11 Dezembro 2019
Quando se pergunta ao botânico Francis Hallé (Seine-Port, França, 1938) como se interessou por plantas, responde: “Como não poderia me interessar?”. Esta resposta resume a paixão pelo mundo vegetal desse professor emérito da Universidade de Montpellier. Hallé ficou famoso nos anos 1990 por suas expedições em balão de ar quente sobre as florestas tropicais. Sua principal descoberta é a arquitetura das árvores. Cada espécie é uma combinação concreta de algumas características: ramos verticais e ramos horizontais, flores nas laterais dos galhos e na ponta, e assim por diante. Existe milhares e milhares de combinações possíveis, mas todas as árvores conhecidas usam apenas 24 delas e ainda não se sabe o motivo. Hoje, o cavalo de batalha de Hallé é a inteligência vegetal. Ele falou sobre isso em Barcelona, por ocasião dos 20 anos do Jardim Botânico da cidade.
A entrevista é de Michele Cantanzaro, publicada por El Periódico, 21-10-2019. A tradução é do Cepat.
Como as plantas podem ser inteligentes se não têm cérebro?
Também não têm pulmões e, no entanto, respiram. Não têm olhos, mas podem ver a luz. Não têm aparelho digestivo, mas se alimentam. Que a inteligência precisa de um cérebro é o que vemos no dicionário. Mas, quem o escreveu? Um ser humano, que definiu inteligência à sua imagem e semelhança.
Um exemplo de inteligência vegetal?
Uma floresta mediterrânea pode queimar completamente e, no entanto, os ciprestes permanecem verdes. Quando o fogo se aproxima de um cipreste e atinge 60 graus, a árvore expele para a atmosfera, na forma de gás, as substâncias inflamáveis que contém em seu organismo. Quando o fogo chega, não há nada para queimar. Mas o mais interessante é que essas substâncias vão com o vento para outros ciprestes que estão distantes. Quando os alcançam, fazem o mesmo, muito antes do fogo chegar. A comunicação entre árvores é a primeira pedra da inteligência vegetal.
Mas isso é uma anedota...
Vou te dar outro exemplo. Há um experimento britânico com uma planta trepadeira, a passiflora jovem, colocada ao lado de um pau. A planta puxa um tentáculo para agarrar o pau, mas antes de alcançá-lo, os cientistas movem o pau cinco centímetros para a direita. Então, a planta leva outra gavinha para a nova posição do pau. Antes de alcançá-lo, os cientistas recuam o pau cinco centímetros para a direita. Após repetir isso quatro vezes, a planta já leva a gavinha orientada mais cinco centímetros à direita da posição do pau. Não sabemos como, mas tem capacidade para se antecipar.
Ou seja, as plantas aprendem?
Não só isso, se antecipam. Um colega japonês tem uma árvore perto de seu laboratório com um eletrodo embaixo da casca e outro entre as raízes, conectados a uma tela. O visor mostra um sinal regular. Se a curva se tornar muito irregular, significa que depois de um tempo haverá um terremoto. As raízes de uma árvore são como uma enorme antena subterrânea.
É verdade que as árvores são tímidas?
Timidez refere-se ao fenômeno pelo qual árvores da mesma espécie tendem a não se tocar. Cada árvore sabe se existe uma vizinha e se pertence à mesma espécie. Se for esse o caso, o crescimento de seus galhos e folhas se desenvolverá desde que não entrem em contato com os da vizinha. Não sabemos para que serve, que sentido evolutivo isso tem.
Qual é a coisa mais inteligente que você já viu uma planta fazer?
O mais inteligente é a descentralização. Viver como uma planta é difícil, todo o seu organismo é comestível, há muitos herbívoros e não podem escapar. No ser humano existem órgãos vitais. Isso seria perigoso para uma planta. A solução é descentralizar tudo: em todas as células de uma planta há tudo o que é necessário para criar a planta inteira. Se você coloca uma célula vegetal no meio de uma plantação, após alguns meses, a planta inteira aparecerá. Essa estratégia oferece às plantas uma enorme resiliência.
A questão da inteligência vegetal é uma metáfora?
As plantas são inteligentes, talvez mais do que nós. Somos tecnicamente excelentes, mas produzimos uma degradação ambiental. As plantas melhoram seu ambiente. As raízes produzem tudo o que é necessário para sustentar uma fauna enorme e fertilizam o solo. Nós enchemos o solo com produtos químicos e se torna um deserto.
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“As plantas são inteligentes, talvez mais do que nós”. Entrevista com Francis Hallé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU