16 Junho 2012
Devemos ver a potencialidade de cada estado. Não dá para dizer que se defende o carvão, a energia nuclear etc. São complementares, mas temos que enxergar o potencial de cada estado e aproveitá-lo, só que de forma limpa, analisa o pesquisador.
Confira a entrevista.
O problema do carvão é a questão política, avalia o pesquisador Roberto Heemann, em entrevista concedida por telefone à IHU On-Line. Segundo ele, o carvão tem que entrar nos leilões energéticos. “Não há motivo para não entrar. Ele se inserindo nesses leilões, há mercado e consumo. E temos essa energia aqui. Não tem sentido importar a preço de ouro essa energia, se podemos gerá-la aqui dentro. A grande questão é o aproveitamento energético. Existem tecnologias, as empresas estão utilizando essas tecnologias, só que tem que modernizar o parque termoelétrico. Para modernizá-lo, tem que haver leilão de energia, caso contrário não irá pagar o projeto. E alguém tem que pagar essa conta. É por isso que digo ser uma questão política, acima de tudo. Os políticos devem decidir fazer leilão de energia, aumentar o parque para que ele possa se modernizar. Em caso negativo, não adianta e a produção de carvão se esgota”, pondera.
Para o pesquisador, muita gente ainda critica o carvão. “Ele ainda é o patinho feio da matriz energética.” E explica o porquê: “criticam por falta de conhecimento, que é a chave de tudo, e também porque o passivo ambiental do carvão ainda é grande. Então, eles olham a imagem do carvão, de como ele era feito há 50 ou 60 anos, e querem aplicar hoje. Essa que é a distorção. Até mesmo jornalística. A imagem é distorcida. Mas o que é feito hoje é uma forma muito moderna, o impacto ambiental é controlado. O Ministério Público Federal controla e fiscaliza as ações ambientais de todas as empresas. Em termos de imagem pública, o problema do carvão é o passivo ambiental. Em termos de tecnologia e solução ambiental e energética, a questão é política”, diz. E completa: “temos essas duas linhas separadas, mas que as pessoas utilizam juntas para poder confundir a opinião pública, com objetivo político, obviamente, que é a grande questão”.
Roberto Heemann é pesquisador do Centro de Excelência em Pesquisa e Inovação em Petróleo, Recursos Minerais e Armazenamento de Carbono – CEPAC, vinculado ao Instituto do Meio Ambiente – IMA da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Ele esteve no Instituto Humanitas Unisinos – IHU no dia 14 de junho falando sobre o tema "Rio+20 e alternativas energéticas: tecnologias limpas para o aproveitamento do carvão mineral".
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais são as principais tecnologias utilizadas para a mitigação de impactos ambientais e como elas estão se desenvolvendo no Brasil?
Roberto Heemann – É bom deixar claro que a matriz energética brasileira é limpa, utiliza combustíveis limpos. A hidrelétrica também, ou seja, a matriz elétrica, hidrelétrica e energética é uma matriz muito limpa. O principal foco de países em desenvolvimento, principalmente agora com a Rio+20, seria a essência energética. Ou seja, gerar energia de forma mais eficiente, reduzindo as emissões. Por exemplo, o aproveitamento de biocombustível, que já é um processo que vem sendo desenvolvido no país e que é fundamental para reduzir o efeito ambiental negativo. Temos várias formas de reduzir os efeitos negativos dentro da matriz energética brasileira.
Combustíveis fósseis – uma necessidade
Não há alternativa. O crescimento dos países em desenvolvimento não permite essa utopia de não utilizar o combustível fóssil. Então, vamos continuar utilizando esse combustível. A questão é como utilizá-lo. Pode-se utilizar de forma convencional ou de maneira não convencional e muito mais limpa. Essa é a grande questão. Não existe o vilão da história. Existe, sim, uma maneira mais eficiente de aproveitar o recurso, porque vamos precisar dele, ainda mais em países em desenvolvimento como o Brasil, que tem uma alta demanda energética e precisa se desenvolver. E não apenas países em desenvolvimento, mas outros considerados de primeiro mundo. É uma necessidade utilizar combustíveis fósseis, e não uma opção. Essa é a primeira grande divisão. A partir daí, indagamos: como vão utilizar esse combustível? Aqui entra a questão tecnológica. Deve-se aproveitar o gás contínuo em camada de carvão; gaseificar esse carvão, por exemplo. Deve-se otimizar a queima, mas não evitar utilizar o combustível fóssil porque não há essa alternativa.
IHU On-Line – Como é feita a gestão dos rejeitos de carvão?
Roberto Heemann – A questão dos resíduos do carvão, separamos em duas partes: em primeiro lugar, deve-se entender o processo como um todo. Ou seja, antes de o carvão chegar numa termelétrica, ele passa por um processo de mineração. Quando se produz carvão, grande parte dessa camada não é pura. É o que chamamos de matéria orgânica que vai gerar cinzas na usina. E essa matéria orgânica é disposta em aterros, em depósitos, e esses depósitos de rejeitos de mineração têm um tratamento para não gerar drenagem ácida. Quer dizer, o carvão tem outros constituintes que alteram e podem gerar drenagem ácida se esse depósito não for feito de forma adequada. Quando é feito, não há nenhum problema. Além disso, nas empresas brasileiras e no mundo já é feito isso também, o rejeito das minas subterrâneas de carvão também é colocado de volta em subsolo, para não gerar impacto ambiental negativo na superfície. Então, há metodologias atuais que fazem a operação de lavra do carvão, ou seja, produção de carvão muito mais sustentável e limpa.
Depois, esse carvão sai da mina, transportado por ferrovia, navios etc. e chega à usina termoelétrica. Lá, esse carvão é processado e, durante o processo de queima, as novas tecnologias fazem com que se produza a energia de forma mais eficiente, inclusive capturando os gases nocivos ao meio ambiente. Os subprodutos disso são as cinzas. E elas têm valor agregado, as cimenteiras compram essas cinzas, que serão utilizadas na construção civil. Então, há um destino para elas. Elas são, inclusive, produtos vendáveis. O excedente de cinzas, dependendo da usina, é colocado em cavas e esse material é tratado. Além disso, hoje existe tecnologia para evitar que ocorram danos ambientais. Muitas vezes, a imagem distorcida contra o carvão existe porque há usinas antigas que não são modernas. Evidentemente, essas usinas mais antigas não têm o controle ambiental tão forte. Essa é a questão. Trata-se da questão de capacidade de investimento do projeto. Têm alguns estados que precisam manter essas usinas ainda e irão demorar mais tempo para se capacitar no sentido de modernizar a sua questão de filtro. Outras já estão atualizadas e têm uma emissão muito pequena. Deve-se separar quais usinas são as mais modernas e quais precisam ainda se desenvolver mais, sendo mais antigas e que ainda estão em operação, para ampliar o sistema de tratamento ambiental, uma vez que estas últimas não têm o refinamento de produção limpa.
IHU On-Line – Em que áreas do Brasil há potencial para reaproveitar o carvão mineral como alternativa energética? De que modo o carvão mineral pode ser aproveitado como uma alternativa energética sustentável?
Roberto Heemann – Existem algumas maneiras. O carvão naturalmente tem gás contido nele: o gás metano. Então, o que é feito nos EUA hoje, por exemplo, bem como na Austrália, na China, e assim por diante, é que se extrai o metano que está contido no carvão e esse metano é também um gás causador do efeito estufa, sendo pior do que o CO2. Então, se extrai esse metano e produz energia. Ou seja, não se tem a mineração convencional. É uma produção limpa e utiliza-se o metano como gás combustível. Essa é uma alternativa muito interessante.
Outro processo também em termos ambientais muito positivo é a gaseificação, em que se queima o carvão em subsolo, ou seja, não é necessária a mineração convencional, nem uma usina gerando cinzas etc. O carvão é queimado em subsolo. E essa é uma maneira limpa de gerar energia alternativa para o carvão. O gás metano contido em camadas de carvão é outra alternativa. Além dessas, uma alternativa viável também, acoplada à produção convencional, é a questão da essência energética.
IHU On-Line – Vale a pena investir nesse modelo energético?
Roberto Heemann – Vale. Porque, se utilizarmos formas não convencionais, o investimento é menor, não haverá impacto em superfície nem geração de cinzas. Estaremos apenas aproveitando o que melhor há no carvão: a geração de energia.
IHU On-Line – Qual é a eficiência energética desse projeto de energia sustentável via carvão?
Roberto Heemann – Sem dúvida, é possível abastecer muitas regiões. Existe mercado. O problema do carvão é a questão política. Ele tem que entrar nos leilões energéticos. Não há motivo para não entrar. Ele se inserindo nesses leilões, há mercado e consumo. E temos essa energia aqui. Não tem sentido importar a preço de ouro essa energia, se podemos gerá-la aqui dentro. A grande questão é o aproveitamento energético, Existem tecnologias, as empresas estão utilizando essas tecnologias, só que tem que modernizar o parque termoelétrico. Para modernizá-lo, tem que haver leilão de energia, caso contrário não irá pagar o projeto. E alguém tem que pagar essa conta. É por isso que digo que é uma questão política, acima de tudo. Os políticos devem decidir fazer leilão de energia, aumentar o parque para que ele possa se modernizar. Em caso negativo, não adianta e a produção de carvão se esgota.
IHU On-Line – Qual é a expectativa de implantação desse projeto na matriz energética brasileira?
Roberto Heemann – Existem projetos prontos já no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, que são os principais produtores do país. Então, os dois grandes estados produtores já têm projetos prontos, com novas tecnologias, limpas, eficientes, só que, para eles entrarem em prática, é preciso que o carvão entre na agenda do governo. Ou seja, ele tem que ser prioridade para o governo. Para quem interessa que o carvão seja prioridade? Para o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Agora, não sei qual é o poder político desses estados...
Solução
A solução é aumentar a participação do carvão na matriz energética, incluindo o leilão regional e a necessidade de aumentar a expansão da capacidade de transmissão de energia. E tudo isso junto com a aplicação de tecnologias limpas que vêm com usinas mais modernas. Não se constrói, porém, uma usina mais moderna se não houver mercado para vender essa energia. Então, essa é uma decisão política. Os projetos existem; há intenção; há governo. Existe uma frente parlamentar pró-carvão. No entanto, há uma batalha política. Essa é a questão.
Falta de conhecimento
Muita gente ainda critica o carvão. Ele ainda é o patinho feio da matriz energética. Mas criticam por falta de conhecimento, que é a chave de tudo, e também porque o passivo ambiental do carvão ainda é grande. Então, eles olham a imagem do carvão, de como ele era feito há 50 ou 60 anos, e querem aplicar hoje. Essa que é a distorção. Até mesmo jornalística. A imagem é distorcida. Mas o que é feito hoje é uma forma muito moderna, o impacto ambiental é controlado. O Ministério Público Federal controla e fiscaliza as ações ambientais de todas as empresas. Em termos de imagem pública, o problema do carvão é o passivo ambiental. Em termos de tecnologia e solução ambiental e energética, a questão é política. Temos essas duas linhas separadas, mas que as pessoas utilizam juntas para poder confundir a opinião pública, com objetivo político, obviamente, que é a grande questão.
IHU On-Line – Qual sua expectativa em relação a Rio+20?
Roberto Heemann – Essa discussão deveria entrar em pauta na Rio+20. Deve-se falar hoje, em qualquer encontro de grandes líderes políticos, sobre o custo de energia – em particular, de energia limpa. E o Brasil tem tudo isso de sobra. Tem matriz limpa, tem potencial para gerar energia limpa, independentemente da fonte. E os estados que possuem o carvão têm que utilizá-lo, porque eles precisam. Não se trata de uma opção. Nós já estamos saturados. Vai faltar energia porque não temos mais capacidade de geração. A chave disso é uma questão política e vontade de aumentar a eficiência energética, mas olhando de forma regionalizada o país. Isso é importante. Devemos ver a potencialidade de cada Estado. Não dá para dizer que se defende o carvão, a energia nuclear etc. São complementares, mas temos que enxergar o potencial de cada estado e aproveitá-lo, só que de forma limpa.
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'Carvão, 'o patinho feio da matriz energética'. Uma fonte controvertida. Entrevista especial com Roberto Heemann - Instituto Humanitas Unisinos - IHU