23 Julho 2020
"Qualquer que seja a opinião da Igreja francesa, a reforma bioética deveria se tornar realidade em breve. O cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado, está prestes a viajar para a França, onde o Vaticano decidiu programar suas primeiras viagens, após o bloqueio devido ao 'cisne negro' da epidemia. Em resumo, também na Santa Sé poderiam ter percebido a necessidade de mostrar proximidade a um episcopado em luta 'contra' o presidente da República", escreve Francesco Boezi, em artigo publicado por Inside Over, 22-07-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
A Igreja francesa, imersa em um quadro cultural em que a secularização já não consegue ser notícia, não está mais alinhada com Emmanuel Macron.
Este é o sentimento que vem do país. A fratura, após uma lua de mel que durou alguns meses após a instalação no Elysée do líder do En Marche!, começou a se desgastar devido a protestos sociais, com a reforma da previdência e os tumultos dos coletes amarelos. Hoje, porém, com a firme vontade de Macron de aprovar a reforma bioética no curto prazo, o episcopado francês parece ter vestido um verdadeiro e próprio escudo. Os tons que vêm dos ambientes eclesiásticos são duros. O projeto de Macron é percebido pela base católica como um ataque à tradição francesa.
É interessante notar que a bioética esteja interessando os governos europeus nesta fase, que devido à pandemia poderia se basear apenas, se não unicamente, nos esforços a serem tomados para sustentar o colapso econômico. Na Itália, o projeto "Zan-Scalfarotto" (lei contra a homofobia) está sendo discutido. Na França, a maioria do centro-esquerda não recua um milímetro nesse projeto estrutural, que introduziria efetivamente a possibilidade de acesso à reprodução assistida para todas as pessoas de sexo feminino. Quem pensa assim, por exemplo, é D. Michel Aupetit, arcebispo de Paris, firme conservador e desde sempre engajado na batalha contra aquilo que os católicos definem de "declive escorregadio": "Existem reformas importantes que foram adiadas e aguardam ser atualizadas", disse Aupetit, de acordo com o relatado pela Agência Sir. E mais ainda. "Que urgência há para aprovar com pressa em julho esse conjunto de leis que tocam a verdadeira essência de nossa humanidade?".
Antes que a pandemia de Sars-Cov2 obrigasse todos a ficar em casa, os franceses já haviam saído às ruas para se manifestar contra a reforma bioética de Macron. De acordo com o que foi apurado pela fonte acima mencionada, é todo o episcopado francês que tomou posição, falando de uma lei tanto "injusta" quanto "iníqua". Estendendo a possibilidade de acesso à fecundação assistida, Macron coloca sob cerco o próprio conceito de "família tradicional", na opinião dos católicos. No mínimo porque, além de introduzir um instituto - o da procriação - que continua sendo bastante discutido, Macron permitirá, por exemplo, que alguns casais LGBT possam ter esperança de uma "inseminação artificial". O qual, para o catolicismo tradicionalista francês, só pode representar um cerco e uma aprovação, direta ou não, do que é chamada de "teoria de gênero".
“A pandemia de Covid-19 revelou nossa fragilidade humana e econômica. A lei da bioética aumentará a confusão?”, perguntou Dom Pierre d'Ornellas. O fato de a Igreja católica, mesmo depois do que aconteceu em Nantes, continua sendo um sinalizador do clima político: Macron passou de ser majoritário para ter que barganhar pequenos segmentos de consenso entre a opinião pública. Pesquisas também atestam a tendência. Embora ainda faltem dois anos pelas eleições presidenciais, não se pode esquecer que apenas o sistema de dois turnos, permite a Macron a possibilidade de argumentar com relativa serenidade sobre o próximo biênio.
Qualquer que seja a opinião da Igreja francesa, a reforma bioética deveria se tornar realidade em breve. O cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado, está prestes a viajar para a França, onde o Vaticano decidiu programar suas primeiras viagens, após o bloqueio devido ao "cisne negro" da epidemia. Em resumo, também na Santa Sé poderiam ter percebido a necessidade de mostrar proximidade a um episcopado em luta "contra" o presidente da República. A França, antes mesmo da Itália, está prestes a deixar de ser uma "exceção" no cenário legislativo continental, onde o útero de aluguel foi parcialmente liberado.
Apesar das mobilizações da base dos fiéis e dos líderes eclesiásticos, Macron não tem intenção de mudar de ideia.
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Acabou o idílio entre a Igreja francesa e Macron - Instituto Humanitas Unisinos - IHU