07 Setembro 2016
"'Libertas quae sera tamen'. A liberdade virá, ainda que tardia. Mas virá!”, escreve Lucia Ribeiro, socióloga.
Eis o artigo.
Tempo nublado e cinzento. Tristonho, como convém aos dias depois do impeachment / golpe. Porque o que acabamos de viver, nas ultimas horas, nos tocou profundamente. E talvez não tenhamos ainda a necessária lucidez para compreender o alcance de tudo o que se passou, no entrecruzamento de diversos níveis.
Tocou-me especialmente a dimensão pessoal; Dilma apresentou-se, nestes momentos tão difíceis, como uma mulher fundamentalmente correta, competente e incrivelmente corajosa. Não por acaso, em seu discurso de posse como primeira presidenta mulher, tinha citado Guimarães Rosa: “o que a vida quer de nós é coragem”. E esta não lhe falta. Como não lhe faltou nos tempos terríveis da repressão, quando foi presa e torturada.
Agora, enfrenta um novo tipo de repressão, talvez mais profunda porque mais sutil, envolta em um jogo com aparências de legalidade. Mais uma vez impressiona sua coragem e sua inteireza moral. Em um mundo marcado pela corrupção e por falsidades de diversas ordens, Dilma traz um discurso direto e franco. E talvez tenha sido esta grandeza humana que, no final do julgamento - quando o PT solicitou que não fossem cassados seus direitos políticos – impressionou seus juízes. Surpreendentemente, 16 senadores e senadoras, que anteriormente tinham votado a favor do impeachment, foram contra a cassação ( sem falar nas três abstenções.)
Na hora, tomada pelo inesperado, valorizei a dimensão humana do gesto: na tentativa de amenizar a pena, estava implícito o reconhecimento de sua inadequação. Entretanto, o enorme debate que brotou nas horas subsequentes veio mostrar que a questão era muito mais complexa, involucrando desde a tentativa de aplacar a má-consciência até interesses escusos em abrir precedentes para casos futuros ... Não quero entrar nesta discussão.
Prefiro recuperar a figura de Tiradentes – à qual alguém fez alusão, naquele momento – não para comparar graus de crueldade, mas por que nos ensina a paciência histórica de continuar lutando pela liberdade. Para mulheres que, como Dilma e tantas de nós, nascemos em Minas, seu exemplo é paradigmático e nos abre uma perspectiva de esperança, em uma luta longa e difícil. “Libertas quae sera tamen.” A liberdade virá, ainda que tardia. Mas virá!
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Dilma. Artigo de Lúcia Ribeiro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU