11 Fevereiro 2020
Sebastien-Roch Nicolas, conhecido como Chamfort (1741-1794), teria escrito esta frase, considerada como um projeto de vida: “O pessimista queixa-se do vento, o otimista espera que mude; o realista prepara as velas”.
Portanto, sejamos conscientes de que a narração midiática reduzirá a Exortação a títulos de poucas palavras: “O Papa disse sim” ou o “O Papa disse não”.
O comentário é de Luis Badilla, jornalista, publicado por Religión Digital, 09-02-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Atribui-se ao escritor francês Sebastien-Roch Nicolas, conhecido como Chamfort (1741-1794), esta frase considerada como um projeto de vida: “O pessimista queixa-se do vento, o otimista espera que mude; o realista prepara as velas”. A nós, quando faltam três dias para a publicação da Exortação Apostólica Pós-Sinodal do papa Francisco, “Querida Amazônia”, parece-nos realmente que esse pensamento, que se tornou um aforismo, é muito útil para nos prepararmos ao que acontecerá na quarta-feira, 12-02, e nos dias seguintes.

Certamente o sistema mundial de meios de comunicação centrará a narração na “resposta” do Pontífice às considerações do parágrafo 111 do Documento Final onde os padres sinodais propõem e sugerem que o Pontífice autorize a ordenação sacerdotal de homens casados.
Concretamente, a narração midiática será fortemente hegemonizada pela comparação entre o que Francisco escreve em sua quinta Exortação e o que se lê no Documento Final do Sínodo: “Considerando que a diversidade legítima não prejudica a comunhão e a unidade da Igreja, mas a manifesta e serve (LG13; SO 6) O que testemunha a pluralidade de ritos e disciplinas existentes, propomos estabelecer critérios e disposições por parte da autoridade competente, no âmbito da Lumen Gentium 26, para ordenar padres a homens da comunidade adequados e reconhecidos, que ter um diaconado permanente frutífero e receber formação adequada para o presbiterado, poder ter uma família legitimamente constituída e estável, para sustentar a vida da comunidade cristã através da pregação da Palavra e da celebração dos sacramentos nas áreas mais remotas da região Amazônia. Nesse sentido, alguns defenderam uma abordagem universal ao problema”.
“Com as velas bem preparadas e com inteligência será possível navegar durante muito tempo”
É certo que a exortação não terá como tema central essa questão dos padres casados. Sobre esta houve um debate particular nos últimos três anos, no contexto de preparação e realização do Sínodo Pan-Amazônico. A Exortação, como o próprio papa Francisco antecipou em seu discurso de encerramento da assembleia, aponta para “o corpo do Sínodo que são os diagnósticos que fizemos nas quatro dimensões” (26-10-2019).
É evidente que a perspectiva adequada para a leitura e a interpretação do documento não pode prescindir deste “corpo” e isso significa que é preciso seguir todo o caminho, o processo em curso, evitando absolutizar leituras parciais, desligadas do corpo no qual o todo encontra sua verdadeira e justa dimensão. A palavra “corpo” usada pelo Papa, e que também lemos como “organismo”, não é secundária.
Dito isso, não obstante, deve se entender – essa é a nossa referência ao realismo – que do ponto de vista midiático o centro, ao menos na imediatez (um componente intrínseco da comunicação atual), será a questão da ordenação dos homens casados nas regiões da Amazônia. Não somente: a pergunta será reduzida a títulos de algumas poucas palavras “o Papa disse sim” ou “o Papa disse não”.
Essa é a situação e a realidade a qual enfrentaremos a partir do meio-dia, horário de Roma (no Brasil às 9h), na quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020... Ninguém deve se queixar do vento. Trabalhemos para mudar a direção do vento. Porém, sobretudo, arrumemos as velas. Isso é, façamos leituras imparciais, contra os impulsos causados pela imediatez e a simplificação, por um estímulo coral para ir mais além e contar com humildade, paciência e transparência para com todo o corpo sinodal. E não deve ser feito por um só dia ou uma só semana, mas sim por muito tempo.
Recordemos, no entanto, que a primeira ação a ser feita é evitar a narração acrítica, as frases retóricas e estridentes, o comportamento e a linguagem polvorosa e imatura dos que buscam aplausos em lugar de explicações.
Com as velas bem preparadas e com inteligência será possível navegar por muito tempo. É uma questão de realismo.
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"Esperar a Exortação Pós-Sinodal de Francisco com realismo", adverte o vaticanista Luis Badilla - Instituto Humanitas Unisinos - IHU