06 Julho 2021
Pela primeira vez uma mulher, Anne Burghardt, teóloga e especialista em ecumenismo, foi eleita Secretária Geral da Federação Luterana Mundial. Ela vem da Estônia, tem 45 anos, estudou teologia na Universidade de Tartu na Estônia, na Friedrich-Alexander-Universität Erlangen-Nürnberg na Alemanha e na Universidade Humboldt de Berlim. Tem um mestrado em teologia e atualmente está concluindo seus estudos de doutorado no campo da liturgia ortodoxa. Substitui no cargo o chileno Martin Junge.
A entrevista é de Renardo Schlegelmilch, publicada por Domradio e reproduzida Setitmana News, 05-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nesta entrevista, ela explica como se desenvolveu seu caminho espiritual e quais são as prioridades de seu novo mandato, com particular referência às relações ecumênicas com a Igreja Católica.
A Federação Mundial Luterana (LWB, na sigla em inglês) é uma comunidade de Igrejas Luteranas que compreende 148 Igrejas membros presentes em 99 países ao redor do mundo. Representa mais de 77 milhões de fiéis.
Sra. Anne, você é teóloga e pároco na Estônia, estudou na Alemanha. É casada e tem dois filhos; seu marido também é pastor e vem da Alemanha. A Estônia é uma região muito secularizada, mais ainda do que a Alemanha. Por que escolheu este caminho de se tornar pároco em tal ambiente?
Eu também venho de uma família secularizada. Meu caminho para a Igreja na realidade começou durante o ensino médio. Era o momento da busca. A Igreja era um lugar que oferecia respostas a questões existenciais ou apresentava um espaço adequado para o aprofundamento desta busca. Daí nasceu meu interesse pela teologia e me dediquei ao estudo teológico. Por fim, fui ordenada e servi a Igreja por quase 20 anos.
Quando tomar posse (em novembro próximo), será a primeira mulher e também a primeira do Leste Europeu a ser Secretária Geral da Federação Luterana Mundial. Algumas opiniões indicam que este é definitivamente um sinal político. Como você vê isso?
Claro que gostaria de pensar que fui escolhida por minha competência pessoal. Havia outros candidatos além dos dois que chegaram na fase final. Depois, a decisão foi tomada apenas entre dois candidatos. Acho difícil julgar por mim mesma se isso foi um sinal político. Pessoalmente, prefiro dizer que não é uma decisão política.
Obviamente, é difícil para mim julgar quais motivos influenciaram os membros individuais do conselho que vieram de todo o mundo. Mas é certamente verdade que as Igrejas da Europa Central e Oriental estejam talvez um pouco na sombra. De fato, elas não usufruem da mesma atenção na Federação Luterana Mundial como em outras regiões. Essas igrejas obviamente se regozijam agora porque esperam que minha escolha chame mais atenção para suas experiências.
Alguns observadores dizem que é uma grande surpresa que você tenha sido eleita. Você também ficou surpresa ou foi algo esperado?
Para mim foi definitivamente uma grande surpresa. Quando me perguntaram se eu me colocaria à disposição, minha primeira resposta na realidade foi um claro não. Depois pensei bastante, e aceitei. Certamente é uma tarefa enorme que me espera. Isso só pode ser superado com a ajuda de Deus e com o apoio de muitos colegas e amigos em todo o mundo.
Você acha que colocará ênfase em prioridades distintas de seus predecessores? Para olhar mais para as Igrejas que estão nas margens?
Considero que a Federação Luterana Mundial em geral está fazendo um ótimo trabalho. Quando fiz minha apresentação, disse que meu desejo era que as três tarefas mais importantes da Igreja - proclamação do Evangelho, culto e oração e serviço aos outros - fossem todas representadas de forma equilibrada. E quero continuar a me empenhar nesse sentido.
Mas, falando agora de prioridades concretas, penso que o fortalecimento da formação teológica é uma das tarefas mais importantes para os próximos anos. De fato, especialmente para algumas igrejas luteranas menores, a grande questão é: como formar as futuras gerações de teólogos? Hoje, muita ajuda chega via online e via zoom. Isso certamente oferece novas oportunidades que deveríamos reforçar. Vejo a importância da formação teológica também no fato de que vivemos cada vez mais em um mundo onde muitas vezes são propostas apenas soluções em preto e branco, simples verdades. Acredito que a teologia luterana, com uma certa abordagem dialética, na qual dois princípios diferentes podem ser afirmados ao mesmo tempo, possa efetivamente ajudar.
Um tema importante que você vem tratando há bastante tempo é o ecumenismo. Entre outras coisas, você contribuiu para organizar o Ano da Reforma de 2017, em cuja abertura também compareceu o Papa Francisco. Do ponto de vista católico, o ecumenismo parece neste momento estar em uma fase difícil, pois não há progressos em matéria, por exemplo, sobre o tema da ceia eucarística. Como você vê o diálogo com os católicos?
Sou de opinião que o diálogo ecumênico entre luteranos e católicos constitui uma das histórias de sucesso do movimento ecumênico. É verdade que olhado ao longo do tempo pode-se facilmente ter a sensação de que tudo não avança com a rapidez necessária, especialmente no que se refere ao tema da hospitalidade eucarística. Mas acho que o próprio aniversário da Reforma em 2017 mostrou o que é possível hoje, algo que ninguém teria imaginado cem anos atrás.
No ecumenismo, simplesmente acontece que algumas coisas exigem um pouco mais tempo do que as pessoas gostariam. Acordos muito importantes já foram alcançados em muitos pontos. É claro que ainda existem questões importantes como a eclesiologia, a compreensão da Igreja e do ministério, sobre os quais teremos que continuar trabalhando.
O que considero um problema candente diz respeito às questões pastorais, especialmente na Alemanha, onde há tantos casamentos de diferentes confissões. Trata-se de um problema que afeta de perto muitas pessoas, pois ainda não existe uma comunhão eucarística oficial entre as Igrejas Evangélica e Católica. Às vezes, isso é um grande fardo, até mesmo para a consciência das pessoas, quando vão juntos para a Ceia do Senhor, apesar da falta de autorização.
As discussões sobre as opiniões doutrinárias demorarão um pouco mais. Para isso, deve-se também considerar qual solução pastoral seja apropriada.
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Uma mulher secretária da Federação Luterana Mundial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU