23 Agosto 2016
"Os valdenses continuam sendo uma minoria contracorrente e dinâmica em uma sociedade multirreligiosa que sempre está lidando com os seus atrasos históricos e com os novos desafios culturais."
A opinião é do historiador italiano Alessandro Santagata, professor da Universidade de Roma Tor Vergata, em artigo publicado no jornal Il Manifesto, 21-08-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em uma nação cada vez menos religiosa, mas nem por isso menos imbuída de cultura católica, a Igreja Evangélica Valdense representa, há 800 anos, uma voz fora do coro.
Filha dos movimentos de reforma do século XII que lutavam contra a corrupção romana, essa comunidade cristã – nascido sob o ensinamento de Valdo de Lyon e forçada pelo poder secular a se enraizar naqueles que se tornariam os Vales Valdenses do Piemonte – sofreu uma primeira perseguição ainda na Idade Média e uma série de ataques sucessivos, por consequência da adesão à Reforma protestante, das "Páscoas Piemonteses" de 1655 às perseguições de 1686, que culminaram no exílio e no posterior "Glorioso Repatriamento".
Em 1848, com Carlo Alberto, ocorria, finalmente, o fim da "guetização" e o reconhecimento dos direitos civis dos valdenses, mas a liberdade de consciência ainda era negada, já que a religião católica continuava sendo religião de Estado.
A marginalização não impediu, contudo, que a presença dos valdenses fosse significativa tanto no processo do Ressurgimento, quanto na Resistência ao nazifascismo, particularmente forte nos Vales e alimentada por 20 anos de limitação das liberdades das minorias religiosas e de repressão de cultos "não admitidos".
No marco democrático do pós-guerra, a "batalha" dos valdenses continuou em uma Itália em que a simbiose entre o poder político e a Igreja Católica já tinha se tornado a figura dominante do sistema.
Do conflito pela liberdade, passava-se à campanha pela laicidade do Estado, em um país onde estava (e ainda está) em vigor a Concordata. Não é por acaso, portanto, que pastores e intelectuais valdenses e metodistas se distinguiram na elaboração de uma nova teologia, que, da distinção feita por Karl Barth entre Deus e o mundo, obtinha o fundamento de uma visão política antitética às construções culturais democratas cristãs.
Ao mesmo tempo, continuava aquele processo de reaproximação das confissões que levava à constituição da Federação das Igrejas Evangélicas e ao pacto de integração entre valdenses e metodistas.
Estamos nos anos 1970, caracterizados também no campo protestante pela penetração do marxismo e pelo desenvolvimento, muitas vezes em conexão com os grupos da "dissidência católica", das teologias políticas revolucionárias. Uma experiência simbólica dessa época foi o Centro Ecumênico de Agape, em Prali (Turim), viveiro teórico promovido pelo pastor Tullio Vinay e espaço político de referência para os extraparlamentares e para as feministas.
Quanto às relações com a Igreja Católica, os anos posteriores ao Concílio Vaticano II viram a emergência de um debate que culminou em junho de 2015, na visita do Papa Francisco ao Templo Valdense de Turim. Além dos pontos de contato em matéria de exegese e de teologia, um campo de debate é hoje a questão migratória, objeto da ação conjunta dos "Corredores Humanitários", o projeto promovido pela Federação das Igrejas Evangélicas e da Comunidade de Santo Egídio.
As distâncias, no entanto, ainda são marcantes, quando se trata da organização da Igreja – o papel das mulheres, por exemplo –, de bioética e de laicidade. Nas últimas décadas, a Igreja Valdense tem-se distinguido justamente pelas suas posições abertas e construtivas, também do ponto de vista evangélico, sobre as uniões homossexuais e de fato, assim como sobre o testamento biológico.
Os valdenses, em suma, continuam sendo uma minoria contracorrente e dinâmica em uma sociedade multirreligiosa que sempre está lidando com os seus atrasos históricos e com os novos desafios culturais.
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Valdenses, há oito séculos, uma voz fora do coro. Artigo de Alessandro Santagata - Instituto Humanitas Unisinos - IHU