07 Novembro 2025
É necessário apoiar a proposta do Brasil de desenvolver um roteiro para a realização da transição integral para energias renováveis.
O artigo é de Juan Manuel Santos, presidente da organização The Elders, ex-presidente da Colômbia e laureado com o Prêmio Nobel da Paz, publicado por El País, 07-11-2025.
Eis o artigo.
A natureza está furiosa. Basta olhar para o Caribe, onde milhares de pessoas tentam reconstruir suas vidas após um dos furacões mais ferozes já registrados. Desastres como esse, que já não são exceção, carregam a marca das mudanças climáticas impulsionadas pela extração e uso de combustíveis fósseis.
Quando assumi a presidência da Colômbia, líderes indígenas me deram um aviso crucial: a paz não era apenas com a guerrilha, mas também com a natureza. Eles estavam certos, e o direito internacional confirma isso.
Em uma decisão histórica emitida em julho deste ano, a Corte Internacional de Justiça declarou que os governos são legalmente obrigados a agir contra as mudanças climáticas e que continuar financiando combustíveis fósseis — por meio de permissões, licenças ou subsídios — pode constituir um “ato ilícito”. A decisão já está surtindo efeito: em agosto, invocando essa sentença, um tribunal brasileiro ordenou a suspensão das atividades de uma mina de carvão e de uma usina termelétrica.
Enquanto isso, a energia limpa está se tornando cada vez mais competitiva. Em agosto, a energia eólica e solar representaram um terço da eletricidade do Brasil, fortalecendo a resiliência do sistema juntamente com a energia hidrelétrica e reduzindo a dependência do gás. Santiago, no Chile, terá dois terços de sua frota de ônibus elétrica até o final do ano. E o mundo está caminhando na mesma direção: a Europa concordou esta semana em acelerar sua transição verde, enquanto a China investiu fortemente em tecnologias renováveis.
Por outro lado, os produtores de carvão, petróleo e gás enfrentam um futuro cada vez mais incerto. À medida que a energia renovável substitui os combustíveis fósseis, os empregos e a arrecadação de impostos associados a esse setor também desaparecerão. Regiões que dependem da extração de combustíveis fósseis precisarão urgentemente de planos para diversificar suas economias, capacitar sua força de trabalho e apoiar as comunidades afetadas.
Na Colômbia, cuidar da natureza é muito mais do que uma decisão ambiental: é uma estratégia econômica e de paz. Onde isso foi implementado de forma eficaz, ex-combatentes e comunidades trabalham juntos para proteger florestas, restaurar rios e promover o ecoturismo.
Nada disso será sustentável sem apoio internacional. É por isso que apoio a iniciativa do Brasil, país anfitrião da COP30, de chegar a um acordo sobre um roteiro para superar a dependência de combustíveis fósseis. Essa iniciativa conta com o apoio da Europa e dos países mais vulneráveis à crise climática e deve interessar tanto aos produtores quanto aos consumidores.
Se agirmos em conjunto, a transição será mais rápida, justa e estável. Mas não podemos esperar que todos concordem: a maior floresta tropical do mundo exige atenção imediata.
A extração descontrolada de recursos — tanto legais quanto ilegais — combinada com as mudanças climáticas, está levando a Amazônia a um ponto sem retorno. Se o ultrapassarmos, não apenas perderemos florestas em ritmo acelerado, mas todo o ecossistema poderá entrar em colapso.
Os combustíveis fósseis fazem parte do problema. Nos últimos 15 anos, a extração de petróleo e gás em quatro países da Amazônia foi associada a 5.000 incidentes ambientais. Rios envenenados, solos contaminados, fauna dizimada, milhares de pessoas afetadas… E a ameaça está aumentando devido a novos projetos petrolíferos e à mineração ilegal.
Comunidades indígenas têm se manifestado para impedir a perfuração de poços de petróleo e gás. Após um ano de investigação, membros da rede global Parlamentares por um Futuro Livre de Combustíveis Fósseis apresentaram um plano de ação para proteger a Amazônia. Este plano propõe não autorizar novos poços de petróleo e gás, fortalecer a governança indígena e criar instrumentos financeiros para garantir que os combustíveis fósseis permaneçam no subsolo.
A União Internacional para a Conservação da Natureza já manifestou publicamente seu apoio a uma Amazônia livre de combustíveis fósseis.
Quando os líderes se reunirem este mês em Belém, na porta de entrada deste pulmão humano incomparável, nós os incentivamos a se unirem a este esforço. Que melhor oferta de paz para o nosso mundo natural?
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