31 Julho 2018
Após a histórica decisão do Papa Francisco em aceitar a renúncia do cardeal Theodore McCarrick do Colégio Cardinalício, tanto Bispos dos Estados Unidos, bem como sobreviventes e defensores das vítimas dizem que este foi um passo em frente, mas ainda há uma grande distância a ser percorrida até a promessa de "tolerância zero" ser cumprida.
A reportagem é de Christopher White, publicada por Crux, 30-07-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
"O anúncio sombrio do Vaticano esta manhã terá forte impacto sobre a comunidade católica da Arquidiocese de Newark", disse o Cardeal Joseph Tobin de Newark num comunicado no sábado.
Tobin - que agora detém o posto que McCarrick ocupou entre 1986 e 2001 – acrescentou que "esta notícia mais recente é um passo necessário para a Igreja se responsabilizar por abuso sexual e assédio perpetrado por seus ministros, não importa sua posição. Peço a meus irmãos e irmãs que rezem por tudo o que pode ter sido prejudicado pelo antigo cardeal e que rezem por ele também".
Cardeal Donald Wuerl de Washington, que sucedeu McCarrick em 2006, falou ao WTOP, um programa de rádio local em D.C., no sábado, onde chamou a decisão de um "grande passo adiante na tentativa de agir rápida e decisivamente", apesar do fato de que o "procedimento ainda não está concluído."
Em um comunicado no domingo, a Arquidiocese de Washington disse que uma revisão dos seus arquivos não encontrou nenhuma reclamação contra McCarrick. Além disso Wuerl disse que desconhecia os acordos em Metuchen e Newark.
"Aqueles que fazem as alegações mostram confiança na Igreja em levar a sério essas acusações e agir rapidamente para responder", disse ele.
"Continuamos a rezar para os sobreviventes de tais abusos e entendo como é difícil para eles compartilharem essas lembranças dolorosas", disse o comunicado. "Como a luta para enfrentar tais experiências é muito difícil para os sobreviventes, a Arquidiocese deseja acompanhá-los e ajudá-los a passarem por este processo."
"A Arquidiocese incentiva a todos que compartilhem essas duras experiências com qualquer diocese para que esses graves problemas possam ser revistos imediatamente por autoridades da Igreja, e que nós possamos oferecer assistência para iniciar o processo de cura e paz", continuou.
Segundo o comunicado do Vaticano emitido no sábado anunciando a demissão, McCarrick foi ordenado a “permanecer em uma casa a ser indicada, para uma vida de oração e penitência, até que as acusações feitas contra ele sejam examinadas em um julgamento canônico regular”.
Após anúncio do Vaticano, o Cardeal Daniel DiNardo, Arcebispo de Galveston-Houston e presidente da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos, fez um pronunciamento agradecendo também a Francisco por suas ações.
"Agradeço ao Santo Padre por sua liderança em dar este importante passo", disse ele. "Isso reflete a prioridade que o Santo Padre coloca sobre a necessidade de proteção e cuidados para todo o nosso povo e como as falhas nesta área afetam a vida da Igreja nos Estados Unidos."
A mais extensa resposta até à data, no entanto, foi emitida pelo Bispo Michael Olson de Fort Worth, Texas, que, no sábado, numa carta pastoral de duas páginas, na qual ele usou as alegações contra McCarrick para abordar a situação dentro de sua própria diocese.
"Nós vemos nos escandalosos crimes e pecados que alegadamente foram cometidos pelo agora ex-Cardeal McCarrick, a violação de confiança e graves danos causados à vida e à saúde de suas supostas vítimas”, escreveu.
"A justiça também requer que todos aqueles na liderança da Igreja que sabiam dos alegados crimes e má conduta sexual e não fizeram nada (devem) ser responsabilizados por sua recusa em agir, permitindo que outros fossem machucados”.
Ele passou a reafirmar o compromisso da Igreja de tolerância zero contra o abuso sexual dentro de sua própria diocese contra menores e adultos vulneráveis, "pelo seu clero, funcionários e voluntários, me incluindo como bispo."
Enquanto as respostas dos líderes da Igreja tiveram um tom otimista e cauteloso para direcionar o caminho a se seguir, a resposta da Survivors Network of those Abused by Priests (SNAP) foi muito mais contundente.
"Entendemos que esta ação é sem precedência, mas não é nada comparado ao sofrimento infligido às vítimas ao longo de suas vidas", escreveram nas redes sociais.
Patricia McGuire, presidente da Trinity Washington University também escreveu uma postagem profundamente pessoal enfocando a necessidade de arrependimento e expiação, tendo em conta as revelações McCarrick.
"O Papa, Cardeais e Bispos devem encontrar algo diferente, algo mais: uma profunda, convincente e durável voz vinda do núcleo da Igreja, uma prática de expiação que leve à reconciliação com as vítimas e aqueles que as acompanham”, escreveu ela no sábado.
“O exercício de uma voz como esta não pode surgir de um posicionamento de poder e de autoridade, ou de legalidade e de autoproteção, mas sim, de uma postura de humildade genuína e vulnerabilidade. Tal postura requer um vocabulário mais simples e mais humano que implora perdão e o expressa a um nível de compreensão sobre a ferida”, continuou.
Enquanto isso, Juan Carlos Cruz, vítima de abuso sexual pelo padre Fernando Karadima, aproveitou a ocasião para convocar o atual e o aposentado Cardeal de Santiago do Chile, Riccardo Ezzati e Francisco Errazuriz, que estão sob escrutínio por encobrir abuso sexual, a também se demitirem.
Ao se reunir com as vítimas de abuso durante sua visita em setembro de 2015 aos Estados Unidos, Francisco disse que "Deus chora" por eles, acrescentando que o abuso "não pode ser mantido em segredo".
Desde que as alegações contra McCarrick vieram à tona no mês passado, depois de um conselho de revisão da Arquidiocese de Nova York considerar as reivindicações feitas por um coroinha de 16 anos de que McCarrick teria abusado dele quando este último era padre na década de 1970, "credíveis e justificadas", a Igreja dos EUA sofreu o mais intenso escrutínio de suas políticas de abuso sexual desde que a crise de 2002.
Nas últimas semanas, tanto Tobin quanto o Cardeal Sean O'Malley de Boston, presidente da Comissão Pontifícia do Papa para a Proteção de Menores, disseram que os Bispos dos Estados Unidos, mais uma vez, vão examinar maneiras para aprofundar seus esforços de reforma.
Nesse sentido, analistas dizem que, o ponto de viragem do sábado não marca o fim da estrada. Para os Bispos dos Estados Unidos ele representa o início de uma nova fase na campanha de "zero tolerância", uma vez que a questão não é só responsabilizar os abusadores, mas também aqueles que facilitaram os abusos por falharem ao agir.
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Caso McCarrick. Bispos dizem que a atitude do Papa não será a última - Instituto Humanitas Unisinos - IHU