São Francisco de Assis e a conversão ecológica: “o ser humano não vale mais do que os outros animais, as aves, os peixes e as flores”

Imagem: Luis Ca | Cathopic

04 Outubro 2021

 

"No mundo medieval marcado pela indústria do vidro que queimava madeira, pelos cortumes e abates de animais que poluíam as águas, Francisco clama, já naquela época, por um cosmocentrismo, isto é, a natureza e não o ser humano deve estar no centro da criação, do mundo, do cosmos", Jacir de Freitas Faria, OFM, para a festa de São Francisco de Assis, 04-10-2021. 

Frei Jacir é doutor em Teologia Bíblica pela FAJE-BH. Mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, professor de exegese bíblica,  membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB) e padre Franciscano. Autor de dez livros e coautor de quatorze, cujo último livro é O Medo do Inferno e a arte de bem morrer: da devoção apócrifa à Dormição de Maria às irmandades de Nossa Senhora da Boa Morte (Vozes, 2019).

 

Eis o artigo. 

 

Numa choupana, no anoitecer do outono de 03 de outubro de 1226, na bucólica Assis, na Itália, São Francisco morreu. Conforme uma tradição, ele pedira para morrer nu e que fosse colocado nu sobre a terra nua. Não sabemos se, de fato, isso aconteceu. Com esse gesto Francisco mostrou o seu desejo de morrer integrado com a mãe terra. Já debilitado, Francisco de Assis morreu rezando e cantando louvores às criaturas e à irmã morte.

 

Nascido no ano de 1182, na úmbria italiana, Francisco foi um homem que esteve além do seu tempo, ao cantar o amor pela natureza no seu conhecido e eternizado em muitas vozes “Cântico do Irmão Sol”. Escolhido como patrono da Itália e da Ecologia, por João Paulo II, em 1979, São Francisco é lembrado como o homem da “Paz e do Bem” por proclamar que a natureza é a mais alta glorificação do Criador, e que nela somos todos irmãos. É também a paz e não às armas!

 

O olhar de São Francisco é ecológico e não romantizado, como querem alguns. No mundo medieval marcado pela indústria do vidro que queimava madeira, pelos cortumes e abates de animais que poluíam as águas, Francisco clama, já naquela época, por um cosmocentrismo, isto é, a natureza e não o ser humano deve estar no centro da criação, do mundo, do cosmos.

 

Para São Francisco, o ser humano não vale mais que os outros animais, as aves, os peixes e as flores. Não somos superiores a eles. Isso é incrível! Um homem medieval intuir que a vida merece respeito na sua diversidade, que somos parte da cadeia evolutiva da vida e não somos os atores principais, no máximo regentes. E quando não agimos assim, a natureza dá seu recado. Que o diga a entrada do coronavírus no corpo humano.

 

São Francisco foi um profeta que nos convoca a uma conversão ecológica que inclui a natureza e o ser humano. É como disse o Papa Francisco, num discurso na ONU, em 2020: “A crise ambiental é intimamente ligada à crise social e que o cuidado com o ambiente exige uma abordagem abrangente para lidar com a pobreza e combater a exclusão”.

 

Não basta cantar com São Francisco: “Louvado sejas meu Senhor com todas as tuas criaturas!” É preciso buscar novas relações fraternas entre o ser humano e a natureza. “A criação geme em dores do parto” (Rm 8,22). A vida no planeta depende de nós, de uma visão de fraternidade universal humana e ecológica, sem desperdício, sem consumismo desvairado que agride a natureza, mas protegendo o biossistema que clama por paz e bem. E isso depende de mim, depende de você, depende de nossa conversão ecológica. Paz e Bem!

 

 

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