional e a Moderna (entende-se por Moderna, a cidade modelo advinda da Revolução Industrial). A cidade estática tradicional, de limites definidos por seus muros, ou a cidade Moderna que se superpõe ao tecido antigo, dá lugar agora, a expansões mutacionais que as necessidades contemporâneas se impõem ao urbano, extravasando estas necessidades em novos lugares que “ampliam” o contexto urbano requalificado.
[2] A IPTV ou TVIP é um novo método de transmissão de sinais televisivos. Assim como o VOIP (Voz sobre IP), o IPTV usa o protocolo IP Internet Protocol como meio de transporte do conteúdo. Mas ela não é uma Web TV. O IPTV é a oportunidade das operadoras de telecomunicação de definitivamente se tornarem Triple Players, ou seja, provedoras de telefonia, internet e televisão, assim como já são muitas das Operadoras de TV a cabo no país.
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As nanotecnologias. Do presente ao futuro. Entrevista especial com João Antônio Zuffo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU