18 Julho 2025
O governo dos aiatolás pretende repatriar mais de 2 milhões de pessoas cujas autorizações foram suspensas, e o mesmo número de pessoas que nunca as tiveram. Só no último mês, 500 mil pessoas foram deportadas na fronteira, enquanto centenas foram presas sob acusações de terrorismo em todo o país.
A reportagem é de Alessia Candito, publicada por La Repubblica, 16-07-2025.
Não apenas a Líbia. Uma nova crise humanitária ameaça engrossar as rotas marítimas e terrestres que levam à Europa. Não é pelo Mediterrâneo central, onde as travessias nos primeiros seis meses de 2025 já dobraram em comparação com o mesmo período do ano passado, mas pelas rotas de fuga orientais, as rotas que passam pela Turquia. Aqueles que escolherem essas rotas, com frequência crescente nos próximos meses, revertendo a tendência de queda registrada no primeiro semestre do ano, alertam os comitês de solidariedade que trabalham nas rotas do Mediterrâneo oriental e confirmados por várias fontes na Turquia, poderão ser uma boa parte dos quatro milhões de afegãos que o
Irã decidiu expulsar do país e repatriar.
Desde 20 de março, o regime aiatolá vem reprimindo vistos e autorizações de curta duração, lançando uma campanha contra residentes ilegais. Esse processo se acelerou acentuadamente desde a guerra de 12 dias com Israel. Desde o início de 2025, explica o Centro de Direitos Humanos no Irã , mais de um milhão de afegãos foram expulsos do país, e pelo menos 70% deles foram repatriados à força. "Pelo menos 25% dos casos eram menores." Esses números são consistentes com os fornecidos por Zuhal Nabi, da agência da ONU OIM em Cabul: "449.218 afegãos retornaram do Irã. Em termos gerais, 50% retornaram voluntariamente; o restante foi repatriado à força."
As imagens vindas da passagem de Islam Qala, a cidade afegã mais próxima da fronteira, no distrito de Herat, parecem saídas de um Inferno de Dante. Milhares de pessoas chegam em ônibus lotados e são descarregadas no meio do nada, justamente em dias com temperaturas acima de 40 graus Celsius. Carregam apenas algumas sacolas, contendo os poucos pertences que conseguiram levar. Os mais sortudos conseguiram vender seus pertences, mas os repatriados — e nas últimas semanas, essa tem sido a maioria — também viram o pouco que acumularam ao longo dos anos passados no Irã ser confiscado.
Durante dias, milhares de pessoas foram forçadas a permanecer acampadas aguardando o controle de fronteira, expostas ao calor implacável, com temperaturas acima de 40 graus Celsius, sem qualquer assistência. Segundo a mídia local, nas últimas semanas, pelo menos treze afegãos morreram de sede e fome ao longo da estrada que leva à fronteira. "A situação para crianças e famílias não é boa. Elas estão sob o sol escaldante, sem abrigo ou sombra, e algumas famílias permanecem aqui por até duas noites. Elas nem sequer têm comida suficiente", explica Hameed, agente de proteção à criança da Save the Children Afeganistão, da fronteira.
"Crianças e adolescentes estão muito assustados e abalados. No Irã, eles iam à escola e levavam uma vida normal. Agora, se veem diante de uma emergência inesperada." Em Herat, pelo menos 400 menores estão amontoados nos dois centros temporários que a Save the Children montou todos os dias, muitos deles desacompanhados. Mas é uma gota no oceano, e corre o risco de se tornar assim no futuro, pois isso pode ser apenas o início de um êxodo em massa.
Em 6 de julho, o ultimato do governo iraniano para que refugiados "não autorizados" deixassem o país voluntariamente, sob pena de expulsão forçada, expirou. Segundo estimativas do escritório de imigração do Ministério do Interior, o número de refugiados é superior a quatro milhões. "De acordo com nossos cálculos", disse o secretário de gabinete Nader Yar-Ahmadi à mídia local, "há dois milhões de imigrantes ilegais e 2,03 milhões de afegãos com documentos vencidos". Essas são, ou melhor, eram, as bargeh sarshomari, autorizações temporárias para refugiados que chegaram ao país após o retorno do Talibã ao poder em 2021, que permitiam acesso limitado a serviços básicos. Todas essas autorizações foram revogadas pelo governo dos aiatolás nos últimos meses. Mas a revogação de vistos faz parte de uma crescente campanha de hostilidade contra os afegãos, que foram transformados em bodes expiatórios não apenas da crise econômica, mas também de violações de segurança.
Após ter sido repetidamente exposto, em poucos meses, como infiltrado por agentes do Mossad capazes de operar perto do centro do poder, o Irã respondeu com ferocidade. Centenas de afegãos foram presos sob a acusação de colaborar com Israel e fornecer informações logísticas e operacionais.
Uma campanha apoiada pela mídia estatal, que chegou a transmitir supostas "confissões" de prisioneiros, que admitem ter "traído" o país que os acolheu. A colaboração com as forças da OTAN no Afeganistão, que forçou milhares de pessoas a fugir quando o Talibã voltou ao poder, tornou-se um "elemento criminoso" e fonte de suspeita até mesmo no Irã.
Enquanto isso, as prisões e deportações de "irregulares" começaram. O cenário, relatado nas travessias de fronteira por aqueles que fugiram ou foram deportados para lá, é sempre o mesmo: batidas e buscas em casas, mercados e canteiros de obras onde milhares de afegãos trabalham ilegalmente por centavos, homens arrancados de suas famílias e jogados na prisão, enquanto esposas e filhos são forçados a juntar rapidamente alguns pertences, colocados em ônibus e deportados para campos onde aqueles que aguardam deportação ou na fronteira são arrebanhados.
Centenas de mulheres se viram sozinhas, e ser forçadas a cruzar a fronteira nessas condições representa um fardo duplo: no Afeganistão controlado pelo Talibã, uma mulher não pode viajar sozinha. É por isso que, de acordo com diversas organizações humanitárias, muitas permanecem presas nas travessias de fronteira, aguardando ou torcendo pela chegada de parentes.
Contas congeladas, cartões SIM suspensos e contratos de aluguel e de trabalho cancelados.
No Irã, a sociedade se adaptou rápida e facilmente à política do governo: crianças foram expulsas das escolas, muitos inquilinos ficaram sem teto da noite para o dia, inúmeros perderam seus empregos, afegãos tiveram suas contas bancárias fechadas e até mesmo seus serviços públicos foram congelados. O medo está crescendo na comunidade.
"Meu maior medo hoje em dia é ser preso. Agora, se a polícia prender um afegão, tenha ele documentos ou não, há 99% de chance de ser deportado. Neste momento, estou me movimentando pela minha cidade em constante estado de medo e ansiedade", disse um homem a ativistas do Centro de Direitos Humanos no Irã. "Eu queria ir a Teerã para ver alguns amigos afegãos, mas eles mesmos me disseram para não ir. A cidade está cheia de postos de controle e policiais só esperando para capturar afegãos."
As prisões e deportações, segundo testemunhas, são extremamente violentas. "Minha irmã", conta um homem, "estava em um acampamento com a família. Ela me contou que os guardas levaram os homens para o pátio e começaram a chutá-los e espancá-los com cassetetes. Na época, minha irmã tinha um filho de seis anos e um recém-nascido. Ela foi deixada no meio do pátio do acampamento, sem abrigo, e ninguém lhes deu nada, nem mesmo um cobertor. No final, alguém lhe deu um saco sujo para manter o bebê aquecido."
Muitas estão agora escondidas, na esperança de que a onda de repressão acabe ou à espera de uma saída do país, pois não podem retornar ao Afeganistão. Isso se aplica a muitas mulheres, que o Talibã excluiu progressivamente da sociedade e que se recusam a abandonar os estudos ou o trabalho, bem como a todas aquelas que trabalharam com os exércitos da OTAN, estruturas ou organizações ocidentais, ou com o governo anterior, e agora são consideradas "traidoras" merecedoras de morte ou longas penas de prisão.
Os que retornam enfrentam a ameaça constante de prisão arbitrária, assédio por parte das autoridades do Talibã e repressão severa, especialmente contra mulheres e meninas. Com pouco ou nenhum acesso a comida, abrigo ou serviços básicos, muitos retornados chegam a áreas já assoladas pela pobreza e pelo deslocamento forçado", relata o CHRI.
É por isso que a rota para a Turquia e a Europa continua sendo a única opção, e cada vez mais arriscada, para muitos. Ancara também lançou uma política de repatriações regulares, com milhares de afegãos embarcando em voos fretados com destino a Cabul. Vários países europeus estão considerando fazer o mesmo.
Em agosto passado, a Alemanha, apesar de não reconhecer o governo Talibã, retomou a repatriação de afegãos condenados por crimes cometidos no país, contando com "parceiros regionais". Agora, porém, a medida pode ir mais longe.
O chanceler Friedrich Merz anunciou planos para intensificar as deportações para Cabul e suspender os programas de admissão de ex-funcionários locais de agências alemãs que operam no país. Essa proposta causou arrepios nas Nações Unidas. "É inapropriado enviar pessoas de volta ao Afeganistão", bradou Ravina Shamdasani, porta-voz do Escritório das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Seu apelo, por enquanto, parece ter sido ignorado.