22 Novembro 2019
Antonio Landi, professor de Sagradas Escrituras na Pontifícia Universidade Urbaniana, publica os cinco discursos proferidos durante as conferências organizadas pela arquidiocese de Amalfi-Cava de' Tirreni em fevereiro - março de 2018. Ele pensa que, se o Cristo que sofre e morre, é sentido de maneira bastante próxima pelas pessoas, o Jesus ressuscitado parece distante do universo mental da maioria e o evento da ressurreição é paradoxal, pois desafia, inclusive hoje, a indiferença das pessoas.
O artigo é de Roberto Mela, publicado por Settimana News, 19-11-2019. A tradução é de Luísa Rabolini.
Noffke, pastor valdense e professor da Faculdade Valdense de Teologia em Roma, oferece uma discussão muito interessante sobre o tema da vida eterna no AT e na literatura médio judaica.
LANDI, Antonio (org.)
Il paradosso della risurrezione. Alle origini della fede cristiana
EDB, Bologna 2019, pp. 160
No AT, a imortalidade era prerrogativa de Deus e para os mortos era prevista apenas a morada no Sheol. Pouco a pouco, porém, surgiu o debate sobre se, a partir da concepção do "Descanso" e da figura nobre dos mártires macabeus, houvesse uma possibilidade de vida além daquela terrena. Com em Daniel 12 e o 2 Macabeus 7, chegou-se à afirmação explícita de uma vida após a morte.
Além da posição dos saduceus, contrários à ressurreição, também no campo do médio judaísmo (século IV a.C. - século II d.C.), inaugura-se uma discussão que se abre cada vez mais para prospectar a existência de uma moradia onde se descanse enquanto se aguarda o julgamento (e, portanto, onde o corpo não é dissolvido pela morte). O livro médio judaico de 1Enoque - Noffke nunca usa os termos "apócrifos AT", ou "textos intertestamentários" ou "paramentestamentário" - em algumas partes de sua estratificação, atesta a existência de moradias separadas para os justos e os injustos e um lugar de "grande tormento" em que as almas dos injustos são punidas (forte semelhança terminológica com Lc 16,19.31, a parábola de Lázaro e o epulão).
Em Qumran, já se tinha certeza de participar da vida eterna pelo fato de viver em comunidade na pureza e graças às várias celebrações litúrgicas cotidianas. No judaísmo helenístico, prevalece a concepção da imortalidade da alma (Fílon de Alexandria, Pseudo Focilides, 4Macabeus). Se no Apocalipse de Sofônias são descritas as penas reservados para as almas dos ímpios, sem a perspectiva de uma ressurreição futura, mas para as quais existe um espaço de arrependimento e de intercessão alheia, em 4 Esdras isso é excluído decisivamente e tudo termina com a conclusão da vida humana.
2Mac 12,39-45 mostra a possibilidade da oração de sufrágio e intercessão pelos mortos necessitados de purificação de seus pecados: "Judas [Macabeu] ofereceu um sacrifício para o perdão dos pecados. Foi um gesto belo e nobre, sugerido por sua confiança na ressurreição. De fato, se Judas não julgasse que os soldados mortos ressuscitariam, teria sido vão e supérfluo rezar por eles" (2Mac 12,43b-44). Juntamente com as reflexões do Eclesiástico, isso levou à maturação de um debate cultural-religioso em que Jesus de Nazaré se viu atuando.
Marcheselli-Casale reflete sobre as idas e vindas pós e pré-pascais nos passos do Ressuscitado, a partir do testemunho de Mt 28,1-20. Após o relato sobre o túmulo vazio e a inclusão do Sondergut de Mateus do episódio dos guardas, o autor analisa - às vezes com uma terminologia não fácil de seguir - o episódio do Ressuscitado que encontra os Onze na Galileia e confia-lhes o grande mandato. A experiência do evento pascal no encontro remete aos ditos e fatos feitos pelo Jesus terreno, que deve ser objeto de "fazer discípulos" todo o povo, junto com a realização do batismo com fórmula trinitária que surgiu muito cedo (de acordo com o autor).
Os textos que contam a ressurreição de Jesus em Lc-At são estudados por A. Landi. Ele encontra neles um processo que parte do reconhecimento e termina no testemunho (encontro com as mulheres, com os Onze, com os discípulos de Emaús, ascensão e missão aos Onze em Atos 1,1-11).
O indício insuficiente do túmulo vazio nos leva a refletir sobre o fato de que somente na memória viva das palavras de Jesus pode-se chegar a um entendimento dos eventos, e não apenas de sua pura facticidade. As palavras de Jesus e as Escrituras revelam a coerência do itinerário de Jesus que da cruz flui para a ressurreição. Finalmente, o Ressuscitado é reconhecido na comensalidade: ele é reconhecido pelos dois de Emaús ao partir o pão e comer diante dos Onze.
Os Atos apresentam o itinerário dos discípulos que, a partir do reconhecimento dos Ressuscitados, tornam-se testemunhas "dessas coisas" (Lc 24:48, isto é, dos ditos e feitos do Jesus terreno) e ainda mais "de mim testemunhas" (At 1,8). A ressurreição de Jesus é principalmente obra do Pai, um evento que aconteceu de acordo com as Escrituras, para a proclamação do Evangelho a todas as nações. Diante do Ressuscitado e do Evangelho, as reações são de acolhimento ou de rejeição. A Palavra, no entanto, não está acorrentada, nem mesmo a de Paulo sob custodia militaris em Roma.
Em sua lectio cursiva de Jo 20–21, M. Marcheselli apresenta primeiro a terminologia joanina da experiência pascal: ver, vir, Jesus, Senhor. Ao Discípulo Amado não é concedido nenhum encontro pascal com o Ressuscitado (20,3-10), enquanto isso acontece para uma pessoa como Maria Madalena (20.1-2.11-18), para o grupo sem Tomé (21,19-23 ) e para Tomé (20,24-31).
No c. 21 é descrita a manifestação de Jesus ao grupo de discípulos às margens do mar de Tiberíades (21,1-14), após o qual a vontade do ressuscitado é revelada a Pedro e ao discípulo Amado (21,14-25). Jo 21 não é um epílogo adicionado ao c. 20 (com a primeira conclusão), mas uma releitura de todo o evangelho de João (com Zumstein). Por "releitura" entende-se "um procedimento de atualização imposto pelas novas circunstâncias em que estão os destinatários (a comunidade joanina), o que exige um reposicionamento dos acentos com relação à tradição teológica da comunidade" (p. 110).
João ainda precisava narrar a ressurreição, porque é um evento essencial da aventura cristã e do anúncio evangélico. "O ponto de partida hermenêutico da lembrança pós-pascal sempre pressupõe, no início, a cruz e a ressurreição" (p. 112). Mesmo que a história da ressurreição não tenha no quarto evangelho o papel que tem nos sinóticos, tem um papel crucial como "exploração em chave da teologia narrativa da experiência pascal dos primeiros discípulos" (ibid.).
Segundo Marcheselli, em "João, a ressurreição corpórea de Jesus é apresentada em termos de escatologia "sapiencial": a exaltação do justo. No entanto, não é simplesmente "imortalidade da alma"... é vida no sentido judaico: é um dom de Deus, que só a possui por natureza e que doa livremente àqueles que são fiéis à aliança. Uma vida, mesmo após a morte, da qual o corpo não participe, de alguma forma teria sido inconcebível para a imaginação judaica. A escatologia sapiencial que vemos atestada em Jo, se não fala nada explícito sobre a ressurreição corpórea - continua Marcheselli - é fundamentalmente capaz de integrá-la e, até certo ponto, exige isso "...
A ressurreição de Jesus já reverbera em João no Jesus terreno, nos eventos da vida pública e sobre sua paixão e morte. O Espírito conectado ao Ressuscitado permite a compreensão dos eventos. “O Jesus de João é simbólico do Ressuscitado. O Jesus terreno toma a luz do Ressuscitado: ele "já é e ainda não é" o Ressuscitado "(p. 112-113).
Penna examina por fim o tema de Paulo e as aparições pascais do Ressuscitado, fundamento da fé pascal. Os documentos mais antigos sobre a ressurreição de Jesus (em particular 1Cor 15,1-5) são confiáveis como expressão do testemunho apostólico no qual se baseia a fé atual da Igreja, juntamente com o encontro pessoal de fé e de amor de cada um com o Ressuscitado. A fé pascal está ligada ao apostolado: só pode ser entendida à luz da fé nas coisas ditas e feitas por Jesus em sua vida pública. O Jesus ressuscitado apareceu apenas aos discípulos, não a Pilatos, a Caifás e a outros. A fé no Ressuscitado está intimamente ligada ao Jesus crucificado.
Na segunda parte da contribuição, Penna se detém no tema da fé e da conversão no pensamento de Paulo. Paulo vê seu encontro em Damasco como uma visão da glória (cf. Ez 1), chamada profética, conversão em sentido amplo como "embaralhamento das cartas". Paulo não usa a terminologia da conversão-metanoia; ele é reticente em fazê-lo porque expressaria um arrependimento por uma infração à Lei e revelaria um olhar para trás. Uma terminologia que não pode mais ser proposta após a Páscoa. Paulo usa a terminologia da "fé/crença" como uma total confiança na solidez representada pela pessoa de Jesus. A fé e a "conversão" estão intimamente ligadas. Aquela que era a conversão judaica (teshuvá) ele a expressa com a termologia da "fé".
Isso também depende do conceito diferente de pecado presente em Paulo e no judaísmo. Para o apóstolo, o pecado não é uma violação da lei reparável com a conversão e um sacrifício. A conversão no judaísmo corresponde efetivamente a uma "obra". Prolongando a linha do pensamento enoquiano, para Paulo o pecado é uma potência sobre-humana enorme que escraviza o homem. Ele pode ser libertado dela não graças às obras litúrgicas humanas, mas com o dom da justificação pelo Filho de Deus morto e ressuscitado, que amou e se entregou para cada um que confia nele na fé.
Com o caso de Paulo, segundo Penna, "estamos diante a algo muito distinto de um aborto, pois ele representa o nascimento de uma testemunha luminosa em si e encorajadora para nós no Cristo ressuscitado crucificado" (p. 142).
Deixando de lado a presença de pequenos erros na transliteração dos termos gregos, lembramos apenas na p.9 nota 3: na r 2 ler mwt tmwt; na r 4 ler mwt ymwt.
Uma ampla bibliografia de autores modernos, que creio tenha sido editada pelo prof. Landi, encerra o livro muito rico e interessante (pp.143-152) sobre o difícil tema da ressurreição e seu impacto crucial na fé cristã.
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A ressurreição: um paradoxo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU