05 Novembro 2021
Um padre jesuíta e dois voluntários da Caritas estão fazendo greve de fome pelo direito dos migrantes há quase um mês dentro de uma igreja na cidade portuária de Calais, na França.
A reportagem é de Pascal Charrier e Christophe Henning, publicada por La Croix International, 04-11-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Gaston Grare poderia firmemente segurar suas lágrimas na quarta-feira, quando ele entrou na Igreja de Saint-Pierre, na cidade de Calais, no norte da França, o maior porto no Canal da Mancha.
O psicólogo, que voluntaria no albergue para migrantes na cidade, foi analisar a saúde do padre jesuíta e dois voluntários da Caritas que estão há quase um mês em uma greve de fome em solidariedade à comunidade migrante de Calais.
“Não vão muito longe”, disse-lhes Grare.
O padre Philippe Demeestère, de 72 anos, faz sinais de compreensão com a cabeça.
“Eu não quero morrer nessa igreja”, disse ele. “Eu quero sair caminhando com meus próprios pés”.
Demeestère, que é capelão da Secours Catholique (Caritas da França), permaneceu no corredor da igreja onde ele havia concelebrado a missa um dia antes.
Na quinta-feira, ele e dois voluntários da Caritas iniciaram o 25º dia sem comer.
“Eu mantenho toda minha liberdade e tenho outras perspectivas”, respondeu Demeestère.
O governo francês nomeou o servidor público Didier Leschi para negociar com o padre e seus dois companheiros – Anaïs Vogel e Ludovic Holbein – a fim de encerrar a greve de fome.
Mas as discussões encontraram um impasse desde que o governo disse que não tinha a intenção de parar sua rotina de desocupação dos acampamentos de migrantes na área de Calais.
Ele diz que não fazer nada seria o mesmo que permitir que uma “selva” de migrantes fosse reconstituída, especialmente durante a trégua de inverno ou anistia.
Os três grevistas, entretanto, fizeram da suspensão da demolição dos acampamentos sua primeira exigência.
Um a um, eles repetem estas palavras: “Vou continuar”.
Os dois voluntários da Caritas são ainda mais radicais do que seu capelão jesuíta.
“Defendemos a vida, não a morte”, enfatiza Ludovic Holbein.
“Talvez se estivéssemos recebendo medicação na veia ajudasse, mas não é por isso que estamos aqui”, diz ele.
Anaïs Vogel, que está sentada ao lado dele, admite que se sente “hiperfatigada”. “Nos últimos dias, tenho sentido uma deterioração”, ela confessa.
Enquanto isso, Leschi começará a implementar outras propostas que os três grevistas dizem que realmente não resolverão nada.
Uma dessas propostas é oferecer alojamento fora de Calais aos migrantes que ainda vêm à cidade portuária para tentar atravessar o canal para a Inglaterra.
“Disseram-nos: 'despejamos ou deixamos a selva se reconstituir', como se não houvesse nada entre essas duas opções”, lamenta Holbein.
Como Demeestère e Vogel, ele exorta as autoridades a deixarem os migrantes “pelo menos” respirar sob uma tenda durante o inverno, “um momento para deixá-los pensar sobre seu futuro”, em vez de persegui-los e obrigá-los a se mudarem.
“Não nos opomos à acomodação permanente, mas ela deve ser oferecida aqui, em Calais”, diz Holbein.
Os três grevistas têm o apoio da Caritas (Secours Catholique) e da Companhia de Jesus.
“A questão de continuar ou não a greve de fome não cabe a nós decidir, trata-se de uma escolha individual”, insiste Nathanaël Caillaux, responsável pela missão Secours Catholique na região. “Essa ação pelo menos colocou os holofotes de volta em Calais”, diz ele.
François Boëdec, superior da Província dos Jesuítas da Europa Ocidental, concorda. “Para mim, este é o resultado mais importante do empenho deles. Faz-nos lembrar o caráter insuportável da situação”, destaca.
O bispo local, dom Olivier Leborgne de Arras, se reuniu com os grevistas dentro da Igreja de Saint-Pierre e os apoiou. Ainda assim, ele está “preocupado” com a saúde deles e se pergunta se devem continuar.
“A greve de fome teve alguns efeitos positivos, ainda que pequenos, e eu ficaria surpreso se o governo desse mais do que já concedeu”, disse o bispo. “Precisamos seguir em frente”, acrescenta. “Mas não avançaremos arriscando a saúde das pessoas em greve de fome mais do que o razoável”.
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França. “Eu não quero morrer nessa igreja”. Jesuíta e dois membros da Cáritas seguem em greve de fome pelos migrantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU