05 Novembro 2020
As estações com seus dias tão diferentes: neve e gelo, chuva e neblina, depois o sol, o suave aquecer, as flores nos campos, as nuvens de pólen ao vento, o milho e o feno nos campos, os frutos nas árvores ... e, novamente, recomeça-se tudo de novo. A terra com suas cores, o ar que é névoa ou umidade, mas também brisa e perfume, e o fogo que arde e incendeia ou aguarda sob as cinzas, e a água, calma do lago ou violento de uma cachoeira, etc.: os elementos – a que todas as cosmogonias se reportam – dos quais se origina toda substância da qual a matéria é composta. O firmamento: que é, aliás, nuvens e céu "o céu dentro de nós e abaixo de nós e acima de nós e ao nosso redor", é sol – que surge, que brilha, que se põe – e a lua – cheia ou delgada, a lua de sempre e até mesmo nova, e é planetas e estrelas. O bestiário, onde – sejam borboletas ou carneiros, pássaros ou coelhos, cavalos ou cobras, veados ou abelhas – deve-se falar de "criaturas". E as árvores, nos bosques, nas colinas, nas montanhas, dentro da floresta que se transforma em santuário (ver o texto desta página). Uma grande parte dos escritos de Thomas Merton sobre a natureza são agora reunidos em uma antologia intitulada Gli abissi infiniti del cielo (Os abismos infinitos do céu, em tradução livre), editada por Kathleen Deignan, prefácio de Thomas Berry (Queriniana, p. 192, euro 16), onde corretamente a curadora pode escrever que o famoso monge filho de pintores paisagistas, alma franciscana e coração cisterciense, espírito celta e mente zen "confirmando-se aqui como mestre espiritual, despertará o poeta, ou o místico, que está dentro de cada um de nós".
Gli abissi infiniti del cielo
A reportagem é de Marco Roncalli, publicada por Avvenire, 03-11-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Suas reflexões, de fato, sejam prosa ou poesia, acabam envolvendo o leitor, convidando-o à contemplação solitária, senão a uma prece selvagem, diante de toda expressão do variegado mundo natural, em todo caso sempre epifania do divino, ou vestígio revelador da presença do Criador em cada criatura. Retirados das inúmeras obras daquele que talvez seja o autor contemporâneo de textos espirituais mais publicado, essas passagens, muitas vezes traduzidas para o italiano pela primeira vez, parecem ter mais de uma fonte de inspiração em autores como Bernardo de Claraval, Hildegarda de Bingen ou outros escritores medievais para quem o mundo natural era o centro de seu pensamento. Thomas Berry está bem convencido disso, pois ao abrir essas páginas, observa: “Hoje, no século XXI, nos encontramos em um momento crítico em que as tradições religiosas necessitam reconhecer novamente o mundo natural como primeira manifestação do divino à inteligência humana”.
E acrescenta: “A falta de sentido do sagrado constitui a carência fundamental de muitos dos nossos esforços para adaptar a presença humana ao mundo natural de forma ecológica e ambientalista”. É essa ausência persistente em nós, ou pelo menos essa não percepção, que, de fato, nos faz olhar cada elemento ou porção desse mundo natural, como um bem de consumo, que pode ser comprado, usado, vendido..., certamente não venerado e considerado um dom sagrado, muito menos um sinal ou mesmo uma palavra divina no extraordinário glossário do universo. E há mais a destacar. Porque aqui Merton mais do que um guru capaz de indicar caminhos meditativos precisos a trilhar, assume a forma de um místico que nos convida a mergulhar em comunhão com a natureza consciente de ter que dar voz a uma nova responsabilidade ecológica.
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O monge trapista que viu na natureza um grandioso santuário - Instituto Humanitas Unisinos - IHU