11 Agosto 2021
As pressões do G20 na recente cúpula de Nápoles não foram em vão. Pelo contrário, estão levando a resultados inesperados: “A China eliminou o financiamento de novas usinas a carvão da sua iniciativa Belt and Road e está apoiando projetos hidrelétricos na África”, anuncia Jeffrey Sachs, economista da Columbia University de Nova York (onde fundou e dirigiu por muitos anos o Center for Sustainable Development), consultor para o clima da ONU e referência mundial para todos os ativistas ambientais.
A reportagem é de Eugenio Occorsio, publicada em La Repubblica, 10-08-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Mesmo que não tenha renunciado explicitamente ao uso do carvão para sustentar o seu desenvolvimento, como a Índia, Pequim está começando a compreender que o caminho é um só?
Tenho certeza de que em breve ela começará a sustentar grandes usinas solares, especialmente na África, onde já apoia projetos hidrelétricos. Isso é fundamental, porque se cruza com duas circunstâncias que não podem ser ignoradas: a China já se tornou uma presença dominante em muitos países africanos, e estão em estágio avançado as negociações para inserir a União Africana no próprio G20, que se tornaria G21 e finalmente abriria espaço para uma organização que representa 55 países (mais de um quarto de todos os membros da ONU), nos quais 1,4 bilhão de pessoas vivem (17,5% do total global) e tem um PIB total de 2,6 trilhões de dólares [1,4 quatrilhão de reais], 3% do mundial.
Você acha que, na cúpula de Glasgow em novembro, da qual a de Nápoles foi um passo preparatório, já serão anunciados os dois eventos, a virada antifóssil da China e a entrada da África no G20?
O primeiro provavelmente sim. O segundo – a entrada da África –, eu receio que seja um pouco prematuro. Tenho certeza de que a presidência italiana poderá dar uma grande contribuição com o seu dinamismo e a sua determinação em envolver o G20 em um front: a retomada econômica que já começou, desde que se consiga deixar para trás esta pandemia, requer uma nova arquitetura financeira que torne todos os países capazes de fortalecer os seus investimentos nas tecnologias verdes e digitais. E os países em desenvolvimento devem ser envolvidos.
Não basta mais apenas a África do Sul no G20, que aliás nem é o país com maior PIB do continente, já que foi ultrapassado pela Nigéria e pelo Egito. O momento é crucial: a descarbonização já está ao alcance de preços extraordinariamente baixos, graças aos avanços tecnológicos na energia solar, eólica, nas baterias dos veículos elétricos etc. Todos esses investimentos são capazes de criar muito mais postos de trabalho do que aqueles que serão cortados nos setores em declínio alimentados por fontes fósseis.
Vocês já identificaram os projetos “green” na África e que deveriam ser apoiados?
Claro, há muitíssimos deles. O continente tem um imenso potencial na energia de carbono zero: no Sahel existem gigantescas potencialidades na energia solar; na República Democrática do Congo temos o Grand Inga Project no setor hidrelétrico, que tem 50 GW de potencial; e ainda outros ao longo do Rio Congo. No Rift Valley, na África oriental, está sendo estudada a exploração maciça da energia geotérmica; ao longo da costa do Atlântico parques eólicos estão em desenvolvimento, e assim por diante.
A África, devemos ter isto em mente, tem o potencial para crescer 10% ao ano na presença de estratégias adequadas. E estas terão que se basear na eletricidade sem fontes fósseis, na conectividade digital que, aliás, poderia contribuir fortemente para resolver as lacunas de educação em terras remotas, nos transportes inteligentes. Haverá trabalho para todos na agricultura, com forte valor agregado, na indústria, nos serviços. O G20 – melhor ainda se se tornar G21 – deveria coordenar as estratégias e os financiamentos, reunindo os recursos do Banco Mundial, dos Bancos Africano, Asiático e Islâmico de Desenvolvimento e de muitas outras instituições financeiras.
Professor, o chefe das estratégias globais do Morgan Stanley, Ruchir Sharma, lançou em uma coluna no Financial Times um alerta sobre a chamada “greenflation”, que seria uma série de aumentos de preços e, em geral, de curtos-circuitos financeiros induzidos pela corrida rumo à descarbonização. São preocupações plausíveis?
Veja, eu também li o artigo de Sharma, que decompõe e recompõe uma longa série de variáveis de uma forma que me parece bastante confusa. Então, é verdade que a alta demanda de alguns minerais funcionais à transição – do lítio para as baterias até o alumínio para os painéis solares e ainda cobalto, cobre, manganês, terras raras – está provocando um certo aumento nos preços, mas isso é temporário, porque, no arca de cinco a 10 anos, graças às novas tecnologias, a produção poderá aumentar significativamente.
Além disso, na minha opinião, é totalmente inadequada a preocupação com uma futura falta de combustíveis fósseis, que são necessários na fase de transição para construir as infraestruturas da nova economia. Há uma quantidade tão grande de petróleo e de gás no mundo que temer pela sua escassez é paradoxal e profundamente equivocado. Quanto aos preços, eles dependem da Opep e principalmente da Arábia Saudita, que regulam as torneiras da produção e estarão bem atentas para evitar aumentos excessivos de preços para não acabar fora do mercado.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“China e África vão rumo a um futuro solar: o G20 precisa delas.” Entrevista com Jeffrey Sachs - Instituto Humanitas Unisinos - IHU