26 Fevereiro 2018
Chiaretto Kin Sheung Yan é teólogo chinês que vive em Xangai. Ele é um pesquisador do Instituto Universitário Sophia de Loppiano, fundado por Chiara Lubich e guiado por Piero Coda. Recebeu doutorado em Missiologia na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Publicou em 2015 pela EMI "Il Vangelo oltre la Grande Muraglia” (O Evangelho além da Grande Muralha, 288 páginas, 18 euros), com prefácio de historiador Agostino Giovagnoli.
O artigo é publicado por Avvenire, 24-02-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Para mim, este momento é propício para a unidade da Igreja na China. Bispos, sacerdotes, religiosos e leigos, tanto oficiais como clandestinos, estão seguindo atentamente e com oração o diálogo entre a China e a Santa Sé, porque eles sentem que está se carregando de problemas. Esta é a voz da ‘maioria silenciosa' que melhor representa a China católica hoje. Não há contradição em ser plenamente cristão e plenamente chinês. E isso me faz pensar ao kairos que neste momento a Igreja vive. O Papa Francisco na Evangelii gaudium fala dos quatro princípios interpretativos da realidade social, incluindo aquele em que a "unidade prevalece sobre o conflito". A questão da Igreja na China não pode ser resolvida em torno de uma mesa de tribunal, mas de comunhão. Não devemos cair na lógica dos vencedores-perdedores. Infelizmente, existem alguns na Igreja que, talvez por falta de humildade, ficam presos ao passado e insistem em querer sempre a razão. Isso também condiciona os outros, dificultado deixar o passado para trás. Somos espectadores de um drama em curso e que pode ter um final imprevisível.
Acredito profundamente que o Espírito Santo esteja conduzindo a Igreja. Já o Papa João Paulo II tinha a intenção de resolver o 'problema chinês'. Com grande compreensão começou a perdoar e reconhecer os bispos 'oficiais'. Há uma grande continuidade entre os papas recentes. Bento XVI com sua carta pastoral aos chineses, em 2007, em seguida, deu uma base sólida para a intenção de solucionar o 'problema'. O Papa Francisco com seu espírito de comunhão e seu desejo de aproximar os pobres, os humildes e os marginalizados conquistou a simpatia da autoridade e do povo chinês.
O que está acontecendo entre a China e o Vaticano saltou para a atenção internacional por causa da controvérsia relacionada aos bispos de duas dioceses chinesas. Se me perguntassem uma opinião sobre o caso do Bispo Zhuang eu usaria uma expressão e uma abordagem cara ao Papa Francisco: "A realidade é mais importante do que a ideia". As polêmicas foram criadas de propósito. Eu ensinei no Seminário para a China central e meridional, em Wuhan, e pelo que eu sei, posso apontar três pontos-chave.
Primeiro de tudo, não existiam comunidades clandestinas na Diocese de Shantou. Todos os sacerdotes estudaram em seminários oficiais (como o Seminário de Wuhan), incluindo o Bispo Zhuang, que estudou no seminário de Xangai. Zhuang é membro da Associação Patriótica (Ap) desde os anos 1990 e foi vice-presidente da Associação Patriótica de Jieyang, um dos quatro decanatos da diocese de Shantou, de 2005 até hoje. Essa filiação à Ap nunca foi um problema para a comunidade católica da Diocese de Shantou. Em segundo lugar, a causa da divisão da diocese de Shantou deve-se a diferentes filiações religiosas entre os grupos dialetais de Hakka e Chaozhou. Existiam divisões ocultas sobre a questão da liderança. Uma ferida aberta, já mencionada em meu livro O Evangelho além da Grande Muralha (na página 254), porque os católicos chineses estão diante da necessidade urgente de retornar à mensagem evangélica do amor e da unidade. Em terceiro lugar, toda a questão em torno Zhuang foi muito politizada, enquanto a perspectiva do papa Francisco e da Santa Sé é puramente espiritual, e a sua prioridade é pastoral, orientada apenas para o bem da Igreja na China.
Em relação ao caso da Diocese de Mindong, no entanto, a situação não é 'preta ou branca'. O problema não é o fato de saber quantos são os fiéis clandestinos e quantos os oficiais, e se há mais de uns ou de outros. A maioria dos fiéis reconhece um bispo quando é legítimo ou legitimado. Mesmo que Zhan tome o lugar do bispo ordinário, enquanto para Guo é reservado o de bispo auxiliar, o que importa é a reconciliação. A prioridade para os bispos não é o poder, mas seu empenho pastoral. É preciso ter um quadro mais amplo, com o objetivo de resolver a "questão dos bispos” como um todo. Esta última impostação também seria mais consoante com a cultura oriental e com o princípio de Francisco para o qual "o todo é maior do que às partes".
Como chinês vivendo na China, a minha impressão é que a questão da Igreja católica no meu grande país tenha sido muito politizada, manipulada e exagerada, renunciando ao enfoque sobre os testemunhos de mútuo amor e de evangelização, no serviço social prestados para o bem do povo. Deveria ser questionada a Igreja que está em Hong Kong, Taiwan e Macau, perguntando a ela e se perguntando se ela vive a própria vocação da Igreja-ponte, mantendo plena comunhão com a Igreja universal e, ao mesmo tempo se preocupando com sua comunhão com a Igreja em toda a China, em vez de ser um instrumento político usado por alguém. Infelizmente justamente em Hong Kong nos últimos anos de agitação social os jovens foram muitas vezes manipulados pelos políticos. E Hong Kong não só não é uma ponte, mas torna-se um obstáculo para o diálogo China-Vaticano.
A China é uma realidade multifacetada com 56 grupos étnicos e cinco grandes religiões. O papel das autoridades chinesas é governar bem o país. O período de ideologia já foi amplamente passado ou, pelo menos, está passando. As autoridades chinesas não têm interesse algum em mudar a teologia católica: a sua preocupação é principalmente administrativa, típico de uma cultura confuciana. Um editorial do Global Times, jornal do Partido Comunista Chinês, alguns dias atrás afirmava que "apesar da dificuldade do processo, nunca houve um vasto número de pessoas não-católicas fortemente contra o Vaticano. A opinião pública em geral respeita todo Papa". E é um fato que o Papa Francisco desfruta de uma imagem positiva junto à opinião pública chinesa. Espera-se que leve adiante as relações entre a China e o Vaticano e resolva os problemas relacionados com sabedoria. A China e o Vaticano, "mais cedo ou mais tarde estabelecerão relações diplomáticas", um acordo "seria extremamente benéfico para os católicos".
Francisco, com sua visão para o futuro, não limita seu olhar apenas a alguns milhões de católicos na China, mas olha para a paz e a harmonia do mundo inteiro e quer estabelecer um diálogo e uma amizade com a China. Este é um momento de kairos, o tempo chegou, de acordo com o princípio de que "o tempo é superior ao espaço". É um encontro com a história, se bem vivido: será realizada a unidade da Igreja, principalmente o cristianismo poderá se difundir na China sem o rótulo de 'religião estrangeira'. Esse desenvolvimento das relações China-Vaticano já é aguardado há tempo demais. Vai ser bom não só para a China e para a Igreja, mas irá contribuir para a paz mundial e para a harmonia de toda a humanidade.
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"Nós católicos chineses desejamos a unidade", afirma teólogo chinês - Instituto Humanitas Unisinos - IHU