19 Dezembro 2019
Os populismos europeus e as revoltas na América do Sul são "uma contrarreação ao neoliberalismo extremo e o impulso aos máximos lucros" que deixaram por trás de si "uma sensação de falta de justiça social". E para combater as desigualdades é necessário abrir a era do "capitalismo responsável". Um sistema em que as empresas "não são apenas um fator econômico, mas organismos sociais". Julgadas não apenas por seus lucros, mas também "medindo os efeitos negativos e os custos externos de seus produtos para incentivar investimentos responsáveis que respeitem o meio ambiente e a coesão social".
A entrevista é de Ettore Livini, Holger Zschaepitz e Pierre Veya, publicada por la Repubblica, 18-12-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
As palavras de Klaus Schwab têm um peso específico importante. O engenheiro alemão de 81 anos é o fundador e diretor do Fórum Econômico Mundial. E há meio século é o organizador e a alma do "Fórum de Davos", em que os políticos e empresários mais poderosos do mundo convergem a cada ano para fazer uma avaliação sobre o estado de saúde do mundo.
Como o mundo mudou desde que, há 50 anos, se iniciaram os encontros de Davos?
Hoje é muito mais perigoso e imprevisível. Em 1971, convivíamos com a Guerra Fria e um sistema bipolar em uma espécie de conflito congelado. Agora, vivemos em um planeta frágil, com muitas tensões onde pequenos centros de poder - estados e outros - são capazes de usar a força de maneira mais assimétrica, causando muito mais dano com meios relativamente limitados. Basta pensar nos últimos mísseis lançados pelo Irã na Arábia Saudita.
É um mundo também caracterizado por fortes tensões sociais, pelo retorno de populismos e dos protestos de rua como na França e na América do Sul. Quanto pesa o problema das desigualdades sobre esses fenômenos?
Existe uma sensação evidente de falta de justiça social, acentuada pelo boom das mídias sociais. É uma reação ao liberalismo extremo e ao impulso para a maximização dos lucros. No passado, era possível justificar a globalização sem limites, alegando que produzia mais vencedores que vencidos. E, de fato, é preciso ser dito, arrancou milhões de pessoas da pobreza. Mas hoje o pêndulo está voltando. Graças à web, existe uma nova consciência de que o acesso à saúde, escolas e condições de vida decentes para todos é fundamental. Ninguém pode ser deixado para trás. E aqueles que ficam para trás têm a capacidade de se mobilizar facilmente, como mostram os coletes amarelos.
Qual é a vossa resposta a essas tensões?
É o ‘stakeholder capitalism’ de que falamos no novo manifesto de Davos. As empresas não são apenas realidades econômicas, mas também organismos sociais. E não devem ser julgadas apenas pelos lucros, mas também medindo os efeitos negativos e os custos externos de seus produtos. Calculando os danos ambientais que criam ou quanto promovem de inclusão e a justiça social.
É possível encontrar uma fórmula contábil para diferenciar empresas "boas" daquelas menos atentas ao mundo ao seu redor?
Estamos tentando. Não vai ser fácil, vai levar anos. Mas o objetivo é ter essa ferramenta para permitir aos investidores apoiar apenas empresas e projetos que se comportem de maneira socialmente responsável. Inclusive os países individuais não deveriam ser julgados apenas pelo PIB. Para entender melhor o desempenho de uma nação, é necessário adicionar parâmetros que considerem o bem-estar de seus cidadãos.
O mundo aprendeu a lição da crise de 2008?
Não, é uma das minhas principais preocupações. Desde a década de 1970, bancos e finanças perderam todo contato com a economia real. Evitamos o pior, mas ainda não pagamos por completo a conta pela salvação do mundo da quebra global. As dívidas mundiais dobraram, temos taxas negativas. E não sabemos como sair dessa armadilha. Se aumentarmos as taxas, corremos o risco de explodir uma avalanche de títulos societários. A chuva de liquidez dos bancos centrais não aumentou a rentabilidade, que permaneceu estável. O mesmo discurso vale para o estímulo fiscal do Japão ou os impostos mais baixos de Donald Trump, que não incentivaram os investimentos, mas aumentaram os buy-back no mercado de ações. Estamos caminhando em direção a um futuro nebuloso para as políticas econômicas.
O Fórum Econômico Mundial é considerado o templo da globalização. O que você acha da guerra de impostos?
Eu nunca fui favorável de uma globalização aberta e sem coração. Precisamos encontrar um equilíbrio entre a abertura do mercado e a necessidade de salvaguardar a coesão social. Sem coesão social, não há democracia.
Davos celebrará seu 50º aniversário em 2020. O lema do Fórum Econômico Mundial é "tornar o mundo um lugar melhor". Vocês conseguiram?
É importante ter objetivos ideais para enfrentar situações específicas. Trabalhamos para reduzir o plástico nos oceanos, para promover a igualdade de gênero. E temos um impacto. A Aliança Gavi, por exemplo, nascida há 20 anos em Davos, permitiu vacinar 700 milhões de crianças, salvando 14 milhões de vidas.
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"Nunca mais lucros sem uma ética". Entrevista com Klaus Schwab - Instituto Humanitas Unisinos - IHU