20 Fevereiro 2017
Para diminuir os refugiados, é preciso favorecer a paz nos seus países e frear a exploração. Fazia tempo que uma personalidade de destaque não falava com tanta força (mas com calma) de exploração, além de paz. É o surpreendente manifesto de Francisco por um mundo global.
A opinião é do historiador italiano Andrea Riccardi, fundador da Comunidade de Santo Egídio e ex-ministro italiano, em artigo publicado no jornal Corriere della Sera, 18-02-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Havia um clima descontraído e simples na visita do Papa Francisco à Universidade Roma Tre. Nem o reitor, Panizza, nem o Vaticano quiseram comitivas ou presenças oficiais. Realizou-se uma conversa direta entre o papa, que voltou a ser professor, e os estudantes.
As perguntas dos jovens giraram em torno da globalização. O papa, tendo posto de lado o texto escrito, lançou de improviso quase um “manifesto” pela globalização de rosto humano. Via-se que ele queria estimular a universidade a trabalhar sobre isso, porque é um lugar “onde se pode dialogar” e “há lugar para todos”.
O papa convida a pensar: ele não divide os católicos dos laicos. Mas, tocando problemas vivos, as suas perguntem dividem no interior desses mundos. A Igreja de Francisco está preocupada que se deixe de pensar e de discutir. Nenhum medo do “pensamento livre”. Nada de nostalgia do passado. É preciso aceitar este tempo sem recriminação: “Nós devemos pegar a época como ela vem”, disse o papa, usando uma metáfora que ele ama, a do goleiro que, no futebol, pega as bolas de onde elas vêm. No entanto, ele deixou escapar uma afirmação grave sobre o presente, corroborada pela experiência da classe dirigente mundial: “A política se rebaixou muito”.
Os jovens o acompanhavam atentos e divertidos com as piadas: “A unidade – disse – não aquele jornal”, referindo-se à publicação fundada por Gramsci [L’Unità]. Francisco falou de “globalização poliédrica, em que cada cultura conserva a sua identidade”, retomando a “sociedade líquida” de Zygmunt Bauman. E, depois, uma crítica dura à economia líquida por causa do desemprego juvenil.
O pensamento do papa e o de Bauman encontram uma forte e significativa união. Entre os dois, houve também um momento intenso, quando, em setembro passado em Assis, eles se encontraram na última saída do pensador polonês (laico e judeu). Este disse a Francisco: “O senhor é para mim uma luz no fim do túnel”. É preciso encher novamente os vazios uniformizadores e angustiantes do mundo global: “Perde-se o sentido da construção social que se faz com o diálogo”, e, “em vez de falar, grita-se ou grita-se contra”, insistiu o papa.
Depois, preocupado, disse: “Quando não há diálogo, é o início da guerra”. Poderão acusá-lo de uma “bondade açucarada”, mas Bergoglio tem uma proposta clara: “O diálogo aproxima as pessoas e os corações: faz a amizade, a amizade social”.
A nossa sociedade – diz Luigi Zoja – é a sociedade da morte do próximo. O papa tem a percepção de uma violência crescente nas nossas sociedades. Ele propôs um desarmamento pessoal na luta não violenta contra a violência: “É preciso abaixar os tons, falar menos e ouvir mais!”. Assim, estabeleceu um vínculo entre violência na linguagem e “violência mundial”. À violência das sociedades anônimas e líquidas, o papa contrapôs a “concretude”, repetindo isso várias vezes.
Para ser concreto, ele tinha que tocar o tema do medo dos imigrantes, proposto pela síria Nour, que veio de Lesbos com outros refugiados no avião papal. É um grande tema global. Àqueles que dizem? “Perdemos a nossa identidade!”, o papa lembrou: “A Europa foi feita por invasões. As migrações não são um perigo, mas um desafio para crescer”. Como argentino filho de um país feito de migrações, ele conhece o valor do encontro entre culturas. Por isso, disse convicto: “Não há perigo”, se for realizada uma integração séria dos imigrantes. A integração é o desafio.
Mas, depois, o papa lançou também outro desafio: para diminuir os refugiados, é preciso favorecer a paz nos seus países e frear a exploração. Fazia tempo que uma personalidade de destaque não falava com tanta força (mas com calma) de exploração, além de paz. É o surpreendente manifesto de Francisco por um mundo global.
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O manifesto de Francisco por um mundo global. Artigo de Andrea Riccardi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU