13 Fevereiro 2025
O Papa Francisco escreveu uma carta abrangente aos bispos dos EUA condenando a "grande crise" desencadeada pelos planos de deportação em massa do presidente Donald Trump e rejeitando explicitamente as tentativas do vice-presidente JD Vance de usar a teologia católica para justificar a repressão imigratória do governo.
A reportagem é de Christopher White, publicada por National Catholic Reporter, 11-02-2025.
"O ato de deportar pessoas que, em muitos casos, deixaram suas próprias terras por motivos de extrema pobreza, insegurança, exploração, perseguição ou grave deterioração do meio ambiente, fere a dignidade de muitos homens e mulheres, e de famílias inteiras, e os coloca em um estado de particular vulnerabilidade e indefesa", diz a carta do papa de 11 de fevereiro.
Desde que assumiu o cargo em 20 de janeiro, o presidente republicano tomou mais de 20 ações executivas destinadas a reformular o sistema de imigração dos EUA, incluindo planos para aumentar as deportações de migrantes sem documentos e interromper o processamento de requerentes de asilo.
A carta do papa, publicada pelo Vaticano em inglês e espanhol, ofereceu sua solidariedade aos bispos dos EUA que estão engajados na defesa da migração e traça um paralelo entre a experiência do próprio Jesus como migrante e a atual situação geopolítica.
"Jesus Cristo... não viveu separado da difícil experiência de ser expulso de sua própria terra por causa de um risco iminente de vida, e da experiência de ter que se refugiar em uma sociedade e uma cultura estranhas às suas", escreve Francisco.
Embora a carta reconheça o direito de cada país de promulgar as políticas necessárias para se defender e promover a segurança pública, o papa disse que todas as leis devem ser promulgadas "à luz da dignidade da pessoa e de seus direitos fundamentais, e não o contrário".
O pontífice também rejeita claramente os esforços para caracterizar os migrantes como criminosos, um recurso retórico frequentemente usado por autoridades do governo Trump.
"A consciência corretamente formada não pode deixar de emitir um juízo crítico e expressar seu desacordo com qualquer medida que, tácita ou explicitamente, identifique o status ilegal de alguns migrantes com a criminalidade", escreve o papa.
Logo após Trump assumir o cargo, o vice-presidente JD Vance — um recém-convertido ao catolicismo romano — tentou defender a repressão migratória do governo apelando ao conceito de ordo amoris de São Tomás de Aquino.
"Basta pesquisar no Google 'ordo amoris'", postou Vance nas redes sociais em 30 de janeiro em resposta às críticas que recebeu após uma entrevista na Fox News.
Durante a entrevista, Vance disse: "Você ama sua família, e então ama seu vizinho, e então ama sua comunidade, e então ama seus concidadãos em seu próprio país. E então, depois disso, você pode focar e priorizar o resto do mundo."
Embora não tenha mencionado Vance diretamente pelo nome, Francisco usou sua carta de 11 de fevereiro para rejeitar diretamente essa interpretação da teologia católica.
"O verdadeiro ordo amoris que deve ser promovido é aquele que descobrimos meditando constantemente na parábola do 'Bom Samaritano', isto é, meditando no amor que constrói uma fraternidade aberta a todos, sem exceção", escreveu o papa.
Desde sua eleição em 2013, Francisco se tornou um dos maiores defensores dos migrantes no mundo. Sua última carta, no entanto, marca um raro momento em que o pontífice entrou diretamente nos debates políticos de um país.
Na carta, porém, ele afirma que este é um "momento decisivo na história" que exige reafirmar "não apenas nossa fé em um Deus sempre próximo, encarnado, migrante e refugiado, mas também a dignidade infinita e transcendente de cada pessoa humana".
"O que é construído com base na força, e não na verdade sobre a igual dignidade de cada ser humano, começa mal e terminará mal", alertou o papa.
Em uma breve publicação nas redes sociais, a conferência episcopal dos EUA compartilhou a carta do papa com seus seguidores online.
"Somos gratos pelo apoio, incentivo moral e orações do Santo Padre aos Bispos em afirmação de seu trabalho de defesa da dignidade da pessoa humana dada por Deus", diz a declaração.