19 Mai 2020
"Quase todos pensaram na possibilidade concreta de serem infectados e morrer. Nunca - eles me disseram - tivemos a morte tão presente, nunca estivemos tão conscientes de nossa fragilidade", escreve Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 18-05-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Começamos a vislumbrar o fim da epidemia que perturbou profundamente nosso estilo de vida. Algo imprevisível, impensável aconteceu. Vivíamos em um mundo doente, mas não passava pela nossa cabeça a ideia de poder adoecer tão cedo e dessa maneira. E eis então a chegada inesperada de um mensageiro devastador, o coronavírus. Alguns virologistas fizeram suposições remotas sobre a possibilidade de tal ataque. Apenas alguns, sentinelas capazes de discernir os passos da humanidade, denunciavam quase profeticamente, embora de maneira confusa, que "estávamos correndo demais, era preciso parar". Sem uma mudança concreta - diziam - teríamos acelerado uma crise de proporções desconhecidas e impensáveis.
É significativo que esse flagelo tenha caído sobre uma sociedade treinada para pensar na "crise", exercitada para combatê-la de várias formas: a crise econômica, a crise financeira e aquela social. Tudo isso no âmbito de nossos países ricos, que fazem parte do "primeiro mundo", onde reinam o mercado, o desenvolvimento, o consumo e a vida opulenta, enquanto os fracos, os pobres e os "descartados" ficam cada vez mais escondidos. E assim as porções "alegres e vencedoras" da humanidade tiveram que fazer as contas com a fragilidade, o sofrimento, até uma morte desesperada.
Nesse período, ouvi muitas pessoas, na solidão do meu eremitério pensei e tentei interpretar o que estava acontecendo. Enquanto ouvia, percebi muito medo e angústia por esse vírus que vagava entre nós, invisível e desconhecido; um vírus diante do qual não são possíveis defesas típicas dos ricos, daqueles que podem contar com seu próprio poder. Em particular, os idosos com mais de setenta anos, açoitados pelos boletins das mortes e pelos pedidos de "entrar na fila" em relação aos mais jovens e mais fortes, tiveram momentos de desconforto. Quase todos pensaram na possibilidade concreta de serem infectados e morrer. Nunca - eles me disseram - tivemos a morte tão presente, nunca estivemos tão conscientes de nossa fragilidade.
Dessa forma, a crise tornou-se uma questão sobre a fragilidade e o limite da morte, da qual ninguém pode escapar. Também descobrimos os limites da ciência, da medicina, de muitas realidades que antes nos pareciam garantias tranquilizadoras, em nível pessoal e social. Muitos dizem: “Nós escapamos. Em breve celebraremos!”. Essa reação vitalista é justificada, mas não deve obscurecer em nós o sentido do limite que (re) descobrimos, nem o evento da morte, que aguarda a todos e pode chegar inesperadamente. Não creio que nesta crise tenhamos nos tornados automaticamente melhores, mais solidários e mais capazes de prestar atenção ao outro. Isso depende da nossa vontade e de nossas escolhas precisas, a serem renovadas a cada dia. Mas se hoje estamos mais conscientes do limite e da morte, então - como afirma o filósofo humanista Salvatore Natoli - "tendo em mente a morte, estaremos menos inclinados a prevalecer sobre os outros". Já isso não seria pouca coisa!
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Redescobrir o sentido do limite. Artigo Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU