23 Dezembro 2020
As quatro eras da inteligência artificial podem ser resumidas assim: a primeira fase pretendia responder à pergunta “O que aconteceu?”. A segunda quis ir mais fundo para responder à pergunta “Por que aconteceu?”. A terceira, aquela em que estamos imersos, tem como objetivo principal entender o que vai acontecer no futuro, com base naquilo que aconteceu e nos motivos pelos quais aconteceu. Assim começa a quarta época, chamada de Intuição Artificial.
A reportagem é de Giuditta Mosca, publicada por Business Insider, 22-12-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Para entender o que é, como funciona e quais objetivos ela estabelece, contamos com a colaboração de Jonni Malacarne, CEO da empresa BlueTensor Srl, de Trento, na Itália, que ele cofundou com Federico Lucca e que desenvolve soluções de inteligência artificial.
“A intuição artificial é uma forma de inteligência artificial evoluída, que é capaz de resolver problemas de forma mais autônoma. A intuição é uma técnica que dá respostas imediatas, sem necessidade de ser treinada, sem que alguém lhe dê um método para encontrar uma resposta a um problema.”
Entre as diversas estratégias para treinar algoritmos, surgem os sistemas supervisionados e os não supervisionados, típicos da intuição artificial.
“A intuição artificial – continua Malacarne – trabalha mais com os algoritmos e menos com os dados para extrair informações de valor. Um sistema supervisionado é o do Google Lens, um aplicativo que reconhece um objeto fotografado por meio de um sistema de reconhecimento treinado em muitos objetos semelhantes.”
Por exemplo, ele reconhece uma flor porque a compara com as imagens de flores que já “conhece” e das quais tem memória.
Para compreender plenamente os sistemas não supervisionados típicos da intuição artificial, é preciso se voltar para uma abstração da mente, como explica Malacarne: “Um sistema não supervisionado se presta a grandes quantidades de dados heterogêneos que seriam impossíveis de rotular”.
Um trabalho mais dedicado à qualidade que, examinando os dados, é capaz de identificar o contexto dos próprios dados e derivar anomalias, usando uma lógica que se adapta ao contexto detectado.
A intuição artificial, embora hoje ainda estejamos no alvorecer dessa fase evolutiva dos algoritmos, é utilizada principalmente em âmbito bancário e financeiro, e permite encontrar, entre a miríade de transações e operações realizadas em curtos períodos de tempo, aquelas que são anômalas. A capacidade intuitiva (tipicamente humana) é integrada nos algoritmos de inteligência artificial.
Para ser alimentada, a intuição artificial precisa de dados de input (como dito, ela dá o seu melhor com enormes conjuntos de dados heterogêneos) e, desprovida de conteúdos humanos quanto aos objetivos a serem alcançados, extrapola a melhor solução possível para o contexto em que é aplicada.
Existem alguns aspectos da profissão de cientista de dados que são solicitados mais do que outros. A rotulagem de dados não é mais confiada ao ser humano, precisamente porque a intuição artificial trabalha com enormes conjuntos de dados heterogêneos muito difíceis de catalogar; por outro lado, permanecendo fiel ao exemplo do âmbito financeiro, o algoritmo não supervisionado retorna uma lista das transações suspeitas, mas caberá depois à intervenção humana entender se são lícitas ou não. Mas isso, que pode parecer uma regressão, é exatamente o contrário. O cientista de dados pode se concentrar em trabalhos mais gratificantes e até “visionários” a seu modo.
É até difícil de prever aquilo que nos espera, dito com toda a franqueza, porque parece que os limites estão na criatividade do ser humano e na sua capacidade de integrar as peculiaridades da natureza com as das máquinas.
O que está sendo feito hoje é pioneiro, é claro, mas mostra um potencial considerável: o designer Maurice Conti, depois de ter montado em um carro aquilo que ele chama de “sistema nervoso” (ou seja, sensores) e de ter feito com que ele rodasse por uma semana no deserto, registrando e coletando bilhões de dados, confiou a uma inteligência intuitiva a tarefa de desenhar o melhor chassi possível para um carro que precise se mover em um percurso semelhante. O resultado é visível no vídeo abaixo:
Sem dúvida, um ser humano nunca teria criado algo assim. Partindo dos dados de input (os quatro bilhões de dados coletados pelos sensores montados no carro) e sem rédeas relativas ao output, deixando a inteligência artificial se adaptasse por si só ao objetivo final da sua tarefa, ela retornou esse resultado.
Em colaboração com o designer Joris Laarman, Conti projetou uma ponte que constrói a si mesma sem a intervenção humana, como mostra o vídeo abaixo:
Os braços robóticos que imprimem a ponte pegam dados de sensores que dão informações tanto sobre o andamento da obra quanto sobre o uso dos materiais.
Como diz Conti, “uma vez iniciada, os robôs imprimirão a ponte até que o trabalho seja concluído, sem intervenção humana”.
Chama-se JanusNode (pode ser baixado gratuitamente aqui) e é um algoritmo que amplia as capacidades do McPoet, um software dos anos 1990 para a geração computadorizada de texto. Ele utiliza uma linguagem poética em contínua evolução e, ainda em 2012, foi publicado um livro inteiramente escrito por aquele que era um protótipo dos algoritmos do setor: “You can bring an elephant to a Broadway show, but you cannot make it drink Chablis: 365 computer-generated excuses to converse” (Você pode levar um elefante a um espetáculo da Broadway, mas não pode obrigá-lo a beber Chablis: 365 pretextos gerados por computador para uma conversa).
Porém, tudo isso é pré-história. Hoje, com o Generative Pre-Trained Transformer 3 (GPT-3) é possível produzir – graças ao deep learning – textos mais elaborados e mais semelhantes aos que uma pessoa de carne e osso escreveria. Em setembro passado, um editor do Guardian pediu a um modelo GPT-3 que escrevesse um artigo, atribuindo-lhe apenas o tema a ser abordado, a linguagem a usar (de fácil compreensão) e o número de palavras a serem escritas. O resultado é um artigo de paz [disponível em inglês aqui] com o qual a inteligência artificial declara que não quer exterminar o gênero humano.
Inteligência intuitiva, inteligência generativa e inteligência autorregressiva (que se baseia em modelos probabilísticos) são o futuro, que já começou, da contribuição que o ser humano, as máquinas e os algoritmos podem dar uns aos outros.
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Depois da inteligência, vem aí a intuição artificial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU