O formato de uma fé domesticada e que evita qualquer questão de gênero

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19 Dezembro 2025

O período de 1990 a 2010 foi definido como a era de ouro da ficção italiana. Entre as centenas de produções, a ficção histórico-religiosa ocupa um lugar central: entre 1994, quando foi lançado o primeiro capítulo do projeto Bibbia da Lux Vide, de Ettore Bernabei (Gênesis: A Criação e o Dilúvio), e 2010, quando a ficção sobre Pio XII (Sob o Céu Romano) foi ao ar na Rai, foram produzidos 62 produtos, de minisséries a filmes sobre papas, santos, padres e religiosas. Esses formatos tiveram um impacto notável no público: “Testemunhas da fé, conquistadores de audiência”, como bem observou o crítico de cinema Sergio Perugini.

A reportagem é de Luca Kocci, publicada por il manifesto, 17-12-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Acima de tudo, desempenharam um papel significativo em relação ao conhecimento histórico e aos estereótipos de gênero: o primeiro foi mais ou menos culpavelmente domesticado e mistificado, os segundos foram reforçados pelo viés tradicional. Esse é o tema do livro organizado por Maria Bianco e Dario Garribba, "La fiction storico-religiosa nella televisione italiana. Questioni storiografiche e indagine di genere” (A ficção histórico-religiosa na televisão italiana. Questões historiográficas e investigação de gênero, em tradução livre, Il Pozzo di Giacobbe, 184 pp., €22), que apresenta, com o acréscimo de conteúdos inéditos, os trabalhos de uma conferência sobre o tema promovida em Nápoles pelo Instituto Cataldo Naro da Pontifícia Faculdade de Teologia da Itália Meridional e pela Coordenação das Teólogas Italianas.

Diversas contribuições são dedicas às obras de ficção sobre as mulheres religiosas (entre as quais aquelas das teólogas Simona Segoloni Ruta sobre Bernadete e a série de TV Lourdes e Ester Abbattista sobre a Irmã Pascalina) e leigas (Maria Montessori e Rita Levi Montalcini) que, no entanto, são transformadas em uma espécie de “santinhas”, em um processo de "assimilação/modelagem do laico sobre o religioso", como observa a estudiosa bíblica Annalisa Guida: "Sua grandeza científica ou profissional parece não ter sido suficiente; precisaram ser transformadas em 'santas' ou heroínas". O resultado geral, observa Maria Bianco, com base em estudos de teoria feminista do cinema, é que "as imagens midiáticas não apenas refletem as dinâmicas de poder da sociedade patriarcal, mas também contribuem para moldar a identidade dos espectadores, particularmente através do olhar masculino dominante".

Além disso, existe a questão da historiografia, com autores e cineastas se tornando historiadores, num "achatamento das diferenças" em que a ficção "acaba assumindo uma ambígua autoridade histórica", observa Garribba. E a questão do contratante, analisada pela historiadora Anna Carfora: se duas das principais produtoras, a Lux Vide de Bernabei e a Eliseo de Luca Barbareschi, declaram explicitamente suas intenções pedagógicas-confessionais, essa intenção molda a história. A ficção "não é história", mas "finge ser história, usando-a como reservatório para os propósitos dos contratantes e produtores". Uma história que também é deliberadamente distorcida por razões políticas, como demonstra Sergio Tanzarella em seu ensaio sobre a minissérie sobre o padre Giuseppe Diana, o padre anti-Camorra assassinado em Casal di Principe em 1994, da qual desaparece a política, ou seja, a conivência e a cumplicidade da Democracia Cristã com a Camorra. Com resultados paradoxais, como observa Ludovica Eugenio (diretora da Adista) em seu ensaio sobre a série Chiara Lubich: para santificar a fundadora do Movimento dos Focolares, a ficção elimina todos os elementos mais controversos do Movimento (hierarquização, invasividade, abusos psicológicos e sexuais), tornando-a "mais esquemática e menos interessante do que a história real dessa fundadora do primeiro e maior movimento eclesial do século XX".

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