21 Agosto 2019
Há algumas décadas atrás, desde 1980, quando se vislumbrou a possibilidade de algum evangélico ou os evangélicos, pudessem chegar ao poder político em algum país da América Latina, os animava, segundo a experiência vivida na Venezuela, a crença que ao incidir na vida do país, poderiam fazer que o Evangelho crescesse no país, acessasse os privilégios que tinha e tem a Igreja Católica, e a ideia que, ao estar um “irmão” na presidência ou em alguma instância de poder, era garantia de progresso, boa vida e separação do mal (pecado).
O artigo é de José A. Amesty R., publicado por Alai, 19-08-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Estas eram as ideias “sãs” dos evangélicos, ingênuos e de bom coração, não havia nada de malícia nisso. No entanto, não contavam ou veriam mais além de possíveis pessoas e igrejas, instituições, e instâncias, com más intenções, que buscavam pescar no rio agitado, a favor dos seus interesses pessoais e de seus aliados.
Mesmo assim, acreditavam que o Senhor os acompanharia e daria palavra, nessa nova aventura, crendo que isso era suficiente. Esquecendo que é necessário um conhecimento profundo de política, tanto no âmbito nacional com internacional, no mínimo. É assim que as experiências vividas pelos evangélicos têm sido um fracasso total, e o pior, é que não há aprendizado com elas. Foi ingenuidade, em muitos sentidos. Os evangélicos são novatos no âmbito político.
Há pelo menos três modelos nos quais os evangélicos tem participado na política:
Como partido político – “é o movimento de partido confessional, integrado e liderado exclusivamente por ‘irmãos evangélicos’, que sob um ‘mandato religioso’, querem chegar ao governo de seus países para, desde ali, poder evangelizar melhor”;
Como frente evangélica – “se trata de uma frente política liderada por irmãos evangélicos de diferentes denominações, porém que se abre a outros atores que compartilham com eles seus ideais políticos (ainda que não plenamente seu ideais religiosos); nesse caso, de certa maneira renunciam a seus princípios religiosos para privilegiar suas possibilidades políticas”;
Como facção evangélica – “consiste na participação de líderes evangélicos em processos eleitorais dentro de partidos ou movimentos políticos já constituídos, sobre a base de alianças eleitorais (porém sem ter a capacidade de liderar dito movimento ou partido) ”. Nesse modelo, não ganham por seus próprios votos, que não são suficientes, mas sim arrastados pelos partidos que pertencem.
Nos três modelos destacados acima, os evangélicos fracassaram, com alguns ganhos e avanços menores, mas que não souberam canalizar e aproveitar. De qualquer modo, o certo é que os evangélicos já estão presentes na política partidária de todos os países do continente (América Central, América do Sul, e no caso particular do Brasil) e são atores políticos em todos eles, ainda que com mínimo e distinto impacto e influência.
Por sua vez, há alguns elementos comuns, que são facilmente detectados, quando se relaciona a fé evangélica com a política: “os evangélicos trasladam à política, ideias ultraconservadoras em relação com a família e restritivas das liberdade sociais; os evangélicos são abertos defensores do neoliberalismo e da sociedade de consumo, não são austeros; tem uma ampla capacidade econômica ligada ao aporte de seus fiéis; contam com a implantação midiática a partir de suas próprias emissoras, canais de televisão e redes sociais”, segundo o escritor Javier Calderón Castillo.
José Efraín Ríos Montt foi o primeiro presidente evangélico da América Latina. Chegou ao poder em março de 1982, na Guatemala, depois de um golpe militar. Desde 1978 pertencia à Igreja Verbo, e era reconhecido como Ancião Governante, isso é, um líder dessa Igreja. Pregava sobre a moral, desde a chefatura do Estado, proclamando-se como “O Ungido de Deus”, para governar esse país centro-americano. Não obstante, depois de 17 meses no poder, foi acusado de graves violações de Direitos Humanos, culpado ou inocente foi condenado a 80 anos de prisão.
Há um dado importante nesse tema, os evangélicos que tiveram maior incidência nos processos eleitorais via presidência ou outros cargos, são os de setores pentecostais. Isso porque a participação eleitoral de pastores e a proliferação de partidos ligados à fé pentecostal, são fenômenos em crescimento. Já deixaram de ser uma novidade política emergente incursionando com força para ficar na política.
Depois dessa experiência com Ríos Montt, o mundo evangélico teve outras similares, em países como: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, México, Panamá, Peru, Venezuela, entre outros.
Recalcando o fracasso dos evangélicos, quando estivaram ou estão no poder político, se evidência em violações de Direitos Humanos, casos de corrupção, escândalos sexuais, entre outros, porém o mais significativo tem sido, entre outros:
1. Chegam à gestão política, com a ferramenta preferida, uma agenda moral, em alguns casos uma agenda moral provida e pró-família, cuja base é o texto bíblico, como receituário e como manual.
2. Não se conseguiu elaborar um pensamento social evangélico, nem um Plano de Governo mínimo, para algum país. Somente parece haver uma oferta, para moralizar a política.
3. Se incorreram erros políticos de gestão pública, pela ingenuidade e por carecer de ferramentas frente ao desconhecimento do político e seus elementos constitutivos do mesmo.
Nesse sentido, propomos algumas alternativas-propostas, ao que tende ao mundo governamental evangélico:
1 – Convocar uma Cúpula Evangélica na América Latina, interdisciplinar, popular e ecumênica. Com participação de teólogos e teólogas, pastores e pastoras e líderes de igrejas proeminentes convocada por organizações de igrejas, concílios, sínodos, outros.
2 – Essa Cúpula terá como objetivo, revisar a história dos processos políticos, nos quais participaram os evangélicos, por país, avaliar erros e acertos, propondo alternativas. Então, a Cúpula proporá tarefas concretas por países.
3 – Essa Cúpula por países, deve elaborar Planos de Governo, frente a eventualidade de uma ascensão ao poder político, (se é que se quer seguir incursionando no mundo político em cada país): presidência, governos, prefeituras e outros. Planos, tanto para a nação, como Planos de Desenvolvimento, elaborados a partir de propostas das bases evangélicas.
4 – Capacitar, tanto os membros de igrejas, como quadros evangélicos, com um Formação Sócio-Política e Geopolítico de Alto Nível Permanente, para obter argumentos na hora da gestão pública.
5 – Propor uma Comissão de Alto Nível, para revisar e elaborar diretrizes sobre a diferença entre o moral e o ético, tratando de visualizar a linha horizontal intermediária entre eles, para não continuar caindo no erro de entregar projetos humanistas, revolucionários ou avançados, por um capricho moral.
6 – Rumar para a consolidação de um partido político em cada país, sólido, no possível, um partido de quadros e com um forte respaldo das massas.
7 – Essas Cúpulas por países, devem trabalhar sem interrupção, até conseguir um mínimo de trabalho organizado nas gestões públicas, nos assuntos de governo e em todo o relacionado com a vida estatal.
Sem dúvida alguma, o mundo evangélico tem muito trabalho pela frente, se deseja seguir incidindo na vida política latino-americana, tem que aportar consideravelmente no presente e futuro desse continente, porém há que se preparar, para não seguir sendo incautos e ingênuos, para que não nos sigam utilizando os políticos de ofício, corruptos e aproveitados. Se pudesse não seguir fracassando, se levarmos a sério, não de qualquer jeito, a gestão pública de nossos aparatos políticos estatais.
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Fracassos dos evangélicos no poder político da América Latina - Instituto Humanitas Unisinos - IHU