11 Junho 2025
O artigo é de José Lorenzo, jornalista espanhol, publicado por Religión Digital, 06-06-2025.
"Seria inútil nomear alguém para o cargo de Prior se não houvesse possibilidade de um bom relacionamento entre ele e os demais membros da comunidade". Essa frase provavelmente foi a intenção dos cardeais que elegeram o cardeal agostiniano Robert F. Prevost como o novo papa em 8 de maio, após um período marcado por considerável turbulência. No entanto, pouquíssimos desses 133 cardeais — se é que algum — teriam sido capazes de expressar que essa frase pertence à própria essência da forma como o atual Leão XIV entende a forma de governo na Igreja.
Este pensamento está expresso na tese com a qual um jovem religioso americano obteve seu doutorado em Direito Canônico em 1987 na Pontifícia Universidade de São Tomás de Aquino (Angelicum), em Roma, sob o título de O Ofício e a Autoridade do Prior Local na Ordem de Santo Agostinho, e que agora está sendo cuidadosamente examinada para tentar vislumbrar o apoio que um pontificado de apenas um mês pode ter.
Aqueles que esperam que o Papa atual aprofunde ou pelo menos mantenha as reformas iniciadas nos processos eclesiológicos do Papa Francisco, podem ver com certo alarme que uma das fontes mais significativas que percorre a tese de doutorado é a de João Paulo II.
Especificamente, como aponta o National Catholic Reporter, um discurso que o Papa Wojtyla fez aos agostinianos em 1982, onde ele os lembrou que a identidade da ordem secular é moldada não apenas pela Regra de Santo Agostinho, mas também pelo fundamento legal dado a eles pela Igreja: “Sua Ordem... tem a Santa Madre Igreja como fundadora de sua realidade legal”.
Contudo, esta alusão não deveria ser tão surpreendente, considerando que o doutorando concluiu os estudos em Direito Canônico, o pontificado do Papa polonês já atingiu velocidade de cruzeiro enquanto a tese de doutorado está sendo preparada, e que o momento eclesial já reflete uma transição após alguns anos pós-conciliares em que alguns temiam que o chão se abrisse sob seus pés.
Contudo, a análise da tese de doutorado do jovem agostiniano também mostra entre suas fontes bibliográficas — além de canonistas, é claro — “amplas referências a documentos do Vaticano II e a teólogos como Yves Congar”, o que refletiria “um compromisso com a renovação do Concílio, não como uma ruptura com o passado, mas como uma obra de desenvolvimento orgânico”.
Nesse sentido, "a eclesiologia que Leão XIV expõe nesta obra inicial afirma que a Igreja, em todos os níveis, é mais do que uma burocracia ou um movimento social. É o Corpo de Cristo, animado pelo Espírito Santo e governado por estruturas que servem à comunhão. Sua imaginação teológica conecta o local com o universal, demonstrando que a saúde da Igreja depende da vitalidade das bases e do papel unificador do ofício petrino", observa a interessante análise preparada pelo National Catholic Reporter.
O jovem Robert Prevost com João Paulo II em 1982 (Fonte: Reprodução/Redes Sociais/Religión Digital).
Mas a autoridade de que fala a tese não é mero suporte canônico nem busca controle e obediência, mas serve de fundamento para algo que também é central à obra, a regra comunitária, por isso, com base nas Constituições, lembra que “o ofício de Prior na Ordem não é um ofício de poder, mas de amor fraterno; não de honra, mas de obrigação; não de dominação, mas de serviço”, algo que, por outro lado, conduz inexoravelmente o Papa Francisco, também membro de uma congregação religiosa, e seu precoce e programático “poder é serviço”.
Contudo, a partir da análise da tese do jovem Prevost, é possível pensar que essas semelhanças entre ambos os religiosos — e posteriores pontífices —, com elementos comuns, fomentadas pela marca indelével da vida religiosa, encontrarão acentos específicos no papado do agostiniano, marcado pela importância da unidade, da comunhão, da autoridade e da obediência.
"Ao longo de toda a tese, a ênfase principal foi colocada, tanto óbvia quanto intencionalmente, nos aspectos jurídicos do ofício e dos deveres do Prior", observa Prevost na seção conclusiva de sua tese. No entanto, " a dissertação de Leão XIV apresenta uma visão da Igreja não como uma hierarquia de comando, mas como uma comunhão de comunidades, unidas por uma autoridade que é ao mesmo tempo legal e pastoral, espiritual e institucional", especifica o National Catholic Reporter.
“A visão do Padre Prevost é profundamente canônica. Ele fundamenta seus argumentos firmemente na tradição jurídica da Igreja, desde o Código de Direito Canônico até as Constituições da Ordem Agostiniana. Seu modelo de liderança transmite um foco pastoral claro, mas não é improvisado”, acrescenta.
À luz dos primeiros discursos do Papa Leão XIV, contudo, é quase impossível considerar qualquer alteração ao pontificado de Jorge Mario Bergoglio. Muito pelo contrário. Contudo, as características delineadas na tese de doutorado do jovem doutorando, cujo orientador era um dominicano asturiano, já são perceptíveis, sem mencionar a influência que seu período como missionário no Peru teve sobre ele posteriormente.
Nisso reside seu compromisso inequívoco com a sinodalidade ou corresponsabilidade leiga, o que hoje é chamado de missão compartilhada, e que não é apenas uma tábua de salvação, mas um compromisso sincero de muitas congregações.
Há também aquele pastor com cheiro de ovelha que calça botas de borracha para atravessar ruas alagadas ou monta em mulas para chegar às comunidades mais inacessíveis. A diferença é que, a partir de agora, essas questões podem ser mais bem definidas legalmente.
Talvez a primeira prova disso tenha surgido na tarde em que saiu da galeria da Basílica de São Pedro para cumprimentar a todos. Ao contrário de seu antecessor, Leão XIV não improvisou nada. Ele tinha tudo cuidadosamente escrito no papel. Ele sabia o que queria dizer. E disse como pretendia dizer.