14 Julho 2021
"Hoje, o odor proveniente dos sargaços nas costas praianas me traz as sempre boas lembranças do amigo-mar, mas também transmite a triste mensagem da insensatez humana", escreve Carlos Augusto de Medeiros Filho, geoquímico, graduado na faculdade de geologia da UFRN e com mestrado na UFPA e trabalha há mais de 35 anos em geoquímica em pesquisa mineral e ambiental, em artigo publicado por EcoDebate, 13-07-2021.
Gosto quando a brisa do mar traz o cheiro produzido pelo acúmulo de sargaço à beira mar. É uma sensação ocasional, mas comum e que sempre me foi familiar, nessa minha inata e forte relação com o mar.
Como vivi muito tempo fora de Natal e longe do mar, sentia saudades e, por exemplo, em noites de ventos mais fortes na selva amazônica ou nas cidades, eu, algumas vezes, acordava acreditando estar novamente à beira-mar e constatava, desanimado, que era apenas uma ilusão noturna.
Outra vez, estando há meses sem ver o mar, fiz uma viagem ao Rio de Janeiro, mas mesmo lá não tinha oportunidade de ir à praia. Uma noite, em um trajeto de carro, passamos ao longo de uma das avenidas beirando a costa carioca. A noite escura e o carro fechado impediam entender que o mar estava ali perto. Em um breve momento, entretanto, o motorista abriu um pouco a janela e senti, forte, o cheiro do sargaço, como se a maresia saudasse um velho amigo.
É verdade que as episódicas concentrações anômalas de sargaço prejudicam, de algum modo, os banhos e pescarias nas praias, mas esses incômodos são passageiros, durando, em média, uma ou duas marés.
Nesses dias, sempre gostei de caminhar apreciando as variedades das algas marinhas. Esse esporte, já algum tempo, tem seu lado triste, deprimente: junto a linha de sargaços, observamos uma quantidade de lixos antrópicos, sendo, sempre, os plásticos seu componente principal. O mais angustiante é saber que esses plásticos, de rejeitos humanos, são um dos mais graves problemas ambientais do mundo.
Um estudo global publicado na revista científica Nature Sustainability revelou que 80% do lixo encontrado nos oceanos é composto por plástico, sobretudo sacolas e garrafas. Em seguida vêm metal, vidro, roupas e outros artigos têxteis, borracha, papel e madeira processada. Os responsáveis pela pesquisa alertam que a produção irresponsável de artigos plásticos de uso único, o comportamento inadequado de usuários e as deficiências dos sistemas de reciclagem levam a um acúmulo contínuo desses materiais. Por essa razão, os autores propõem maior controle do consumo e produção [1].
Poluição por plástico no oceano (Foto: Naja Bertolt Jensen | Unsplash)
Grandes pedaços de plástico na superfície do oceano chamam atenção. Mas poucos sabem que trilhões de minúsculas partículas com menos de 5 milímetros de diâmetro também flutuam nos mares. Essas partículas acabam na cadeia alimentar. O plâncton marinho, que é uma fonte importante de alimento para peixes e outros animais marinhos, já foi filmado comendo-as. Também os animais maiores sofrem os efeitos do consumo de plástico [1].
Medidas para tentar reduzir o plástico descartável já foram tomadas em alguns países africanos, como proibições de sacolas plásticas, e a União Europeia planeja proibir produtos plásticos descartáveis. Mas se as tendências atuais forem mantidas, cientistas acreditam que haverá 12 bilhões de toneladas de plástico no planeta até 2050 [1].
Hoje, o odor proveniente dos sargaços nas costas praianas me traz as sempre boas lembranças do amigo-mar, mas também transmite a triste mensagem da insensatez humana.
[1] Disponível aqui.
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Triste mensagem no sargaço - Instituto Humanitas Unisinos - IHU