12 Janeiro 2021
Coincidindo com a festa do Batismo do Senhor, algo que não pode ser visto como mera coincidência, o Papa Francisco assinou um novo "Motu Proprio", intitulado "Spiritus Domini". Esta é uma modificação do cânon 230, parágrafo 1 do Código de Direito Canônico, e se refere ao acesso das mulheres ao ministério instituído do leitorado e acolitado.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Em suas palavras, o Papa coloca como base para sua decisão que esses ministérios são "uma forma particular de exercício do sacerdócio batismal", dando mais um passo no Motu Proprio Ministeria quaedam, com o qual São Paulo VI, em 1972, definiu os "ministérios leigos", que eram reservados aos que se preparavam para "a recepção do Sacramento da Ordem Sagrada", e "a outros fiéis idóneos do sexo masculino".
Como afirma o texto pontifício, pretende-se responder às discussões realizadas em "algumas assembleias do Sínodo dos Bispos", nas quais, segundo Spiritus Domini, "a necessidade de aprofundar doutrinariamente o tema tornou-se evidente, para que possa responder à natureza destes carismas e às necessidades dos tempos, e oferecer um apoio oportuno ao papel de evangelização que diz respeito à comunidade eclesial".
Podemos dizer que esta é uma mudança que tem o Sínodo para a Amazônia como sua principal força motriz, que não devemos esquecer que entre seus objetivos estava a busca de novos caminhos para a Igreja, destacando a força da periferia e do discernimento sinodal. De fato, este foi um pedido expresso que a assembleia sinodal fez ao Santo Padre, como consta no Documento Final do Sínodo: " o Motu Propio de São Paulo VI, Ministeria quaedam, para que também mulheres adequadamente formadas e preparadas possam receber os ministérios do Leitorado e do Acolitado", insistindo em "se promovam e se confiram ministérios para homens e mulheres de maneira equitativa". Não esqueçamos que este documento foi assumido pelo Papa Francisco, autorizando imediatamente sua difusão e oficialmente na Querida Amazônia.
O Documento Final também propôs a instituição de outro ministério, o de "mulher dirigente da comunidade", algo que não é compreendido em outros contextos eclesiais, mas que, na Amazônia, onde a presença sacerdotal é reduzida a visitas esporádicas, não mais do que duas por ano em muitos casos, é mais do que necessário, já que " a maioria das comunidades católicas é liderada por mulheres". Da mesma forma, este documento insiste em fortalecer a participação das mulheres no discernimento e na tomada de decisões. Tudo isso em resposta ao que é dito no documento acima mencionado, que deixa claro que: "É a Igreja de homens e mulheres batizados que devemos consolidar, promovendo a ministerialidade".
Esta insistência em " ampliar os espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja", é algo que faz parte do pensamento do Papa Francisco desde o início de seu pontificado, e foi retomado na Evangelii Gaudium, considerada o programa de seu pontificado. O Sínodo para a Amazônia foi uma oportunidade para deixar claro qual deveria ser o papel da mulher na Igreja: "é necessário que a Igreja assuma em seu seio com maior força a liderança das mulheres, e que as reconheça e promova, fortalecendo sua participação nos conselhos pastorais das paróquias e dioceses, inclusive nas instâncias de governo", algo que surgiu de forma clara e insistente no processo de escuta sinodal.
Muita gente, também o Papa Francisco, é consciente do verdadeiro papel da mulher na Amazônia, onde "há comunidades que se mantiveram e transmitiram a fé durante longo tempo, mesmo decênios, sem que algum sacerdote passasse por lá. Isto foi possível graças à presença de mulheres fortes e generosas, que batizaram, catequizaram, ensinaram a rezar, foram missionárias, certamente chamadas e impelidas pelo Espírito Santo. Durante séculos, as mulheres mantiveram a Igreja de pé nesses lugares com admirável dedicação e fé ardente", como ele diz em Querida Amazônia.
O Papa Francisco, ao falar do papel da mulher na Igreja, sempre quis ir além de uma abordagem funcional, como ele afirma na Querida Amazônia, insistindo que a Igreja, " sem as mulheres, ela se desmorona, como teriam caído aos pedaços muitas comunidades da Amazônia se não estivessem lá as mulheres, sustentando-as, conservando-as e cuidando delas". Ele defende a exigência de "que estimulemos o aparecimento doutros serviços e carismas femininos que deem resposta às necessidades específicas dos povos amazónicos neste momento histórico".
O novo Motu Proprio pode ser visto como uma consequência das palavras em Querida Amazônia, onde se diz que o papel da mulher precisa de "uma estabilidade, um reconhecimento público e um envio por parte do bispo", algo que agora pode ser realizado de forma canônica. Trata-se, como o texto divulgado em 11 de janeiro nos mostra, de enfatizar "a condição comum de ser batizado e o sacerdócio real recebido no sacramento do Batismo", no qual homens e mulheres participam da mesma forma e com a mesma dignidade, algo nem sempre explicitamente reconhecido ao longo da história.
Sabemos que, na prática, isto é algo que foi assumido em muitos lugares e que alguns defendem que se deve ir muito mais longe neste campo. Mas não podemos esquecer que, em uma Igreja sinodal, é fundamental caminhar juntos, evitando querer correr demais ou comprometer-se a tomar uma posição contra os sinais dos tempos. Os frutos do discernimento devem ser assumidos por todos, algo em que, mais uma vez, o Papa Francisco nos deu um exemplo ao tornar efetivo o pedido de uma assembleia sinodal, a primeira em que as mulheres tiveram um papel mais que destacado, ao ponto de, como ele diz, "no Sínodo, elas mesmas nos comoveram a todos com o seu testemunho".
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Leitorado e acolitado feminino, um novo caminho nascido na Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU