26 Novembro 2025
O economista francês, primeiro presidente do conselho científico da Attac, argumentou que as atividades econômicas estão integradas aos sistemas naturais.
A reportagem é de Lourdes Lucía, publicado por Ctxt, 25-11-2025.
“Trabalhei a terra em Lescun, terra das minhas raízes familiares, mas cresci num bairro operário de Bordeaux. Tive a sorte de não ser rico e de sempre ter apoiado os meus amigos da classe trabalhadora. Esse é o meu orgulho. Dizem que conheço o povo, mas é mentira; sou um deles. As minhas origens humildes permitiram-me viver modestamente e criar os meus filhos sem grandes luxos.” Foi assim que René Passet se definiu numa entrevista concedida a Miguel Mora para o El País em 2013, por ocasião do lançamento em espanhol do seu livro As Grandes Representações do Mundo e da Economia ao Longo da História (Clave Intelectual/Siglo XXI e Eudeba 2013, traduzido por Mariana Saúl).
Professor emérito da Universidade Paris-Panthéon-Sorbonne, René Passet foi um dos mais importantes economistas franceses. Pioneiro da abordagem transdisciplinar em economia, foi o primeiro presidente do Conselho Científico do movimento internacional Attac. Membro fundador do Collegium International Éthique, Politique et Scientifique (IC Ética), foi colunista do Le Monde e colaborador do Le Monde Diplomatique. É autor de diversos livros, incluindo, além do já mencionado, L'Économique et le vivant (premiado pela Academia Francesa de Ciências Morais e Políticas), La ilusión neoliberal (Debate, 2001, traduzido por María Victoria López Paños) e Elogio de la globalización por una “mundialización humana” (Salvat, 2002, traduzido por Manuel Serrat Crespo).
Amigo de Stéphane Hessel, as ideias de René Passet foram uma força motriz por trás do movimento dos Indignados. Ele participou do primeiro Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre, foi um dos poucos economistas que previram a crise econômica de 2007-2008 e alertou para as consequências desastrosas da desregulamentação financeira. Sua concepção de economia vincula as formas econômicas de organização das sociedades humanas às teorias e avanços científicos produzidos em cada época. Contém também uma crítica contundente ao reducionismo econômico neoliberal, que busca reduzir as pessoas a meros seres econômicos. Defensor de um novo paradigma — a bioeconomia —, o trabalho de Passet integra as atividades econômicas aos sistemas naturais, pois existem bens comuns, como o ar e a água, que devem transcender a lógica dos mercados.
“A perfeição a que todos aspiramos nunca será alcançada, e isso é uma excelente notícia: a história não tem fim; enquanto mulheres e homens habitarem este planeta, haverá espaço para sonhos, utopia e autoaperfeiçoamento”, afirmou em entrevista conduzida por Iván Gil e publicada no El Confidencial.
Um ano antes de completar 100 anos (ele nasceu em 1926), René Passet faleceu. Como colega na Attac, como editor de dois de seus livros em espanhol (A Ilusão Neoliberal e As Grandes Transformações do Mundo e da Economia ao Longo da História) e, sobretudo, como amigo, a morte de René é uma grande perda. Mas ter tido a oportunidade de conhecê-lo e trabalhar com ele também foi uma bênção e um privilégio. Sua constância e dedicação foram exemplares. Sua obra e seu exemplo permanecerão sempre relevantes.
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