16 Novembro 2016
"Eu estava fazendo bobagens", confessou Martin Pina, "por isso me pegaram e me deportaram há quatro dias." Que bobagens? "Eu vendia erva. Já paguei nove anos de prisão na Califórnia, depois mais oito e, se me pegarem pela terceira vez, vou para a prisão perpétua. Mas a minha esposa e o meu filho, que tem 22 anos e nasceu nos Estados Unidos, estão do outro lado da fronteira. Portanto, mais cedo ou mais tarde, vou tentar voltar."
A reportagem é de Paolo Mastrolilli, publicada no jornal La Stampa, 15-11-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eu me encontro com Martin no pátio da Casa do Migrante, um centro de assistência fundado há 29 anos pelos padres scalabrinianos em Tijuana. No braço direito, ele tem uma enorme tatuagem da cantora mexicana Selena e, no esquerdo, da sua mãe, Belinda. Ele é o exemplo dos três milhões de criminosos que Donald Trump quer expulsar logo dos Estados Unidos imediatamente, mas também da guerra que o espera: "Eu acho que o novo presidente – diz Martin – vai fazer o que prometeu. Se ele pudesse, ele enforcaria pessoas como eu".
Mas nem isso, porém, bastaria para resolver o problema: "Eu sou um peixe pequeno e que não conhece os chefes do cartel de Sinaloa que controlam esta região. A única maneira que eu tenho para viver, porém, é esta. O que eu devo fazer? Se ele construir o muro, continuaremos pulando, ou então cavando túneis por baixo dele. Se ele nos deportar, continuaremos voltando".
Essa viagem ao fim da emergência mais intrincada dos Estados Unidos começa na "Door of Hope", a porta ao longo da cerca na fronteira com o México, que os agentes da US Border Patrol abrem a cada sábado e domingo para permitir que as famílias se reúnam. Ela está no fim do Border Field State Park, em San Diego, e é a síntese do drama.
Assim que eu me aproximo, um agente vem ao meu encontro no jipe que patrulha a fronteira. Ele se chama Arriaga e pergunta: "O que você faz aqui?". Um artigo. "É uma zona proibida, você deve ir embora." Mas este não é o lugar-símbolo da reconciliação? "Sim, mas você deve ir embora assim mesmo."
Arriaga não tem a permissão para comentar as novas políticas propostas pelo presidente eleito Trump, mas, para ele, o chefe do sindicato dos 16.500 oficiais, Brandon Judd, já se pronunciou, ele que, durante a campanha eleitoral, apoiou o candidato republicano: "O chefe mudou, e o clima também. Haverá agentes que vão deixar de aplicar as diretrizes de Obama e vão prender mais ilegais. Por dois motivos: para contentar o novo presidente e parar o ataque nas fronteiras dos migrantes, que querem aproveitar os últimos dois meses restantes antes do novo governo para conseguir entrar".
Os funcionários aduaneiros estão com Trump, isso estava claro mesmo antes da eleição. Pelo menos na Califórnia, no entanto, prepara-se um choque com as autoridades locais e a sociedade civil. O governador e os prefeitos são todos democratas e, embora a imigração seja uma questão federal, vão obstaculizar os planos do novo presidente.
Por exemplo, não fornecendo as listas dos supostos ilegais e continuando a assistência aos recém-chegados. A sociedade civil e a Igreja estão alinhadas do mesmo modo.
Nos Estados Unidos, vivem cerca de 750 mil jovens que se aproveitaram do Daca, a medida de Obama que protege contra as expulsões os jovens ilegais trazidos para o país pelos pais quando eram crianças. Mais de 200 mil moram apenas no condado de Los Angeles, onde o arcebispo já disse que não vai colaborar com as expulsões. (Nota da IHU On-Line: o arcebispo de Los Angeles, José Gómez, mexicano naturalizado americano, foi eleito ontem, 15-11-2016, vice-presidente da Conferência dos Bispos Americanos. Trata-se de um fato inédito)
Ele é conservador, vem do Opus Dei, foi nomeado por Bento XVI, e a maioria dos católicos votaram em Trump. Mas ele se chama Gómez, nasceu no México e, neste momento, acredita que a glória conta mais do que o poder. "Nós – explica-me a porta-voz da diocese de San Diego, Aida Bustos – pensamos que devemos construir pontes, não muros. De fato, no dia 10 de dezembro, o nosso bispo, Robert McElroy, celebrará uma missa na fronteira com o México, uma cerimônia de Natal em que os fiéis de ambos os países vão rezar juntos, através da cerca metálica."
Aida duvida que as políticas Trump serão eficaz, por razões práticas: "Nós nem sequer chamamos os imigrantes de ilegais, porque são irmãos que fazem parte da nossa família católica. Além das questões de fé, porém, todos são realmente uma família. Eu conheço centenas de fiéis que têm parentes de um lado e de outro da fronteira, alguns deles legais, e outros ilegais: como farão para separá-los?".
Um exemplo é Antonio Marquez, um jovem do Daca, que estuda jornalismo no San Diego City College nas aulas ministradas por Aida: "Eu não violei a lei ou me aproveitei do sistema. Eu trabalhei duro toda a minha vida, para ter acesso à universidade e construir o meu futuro. Mas agora eu vivo no terror, porque os meus pais me trouxeram para os Estados Unidos quando eu era criança, e, por isso, espero que a polícia, de uma hora para a outra, bata na minha porta".
As prisões e as expulsões já são as mais elevadas de sempre, 46.197 apenas no mês de outubro passado. "La Casa del Migrante – explica o padre Murphy – nasceu para ajudar aqueles que iam do Sul para o Norte, mas agora o fluxo se inverteu. Em média, recebemos todos os dias 30 deportados. Antes, eles vinham do México, agora principalmente de El Salvador, Honduras e Guatemala, e, além disso, há a explosão dos haitianos. Se não enfrentarmos as causas desse fenômeno epocal, ou seja, as condições de vida nos países de origem, não será cuidando dos sintomas que curaremos o problema. Nem mesmo prendendo os criminosos, que são a minoria."
Martin concorda, acenando com a cabeça, na cozinha da casa, onde está cortando as batatas para o almoço: "Quanto tempo você acha que eu vou ficar aqui? Em poucos dias, vou voltar para Matamoros, cidade no Rio Grande, onde nasci, e, assim que tiver um pouco de dinheiro, vou atravessar o rio. Mas não digam isso a Trump, porque senão ele me enforca."
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Entre os deportados no México: "O muro? Vamos pular ou escavar" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU