22 Outubro 2025
A canonização dos dois primeiros santos do país serve de plataforma para denunciar a crise política e social.
A reportagem é de Cantora Florantonia, publicada por El País, 22-10-2025.
A canonização dos dois primeiros santos venezuelanos, São José Gregório Hernández e Santa Carmen Rendiles, serviu para levantar novamente as vozes em relação à crise política na Venezuela. Na primeira Missa de Ação de Graças, celebrada no altar da Cátedra na Basílica de São Pedro, no Vaticano, o Cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano, voltou a pedir a libertação dos mais de 800 presos políticos e a que o país trilhasse um caminho "em direção à luz".
“A canonização de José Gregorio Hernández e Madre Carmen é um kairos, isto é, um momento oportuno para embarcar nesta jornada. Não a deixem passar, queridos irmãos e irmãs, não a deixem passar em vão”, disse o sacerdote. “Só assim, querida Venezuela, passarás da morte para a vida. Só assim, querida Venezuela, a tua luz brilhará na escuridão, a tua escuridão se tornará meio-dia se ouvires as palavras do Senhor que te chama a abrir as prisões injustas, a quebrar os ferrolhos das algemas, a libertar os oprimidos, a quebrar todas as algemas. Só assim, querida Venezuela, poderás responder à tua vocação de paz se a construíres sobre os fundamentos da justiça, da verdade, da liberdade e do amor, do respeito pelos direitos humanos, gerando um espaço de encontro e de convivência democrática”, disse Parolin, referindo-se à segunda leitura da Missa.
Por ocasião do evento religioso, para o qual o governo de Nicolás Maduro organizou uma série de atividades em Caracas, esperava-se a libertação de algumas pessoas detidas por perseguição política. Suas famílias exigem há meses uma "canonização sem presos políticos". Quase 100 dos 845 presos políticos estão em estado crítico de saúde, segundo organizações como a Justiça Encontro e Perdão. Nesses casos, elas têm exigido medidas humanitárias. No domingo, em Roma, o líder Sairam Rivas, preso em 2017 e atualmente companheiro do político Jesus Armas, detido após as eleições presidenciais de 2024, entregou uma carta ao Papa Leão XIV solicitando sua mediação para a Venezuela, enquanto saudava os paroquianos reunidos para a canonização.
A liderança chavista participou de algumas das vigílias em Caracas organizadas na madrugada de domingo para acompanhar a transmissão da cerimônia na Praça de São Pedro. A prefeita da capital, Carmen Meléndez, foi enviada aos eventos em Roma como representante do governo, juntamente com outros líderes da oposição que firmaram acordos com os chavistas. Os gestos esperados para os presos políticos não se concretizaram até agora. Alguns membros do círculo íntimo de María Corina Machado, como Magalli Meda e Pedro Urruchurtu, que se exilou este ano, também estiveram presentes, juntamente com os filhos da líder.
De Roma, as autoridades eclesiásticas venezuelanas também aproveitaram a oportunidade para denunciar a situação no país, que descreveram como "moralmente inaceitável". O Cardeal Baltazar Porras se referiu à "declínio do exercício das liberdades civis, ao crescimento da pobreza, à militarização como forma de governo que incita a violência na vida cotidiana, à corrupção e à falta de autonomia dos poderes públicos — tudo isso constitui um programa que não contribui para a convivência pacífica nem para a superação das deficiências estruturais da sociedade".
As declarações do cardeal provocaram uma resposta de Maduro, que o acusou de "conspirar com sua irmandade" contra a canonização de José Gregorio Hernández. " Porras dedicou toda a sua vida a impedir a santificação do santo dos pobres, mas foi derrotado por Deus, apesar de seu povo e de sua irmandade", declarou o líder chavista.
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